O Brasil está a pouco mais de dois meses da realização das eleições para parte dos cargos do executivo e do legislativo do país, que acontecem em 02 de outubro. Dados recentes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apontam que as candidaturas não refletem o perfil dos eleitores. No país, o eleitorado feminino corresponde a 77.319.586 pessoas (52,50%); o eleitorado masculino, 69.889.046 (47,46%); e 63.463 pessoas (0,04%) não se declararam. No entanto, nas eleições de 2016, as candidaturas femininas representaram apenas 31,89% do total.

O número está no limite do percentual mínimo estabelecido pela Lei nº 9.504, a chamada Lei das Eleições, que determina que cada partido ou coligação preencha o mínimo de 30% (trinta por cento) e o máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada sexo. “Ainda que cumpram a cota mínima legal, a dinâmica da política não envolve apenas a candidatura. É destinado tempo de televisão para essas candidatas tanto quanto destinam aos candidatos homens? Quais são as alianças locais para deputados estaduais? A relação, por exemplo, com os prefeitos e vereadores é muito importante”, questiona a doutoranda e mestre em Ciências Sociais, Tathiana Senne Chicarino.

Na avaliação da especialista, parece haver o objetivo de cumprir uma exigência legal e não um interesse de fato em que isso se converta em votos. “As Assembleias Legislativas registram em torno de 12% a 13% de participação feminina, por exemplo. É muito reduzido o número efetivo de mulheres”, alerta Cicarino, que também é docente em cursos de pós-graduação em Ciência Política e em Mídia, Política e Sociedade da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). Segundo dados do Congresso em Foco solicitados ao TSE, as mulheres também são minoria no legislativo federal: são 55 Deputadas Federais na Câmara dos Deputados (10,7%) e 13 Senadoras no Senado Federal (16,0%)

Além do baixo percentual de representatividade, a questão também envolve o acesso aos recursos que as candidatas mulheres têm nos respectivos partidos. Na última quinta-feira (28), inclusive, o TSE proibiu que os recursos destinados às campanhas de mulheres fossem aplicados no financiamento de candidaturas masculinas, seja total ou parcialmente, caso não se convertam em benefício para candidatas. O objetivo principal é “impedir o desvirtuamento das cotas de gênero”. Com isto, será incluído um dispositivo específico na Resolução 23.553/2018, que trata da arrecadação e dos gastos de recursos por partidos políticos e candidatos, a fim de evitar fraudes.

Candidaturas sem votos

Um dado curioso: nas eleições de 2016, mais de 16 mil candidatos registrados não receberam votos – o que indica que sequer foram votados por si mesmos. Entre eles, as mulheres foram maioria: 14.417 contra 1.714 homens não votados.  A situação despertou a atenção do Ministério Público Eleitoral para possíveis irregularidades no processo, tais como o registro de candidatura laranjas, e orientou os procuradores eleitorais a verificá-los. “Em caso de comprovação de irregularidades, os responsáveis por esses registros podem responder por falsidade ideológica. Ocorre que muitas mulheres nem sabiam que eram candidatas”, informou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Além de uma espécie de auditoria do Tribunal, Tathiana sinaliza o aumento da transparência como um dos fatores que colaborariam para a diminuição das respectivas ocorrências. “É importante também haver a transparência dos partidos. Existem muitos partidos no Brasil, eles respondem pouco à sociedade. Uma prestação de contas à população sobre quais são os seus candidatos, como eles foram escolhidos, entre outras questões, poderia diminuir a formalização de candidatura falsas”, pontua Chicarino.

Candidatas x eleitoras

Também nas eleições 2016, 1.286 cidades não elegeram mulheres para o legislativo municipal (vereadora) entre 5.568 municípios, o que corresponde a 23,09% do total. Quando considerados os municípios em que as mulheres foram maioria, apenas 24 cidades alcançaram esta marca. A associação do voto à memória familiar – de quem o(a) candidato(a) é filho(a) e o que o respectivo sobrenome sinaliza ao eleitor em termos de trajetória política – é uma questão latente no Brasil.

Entretanto, Tathiana sinaliza também a questão sociológica, que requer reflexões mais profundas sobre o papel da mulher em espaços que, historicamente, são reservados aos homens – e que é equivocado considerar que a ampliação da participação feminina implica em retirar direitos do outro lado. “É um debate totalmente distorcido. Em termos históricos, mudanças estruturais causam desconfortos em uma parcela da sociedade, mas eu tendo a ver que essas vozes, ainda que sejam muito barulhentas, elas são minoritárias hoje. Acho que temos que criar mais diálogos para que essas coisas possam ser pensadas de forma mais densa”, conclui.

 

Tunísia Cores – Ascom Educa Mais Brasil