Decisão do STF (Supremo Tribunal de Justiça), na primeira quinzena deste mês março, modificou o padrão aplicado em investigações acerca de políticos já sem foro privilegiado. Antes, ao deixar o mandato, os processos contra eles seguiam para a justiça de primeira instância, que tocava o caso a partir dali. Agora, mesmo sem o foro, políticos réus e sem mandatos seguem investigados por instâncias superiores, como STF e Superior Tribunal de Justiça, o STJ.
Aqui em Mato Grosso do Sul, a medida do STF já produziu os primeiro efeitos, atingindo o ex-governador André Puccinelli, do MDB, e Edson Giroto, ex-deputado federal e ex-secretário de Obras de Mato Grosso do Sul. Os dois, mesmo sem mandatos desde 2014, seguem investigados na chamada justiça de primeiro grau.
Eles foram implicados na Lama Asfáltica, a famosa operação da Polícia Federal tida até hoje como a maior investida policial que se tem notícia por aqui contra a corrupção;
Em recentes movimentações nos processos contra a dupla, magistrados que cuidam do caso já mencionaram a decisão do STF. Ou seja, deixaram a entender que as ações contra Puccinelli e Giroto devem ser trancadas por aqui e seguirem para instâncias superiores, ou STJ ou STF.
‘Medida não ajuda ninguém’
Para o advogado André Borges, especialista jurídico de MS, a medida representa ‘desprestígio’ à justiça de primeiro grau.
Para ele, “mais uma vez o STF altera o entendimento sobre foro por prerrogativa de função, também chamando de foro privilegiado. Talvez o STF não tenha avaliado bem a extensão do que decidiu: atrair para Cortes Superiores, STF e STJ, milhares de casos que já vinham tramitando em primeiro grau”.
Ainda segundo o especialista “esse tipo de decisão é péssima para os tribunais superiores, porque deixam de ter o tempo necessário para cuidar de suas funções típicas. E para aqueles que estão sendo investigados ou processados porque deixam de ter o direito de recursos, como acontece quando a tramitação segue em primeiro grau. Ou seja: não é bom para ninguém”.
Acrescentou André Borges: “essa decisão [do STF] terá grande impacto por mexer em questões ligadas a ex-governadores, ex-prefeitos, desembargadores”.
Processos
Sem mandatos desde dezembro de 2014, período que supera uma década, André e Edson Giroto enfrentam processos que antes tramitavam no STF.
O ex-governador responde por processo na 3ª Vara Federal de Campo Grande. A ação indica que Puccinelli teria desviado R$ 7,5 milhões, soma que deveria ser aplicada na pavimentação da rodovia MS-430, em trecho que liga as cidades de São Gabriel do Oeste a Rio Negro.
Numa última movimentação no processo contra o ex-governador, na semana passada, o juiz federal da Terceira Vara de Campo Grande, Felipe Alves Tavares, expressou-se assim:
“… ao que tudo indica, impõe-se que o processamento e julgamento do presente seja feito pelo Superior Tribunal de Justiça, em conformidade com o novo entendimento do Supremo e na forma do artigo 105, I, da CRFB”.
Ou seja, por aqui, em MS, encerra-se a investigação contra Puccinelli e o caso segue para o STJ, em Brasília. Se o advogado do ex-governador mora em Campo Grande, por exemplo, ele terá de viajar daqui em diante para Brasília e defender o cliente.
Também na semana passada, a 5ª Vara Federal de Campo Grande, que investiga Edson Giroto “por envolvimento, em tese, em esquema de delitos praticados no exercício da função”, manifestou-se pelo trancamento da ação aqui em MS e que o caso deve seguir para Brasília.
Diz trecho da decisão relacionada ao processo contra Giroto:
“…pelo exposto [é citado a decisão do STF que determina que o político seja processado pela corte superior mesmo sem mandato], determino a remessa dos presentes autos, ao Supremo Tribunal Federal. Ciência ao Ministério Público Federal, Advogados de Defesa e Autoridade Policial. Após, remetam-se os autos à instância superior”.
Nem Puccinelli nem Giroto tinham se manifestado quanto a decisão que retorna para instâncias superiores investigações contra eles. Se isso ocorrer este material será atualizado.
LAMA ASFÁLTICA
A operação Lama Asfáltica começou a ser preparada em 2013 e posta em prática em 9 julho de 2015, perto de uma década atrás. Mais de meio bilhão de reais foram bloqueados judicialmente. A investida, que contou com a participação da Controladoria Geral da União e Receita Federal revelou uma trama construída por políticos graúdos, servidores de primeiro escalão e empresários até então intocáveis que foram indiciados, alguns encarcerados por participação em esquema de corrupção.