A 4ª Câmara Cível marcou para o dia 9 deste mês julgamento que pode definir ações coletivas contra a JBS por exalar mau cheiro e fumaça de sua unidade frigorífica no bairro Nova Campo Grande. Conforme apurado pelo Jornal Midiamax, o número de ações individuais de moradores contra a indústria pode chegar a 200.

O colegiado de desembargadores vai analisar decisão do relator, desembargador Vladimir Abreu da Silva, que atendeu a pedido da JBS em deixar ações individuais na vara de Direito Residual. Isso significa que uma decisão que for favorável a determinado morador não irá recair sobre os demais que ingressaram com ação na Justiça.

“Até o pronunciamento do Colegiado, penso que o feito deve permanecer no Juízo da 12ª Vara Cível Residual, até mesmo como forma de evitar tumulto processual, em caso de eventual provimento do recurso”, determinou o desembargador.

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Conflito de competência

Na ação, a defesa de uma moradora pediu a conexão entre ações que tratam sobre o assunto, sendo a 1ª que foi impetrada no dia 28 de fevereiro. No entanto, o juiz Atílio César de Oliveira Júnior, da 12ª Vara de Competência Residual – que é a responsável por julgar matérias que não sejam da competência dos demais segmentos do Judiciário -, declinou da competência e entendeu que o caso “envolve direito difuso, tendo em vista que se trata de ação discutindo direito ambiental, envolvendo, ainda, matéria que envolve o Estatuto da Cidade, daí porque a competência é da Vara de Interesses Difusos e Coletivos, consoante determina o art. 2º, alínea “u”, da Resolução nº 221, de 1º de setembro de 1994″, disse em decisão liminar (provisória).

Então, a JBS não se conformou com a decisão e entrou com recurso em 2º grau e teve pedido atendido provisoriamente pelo desembargador Vladimir.

Agora, o julgamento na semana que vem vai determinar qual será a vara que vai ser responsável pela sentença sobre o caso.

Para a JBS, exalar mau cheiro e fumaça em todo o bairro não é um problema coletivo. À Justiça, a empresa afirma que a moradora “sustenta como causa de pedir, a ocorrência de fumaça e mau cheiro decorrentes da atividade do frigorífico, requerendo, ao final, pedidos de indenização por danos morais ambientais, obrigação de fazer para regularização da proliferação de fumaça e implantação de métodos eficientes de dreno de ar etc…, bem como perdas e danos, enfim, trata-se de ação de inegável natureza econômico-patrimonial para defesa de interesse individual e disponível”.

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‘Enxurrada’ de ações

Odor que vem de frigorífico afeta moradores do bairro. (Henrique Arakaki, Midiamax)

O número de ações pedindo indenização por prejuízos causados pelo mau cheiro pode chegar a 200. O valor pedido varia de R$ 25 mil, R$ 50 mil, R$ 75 mil ou R$ 150 mil a depender da quantidade de pessoas que entraram contra o frigorífico no mesmo processo. Além disso, também é pedido indenização por desvalorização dos imóveis da região. 

Nos processos, os advogados alegam que a planta frigorífica da JBS/SA opera atividade potencialmente poluidora que gera “incômodo e aflição” nos moradores da região e os obriga a se trancar nos imóveis para fugir dos transtornos.

“O mau cheiro é sentido por um dos nossos sentidos e significa que o ar está poluído, cheio de fuligem, vermes, bactérias e vírus”, afirmou o advogado Wellington Barbero Biava, um dos sócios do escritório Siqueira & Biava que defende os moradores nas ações.

Empresa recebe ‘ultimato’ para resolver fedor

Após muitos protestos de moradores, reunião entre vereadores e representantes do Imasul (Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul) teve um desfecho mais prático: a JBS tem prazo de 60 dias (até 17 de julho) para resolver o problema.

Uma das possíveis sanções seria a perda da licença ambiental da unidade, que está em processo de renovação. Além disso, pode receber multa.

Conforme informações repassadas para a reportagem do Jornal Midiamax, após fiscalização dos vereadores ao local, ficou constatado que manutenções básicas poderiam resolver ou ao menos amenizar o problema do fedor no bairro, que persiste há cerca de 14 anos. Ajustes na chaminé, manutenção em filtros e melhorias no sistema de controle de odores, por exemplo.

O que diz a JBS?

“A JBS opera todas as suas atividades em conformidade com a legislação ambiental e mantém rígidos padrões de segurança no descarte dos resíduos de sua atividade industrial. Em relação a sua unidade frigorífica Campo Grande I, esclarece que não firmou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) relativo ao controle de emissões atmosféricas. 

Ressalta, ainda, que recente fiscalização do Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul) não detectou inconformidades diretamente relacionadas ao mau cheiro na região da Nova Campo Grande. 

O TAC firmado se refere ao curtume da empresa que está localizado em outro local, e não guarda relação com a emissão de odores. A companhia está atenta às demandas da comunidade do Nova Campo Grande e se mantém à disposição para dialogar com os moradores da região”, afirma o texto. 

Mau cheiro na região

Protesto de moradores no Nova Campo Grande. (Ana Laura Menegat, Jornal Midiamax)

Entretanto, moradores e um TAC firmado há 14 anos apontam que a planta frigorífica na Avenida Duque de Caxias emite um forte mau cheiro. A população organizou recentemente um protesto próximo ao local e compartilhou nas redes sociais o desconforto com a fedentina que piorou nas últimas semanas. 

Além disso, TAC firmado em 2009 com o MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) evidenciou problemas no sistema de tratamento de esgoto das instalações do frigorífico, que são as lagoas de tratamentos de efluentes. Nesse intervalo de 14 anos, a empresa chegou a pagar multa de R$ 500 mil por danos ao meio ambiente.

A indústria frigorífica utiliza muita água nos processos de abates e, por isso, gera grande carga de resíduos com alta carga orgânica, que emite forte odor.

Matéria do Midiamax mostrou que por estar descumprindo medidas que impedissem que o cheiro podre tomasse conta do bairro é que o TAC foi firmado em 2009, com uma série de exigências, que ainda não foram totalmente cumpridas.

(Reprodução)

Dez anos depois, em março de 2019, uma denúncia anônima motivou nova vistoria no local que confirmou e emissão de cheiro podre que estaria invadindo o bairro. 

O relatório técnico constatou a construção de uma nova lagoa de sistema de tratamento de esgoto realizada entre o fim de 2018 e início de 2019.

“Verificou-se que o odor daquela [lagoa de tratamento de esgoto] recém construída era o mesmo identificado na Avenida Cinco (Bairro Nova Campo Grande), por conta da direção favorável do vento. Dessa forma, constatamos que a poluição olfativa é proveniente da lagoa instalada no ano de 2019”, disseram os técnicos no relatório na época.