Às vésperas de uma possível decisão judicial, a defesa da JBS tenta na Justiça manobra para extinguir as quase 100 ações movidas por moradores do Bairro Nova Campo Grande, que pedem indenização por conta do forte odor exalado pelo frigorífico na região.

Para conseguir o feito na Justiça, o escritório Pimentel & Mochi alega que houve litigância predatória por parte do escritório que atua na defesa dos moradores. Em suma, a JBS alega que moradores estariam sendo cooptados a assinar uma procuração para advogado entrar com processo sem entender em detalhes o que isso significa, como se não fossem capazes de perceber o mau cheiro que assola o bairro por mais de uma década.

Na petição, a JBS ignora laudo do Imasul (Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul) que atestou falhas na planta frigorífica e comprovou que odor exalado da indústria chegam ao bairro e diz que os moradores acusam a JBS “sem prova de que a fumaça e o odor fétido que supostamente tem assolado a região da Nova Campo Grande sejam provenientes da Unidade da Requerida na região”.

Conforme o site oficial do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), litigância predatória consiste em: “quantidade expressiva e desproporcional aos históricos estatísticos de ações propostas por autores residentes em outras comarcas/subseções judiciárias; petições iniciais acompanhadas de um mesmo comprovante de residência para diferentes ações; petições iniciais sem documentos comprobatórios mínimos das alegações ou documentos não relacionados com a causa de pedir; procurações, contestações e recursos genéricos; distribuição de ações idênticas”.

Defesa de moradores contesta

Moradores em protesto contra mau cheiro. (Ana Laura Menegat, Jornal Midiamax)

Por outro lado, os advogados Francisco das Chagas de Siqueira Júnior e Wellington Barbero Biava apontam que a JBS tenta ‘coagir o advogado sob pena de sofrer consequência’.

Eles alegam que a situação de mau cheiro é conhecida na região e que moradores comentam uns com os outros sobre a entrada de ação contra a empresa. “Hoje em dia temos o acesso à internet e redes sociais à disposição doscidadãos, a propaganda boca a boca também nunca saiu de moda, ainda mais naregião afetada a mais de 01 (uma) década pela Requerida”.

O processo encontra-se concluso para decisão, isso significa que está sob análise do juiz Flávio Saad Peron, da 15ª Vara Cível para que possa emitir uma interlocutória, ou seja, decisão liminar – que ainda não é a sentença, mas uma decisão sobre alguma questão abordada no processo -.

A JBS foi procurada pela reportagem a se manifestar sobre o pedido da ação, mas não respondeu à reportagem do Jornal Midiamax. O espaço segue aberto para posicionamento.

Laudo comprova forte odor exalado pela JBS

Imagem de satélite da área do frigorífico, com destaque para o córrego Imbirussu, que passa ao lado e recebe despejo de água pós-tratamento (Reprodução)

A situação foi denunciada diversas vezes aos órgãos fiscalizadores competentes pelo menos desde 2009. No entanto, foi firmado um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) com o MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) que não resolveu nada.

De lá para cá, 14 anos depois, o problema continua. Nesse intervalo, o gigante frigorífico não “ajustou conduta alguma” e chegou a pagar uma multa de R$ 500 mil como indenização por danos causados ao meio ambiente.

Enquanto isso, para os moradores, o fedor sem fim interfere na saúde de crianças e idosos. Além disso, afeta até as vendas do comércio, que amarga queda no faturamento com clientes fugindo da fedentina insuportável para fazer compras em bairros vizinhos.

A providência, à época, foi encaminhada pelo ouvidor do órgão, procurador de Justiça Adhemar Mombrum de Carvalho Neto. O pedido foi distribuído para a 42ª Promotoria de Justiça de Campo Grande, que estava sob responsabilidade da promotora titular Andreia Cristina Peres da Silva.

Dessa forma, equipe técnica formada pela engenheira ambiental chefe de núcleo de arquivos georreferenciados, Ananda Rodrigues Oliveira, e pelo geógrafo assessor em ciências da terra, Roni Berto Medina Espíndola, vistoriaram o local (no dia 26 de abril de 2019) e emitiram parecer técnico confirmando o forte odor existente nas instalações da JBS.

Vistoria técnica identificou vento levando cheiro podre para o bairro Nova Campo Grande. (Reprodução)

O relatório técnico constatou a construção de uma nova lagoa de sistema de tratamento de esgoto realizada entre o fim de 2018 e início de 2019.

“Verificou-se que o odor daquela [lagoa de tratamento de esgoto] recém construída era o mesmo identificado na Avenida Cinco (Bairro Nova Campo Grande), por conta da direção favorável do vento. Dessa forma, constatamos que a poluição olfativa é proveniente da lagoa instalada no ano de 2019”, dizem os técnicos no relatório.

Córrego Imbirussu poluído pela JBS estará recuperado somente em 2030

Córrego poluído pela JBS só estará recuperado em 2030 (Montagem: Reprodução / Nathália Alcântara, Jornal Midiamax)

Poluído após derramamento de efluentes (detritos) provenientes do frigorífico JBS, do bairro Nova Campo Grande, o solo em torno do córrego Imbirussu, que margeia a indústria, estará completamente restaurado somente em 2030, ou seja, daqui a seis anos. O vazamento seria um dos motivos do forte odor exalado pela planta frigorífica na região.

O projeto para recuperação da área só foi iniciado pela gigante de alimentos – que lucra R$ 27,5 bilhões por mês – após fiscalização do Imasul (Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul) flagrar a irregularidade ambiental, em fevereiro deste ano.

Na ocasião, a JBS foi multada em R$ 100 mil e autuada no sentido de promover a regularização de oito pontos pendentes. Entre eles, o mais sensível, que é o item 6 do relatório do Imasul: “Providenciar projeto de recuperação para áreas afetadas pelo extravasamento do efluente, tanto dentro do empreendimento sob as coordenadas 21k 739474 7736000, quanto próximo ao emissário sob as coordenadas 21k 738912 7735433 adjacente ao corpo hídrico”.