A 1ª Vara Cível de Aquidauana marcou para 23 de agosto uma audiência de instrução e julgamento com Fauzi Suleiman, prefeito entre 2009 e 2012, e Douglas Figueiredo, ex-prefeito e ex-vice-prefeito de Anastácio. Os dois têm até o início de agosto para indicar testemunhas.

Em despacho, o juiz Giuliano Máximo Martins confirmou o agendamento da audiência no Fórum. Os advogados ficam responsáveis por intimar as testemunhas, em até 15 dias antes da sessão.

Por outro lado, ele fixou como ponto controvertido a existência de conduta ímproba. Ou seja, ainda falta confirmar se de fato os réus cometeram improbidade. Uma primeira audiência foi desmarcada em 2021.

Ex-prefeitos de Aquidauana e Anastácio foram denunciados por supostas fraudes em licitação

A ação civil pública foi impetrada em abril de 2014 pelo MPMS (Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul). Na petição inicial, o promotor José Maurício de Albuquerque narra que o vereador Wezer Lucarelli denunciou, em setembro de 2010, que fornecedores do setor de alimentos o procuraram pedindo ajuda para participar de licitações da prefeitura.

Ao analisar um jornal local, o parlamentar não encontrou nenhum edital de licitação. Na época, a cidade não tinha Diário Oficial. A publicação em questão circulou sem duas páginas, justamente aquelas que deveriam constar os editais.

Lucarelli levou o caso à 1ª Promotoria de Justiça de Aquidauana, que apurou que a prefeitura mantinha contrato com escritório de advocacia, cujo sócio era o então vice-prefeito de Anastácio, Douglas Figueiredo.

O outro sócio revelou ao vereador que Fauzi e Douglas compraram o jornal impresso por meio de um contrato de gaveta. Assim, os editais de licitação circulavam apenas para um número restrito de pessoas.

O advogado rescindiu o contrato com o município após se recusar a assinar os procedimentos licitatórios. Assim, o MP constatou que oito pregões tinham indícios de irregularidades, que incluíam a compra de alimentos, materiais de limpeza e de laboratório.

Após o caso vir à tona, os contratos foram revogados pelo então gerente municipal de Finanças, Paulo Sérgio Goulart, atos que foram homologados por Fauzi. Assim, a Promotoria denunciou o ex-prefeito, Douglas, Goulart e os antigos donos do jornal.

“Ficou claro que foi o segundo demandado [Douglas Figueiredo] quem tomou a iniciativa para a consumação das fraudes. Para tanto utilizou da influência que exercia na gestão do primeiro [Fauzi Suleiman] para convencer os demais a aderirem à sua trama ilícita”, escreveu o promotor.

Albuquerque prossegue apontando que a fraude não teria acontecido se não fosse pelo suposto envolvimento dos dois donos do jornal, além de destacar que os contratos foram revogados apenas porque foram denunciados por irregularidades.

“Como a revogação das licitações decorreu única e exclusivamente em função do descobrimento da fraude, é óbvio que o fundamento utilizado pelo terceiro requerido [Paulo Sérgio Goulart] para solicitar a revogação desses atos – queda na arrecadação da receita – é falso, pois foi apenas uma invencionice para justificar o ato. Ao se utilizar dessa desculpa nos memorandos que encaminhou ao Núcleo de Licitações da prefeitura, cujos documentos continham sua assinatura, Paulo Goulart se coloca no centro do furacão e leva consigo o ex-prefeito Fauzi que, como chefe do Executivo e figura mais proeminente da administração municipal, não teria como chancelar todas as revogações sem que ao menos tivesse conhecimento da trama. No mínimo, agiu culposamente”, conclui.

Após a sanção da Lei 14.230/2021, que reformou a Lei de Improbidade Administrativa, o MPMS pediu que os réus fossem condenados apenas por não dar publicidade aos editais, já que a legislação exige a intenção de causar dano ao erário, o que não é o caso.

O que dizem as defesas dos réus

O advogado Tarik Muhamad Suleiman, que representa o ex-prefeito Fauzi Suleiman, apresentou contestação apenas no mês passado. A defesa alega que a denúncia do MPMS não é clara quanto à conduta do então chefe do Executivo no suposto esquema de fraude.

