Investigados por integrarem o suposto esquema de corrupção chefiado por Claudinho Serra (PSDB) estavam preocupados com a ‘dificuldade’ para reeleição do chefe nas eleições deste ano em Campo Grande. É o que revelam interceptações de conversas autorizadas judicialmente, segundo o Gaeco.

A preocupação flagrada nas escutas legais é um dos principais problemas para o PSDB nas eleições municipais, segundo pré-candidatos que sonham com uma cadeira de vereador em Campo Grande.

Assim, como o ninho tucano acabou inflado com nomes considerados ‘puxadores de voto’, a análise é de que fica mais difícil estar entre os mais votados da chapa. Ou seja, com a situação, seria mais fácil ter uma votação expressiva e mesmo assim não ser eleito pelo PSDB do que por outras legendas.

O medo de ‘ficar de fora’ assombrava até os integrantes da suposta organização criminosa que, segundo a Operação Tromper, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), tocava esquema de desvio de dinheiro público com fraude em licitações na Prefeitura de Sidrolândia.

A operação seria comandada pelo genro da prefeita Vanda Camilo (PP), o vereador do PSDB na capital de MS, Claudinho Serra. Segundo os investigados, o vereador, que só chegou ao cargo porque o eleito renunciou para trabalhar na pré-campanha de Beto Pereiro (PSDB) à prefeitura de Campo Grande, correria risco de não se eleger.

Interceptações telefônicas flagraram conversa de empresário implicado em esquema de corrupção em Sidrolândia, a 70 km de Campo Grande, Ueverton Macedo da Silva, o ‘Frescura’, preocupado com a reeleição do ‘chefe’. Depois de deixar a cadeia, o vereador Claudinho Serra (PSDB) segue licenciado na Câmara de Campo Grande.

Conforme consta em relatório do Gaeco, o ‘líder empresarial’ do maior esquema de desvio de dinheiro público já flagrado em Sidrolândia, ‘Frescura’ conversa com um homem não identificado, o qual ele chama pela alcunha de ‘Prefeitão’.

No diálogo, feito no dia 1º de abril deste ano, os dois falam sobre a situação de Claudinho Serra para se reeleger vereador em Campo Grande. Assim, o ‘Prefeitão’ começa a conversa chamando Ueverton de ‘meu patrão’. Em determinado momento, os dois entram no assunto da reeleição de Claudinho.

Ao falar sobre um evento do PSDB, eles comentam sobre a chapa do partido para vereador em Campo Grande:

‘Prefeitão’: O Pitu foi pra lá.

Ueverton: PSDB, ele é forte também né patrão?

– ‘Prefeitão‘: O PITU ele vai se eleger, se reeleger né…

Ueverton: A boca é escura pro Claudinho lá, hein?

– ‘Prefeitão‘: A boca está escura pra ele lá rapaz… eu não sei o que esses caras vão fazer pra poder arrancar ele, os caras lá. O filho do finado Cabo Almi [Flávio Moura] foi pra lá também.

Ueverton: O Flávio? Está dentro também né patrão?

Para os investigadores do Gaeco, a conversa demonstra “preocupações com a ascensão política de aliados, que indicam refletir diretamente na facilitação para darem continuidade nos esquemas engendrados junto com a administração pública local”.

Por fim, o Gaeco conclui que “Resta nítido que o alinhamento político dos interlocutores é de fato com o investigado CLAUDIO SERRA, pois ao comentarem sobre filiações dentro do partido deste, consideram que ele teria uma árdua missão na tentativa de se eleger, o que em tese, seria o desejo de todos com vistas a perdurarem com os esquemas objetos desta investigação“.

Tanto o vereador Claudinho Serra como seu advogado, Tiago Bunning, foram questionados pela reportagem sobre possíveis intenções dele à reeleição – agora após a operação -, mas não obtivemos resposta. O espaço segue aberto para posicionamento.

Vale ressaltar que o tucano está afastado do mandato por força de licença até setembro.

Chapa abarrotada do PSDB

A preocupação relatada por Frescura e ‘Prefeitão’ revela um problema interno na chapa do PSDB.

Além dos nomes já citados pelos dois [Pitu e Flavio], o ex-vereador e ex-secretário estadual de cultura, Athayde Nery, é outro nome considerado ‘puxador de votos’ pelo partido.

Ainda, após as eleições, o ninho tucano angariou três vereadores para a sigla: Papy (ex-Solidariedade), Dr. Vitor Rocha (ex-PP) e Zé da Farmácia (Podemos). Junto a esses nomes, também devem disputar as eleições pelo partido o suplente de Claudinho Serra, Gian Sandim, professor Juari e William Maksoud.

Conforme divulgado pelo próprio PSDB em seu site oficial, evento no dia 1º de abril, que exaltou a filiação de Pitu, também registrou a filiação de mil correligionários – nem todos serão candidatos.

O presidente do diretório municipal do PSDB, Beto Pereira, foi procurado pela reportagem, mas não atendeu às ligações nem retornou as mensagens. A assessoria dele também foi procurada, mas não deu retorno. O espaço segue aberto para manifestação.

O que precisa para se eleger vereador em Campo Grande?

Atualmente, Campo Grande conta com 29 cadeiras para vereador. O número de votos necessários para conseguir uma vaga depende do chamado quociente eleitoral e o partidário.

Parece complicado, mas o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) explica: o quociente eleitoral é definido pelo número de votos válidos para o cargo de vereador dividido pelo número de vagas para preencher o cargo.

Por exemplo, nas eleições de 2020, foram 412.796 votos válidos para vereador em Campo Grande. Ou seja, temos o número 14.234. Assim, o primeiro requisito é que o candidato tivesse ao menos 10% do quociente em votação. Assim, um candidato com menos de 1.423 votos não poderia ocupar uma cadeira na Câmara.

Depois, calcula-se o quociente partidário, que é o número de vagas que cada partido terá direito. Para isso, soma-se o total de votos válidos para determinado partido ou federal (que conta como um partido só) e divide-se pelo quociente eleitoral.

Considerando que determinado partido tivesse obtido 100 mil votos nas eleições de 2020 em Campo Grande (somando a votação nominal de cada candidato daquele partido), utilizada no exemplo.

Então, fazendo a conta, esse partido teria direito a 7 vagas. Logo, os sete candidatos mais votados estariam eleitos. Ou seja, para conquistar uma vaga à Câmara da Capital em 2020, um candidato de um partido que tivesse obtido 100 mil votos teria que ter ao menos 1.423 votos e estar entre os 7 mais votados dentro do partido.

Claudinho Serra sem força política

Apesar de estar exercendo mandato de vereador em Campo Grande na época das interceptações, Claudinho Serra era visto como um ‘elo fraco’ dentro da chapa do PSDB, como revelado na conversa.

Tratado como pupilo de lideranças tucanas nas últimas eleições, Claudinho havia conquistado apenas 3.616 votos, ficando só com a 2ª suplência do PSDB. Nas investigações, nomes de então dirigentes do PSDB, como Sérgio de Paula, foram flagrados em anotações apreendidas em empreiteira.

Dessa forma, ele só assumiu após uma sequência de situações. A primeira, com o titular do mandato, João Cesar Mattogrosso, assumindo cargo no governo do Estado. Assim, o 1º suplente, Ademir Santana, foi chamado. Depois, o vereador João Rocha assumiu também um cargo no governo. Então, Claudinho assumiu como suplente em maio de 2023.

Por fim, conseguiu o mandato em definitivo quando Ademir Santana renunciou ao cargo alegando que deixava a vaga para a qual foi eleito para se dedicar à campanha eleitoral do PSDB. Ademir renunciou e entregou a vaga para Claudinho um mês antes da deflagração da Operação Tromper.