“Não se sabe, portanto, qual ato do ex-prefeito o parquet [MPMS] entendeu como ímprobo ou como ele teria atuado para ‘negar publicidade aos atos oficiais’. Assim, não se explica o motivo da imputação feita ao requerido [Fauzi Suleiman]”, escreveu.

Para Tarik, a Promotoria relaciona o suposto contrato de gaveta apenas a Douglas, e não a Fauzi. “Isso porque, ainda que fosse verdade a alegação e o jornal pertencesse ao requerido, não há indicação e nem denúncia de que ele tenha praticado os atos tipificados no art. 11, V. Assim, mesmo considerando real essa sugestão descabida, há mais de 10 anos feita e não provada, nada na inicial explica como Fauzi teria atuado no ato”, conclui.

Em defesa prévia, os donos do jornal esclareceram que não poderiam ser condenados, já que apenas se limitavam a montar a edição com os atos enviados para a publicação enviados previamente pela prefeitura.

Além disso, a empresa não poderia ser responsabilizada pela forma que o jornal é distribuído após sair da gráfica. 

“Quanto a esta premissa, tem-se que os ora manifestantes, sócios proprietários da gráfica, já estariam, simplesmente por serem responsáveis tão somente pela impressão do jornal e por colocá-lo em circulação, excluídos da posição de réus nesta demanda, pois, não pode praticar atos de improbidade administrativa, sujeitando-se por eventuais condutas que lesem o erário, às sanções por crimes de responsabilidade ou crimes contra a administração pública, previstos em diplomas especiais”, escreveu, em junho de 2014, a advogada Michelle Marques Tabox Garcia de Oliveira.

O advogado de Paulo Sérgio Goulart, Guilherme Tabosa, alegou que ele não tinha como função gerenciar a edição e a publicação de procedimentos licitatórios, “visto que este processo exige conhecimento técnico-jurídico”. Além disso, os oito pregões não foram concluídos por falta de verba.

“Não existem indícios suficientes à propositura da ação de improbidade em face a Paulo Goulart, visto que os processos licitatórios aqui debatidos não foram conclusos, pois naquela época existia déficit na arrecadação de recursos orçamentários. O réu, diferentemente ao que foi dito em inicial do Ministério Público, fez uso de sua atribuição pública para revogar os atos, mantendo-se em conformidade com a lei fiscal e a administração pública, visto que possuía ciência da situação financeira da urbe naquele ano”, escreveu.

O advogado de Douglas Figueiredo, Alex Ales, apontou que as provas do MP para a denúncia eram ilícitas, já que o caso derivou da manifestação de um vereador opositor a Fauzi e que a revelação da suposta fraude se deu após a divulgação de uma gravação ilícita entre o parlamentar e o sócio do ex-prefeito de Anastácio.

“Mesmo porque as demais provas obtidas no curso do inquérito civil, como os serventuários concursados da câmara municipal ou mesmo o depoimento dos empregados do jornal, só tiveram supedâneo no inquérito civil aberto por meio da gravação e degravação (de 21 páginas) ilícita feita pelo inimigo político dos réus”, pontuou.

Citando a teoria do fruto da árvore envenenada, Ales aponta que, como o caso iniciou a partir dessa gravação obtida ilicitamente, as demais provas trazidas aos autos também seriam ilícitas.

Ao Jornal Midiamax, Figueiredo informou que a Promotoria de Justiça reconheceu que não houve dano ao erário.

“O Ministério Público além de não verificar a ocorrência de dolo ou intenção ou dano ao erário, que afasta a tese de corrupção da matéria, também recebeu das defesas documentos da Procuradoria-Geral de Justiça, onde uma pessoa foi ouvida e afirmou que tudo foi armação”, disse.

Sobre o pedido do MP para modificar a denúncia, que ainda não foi acolhido pelo juiz, o ex-prefeito de Anastácio ressalta que a ação perdeu força, mas a Promotoria ainda assim a manteve.

“O que restou foi uma ação sobre erros sobre erros de publicação, que tem servidores dos setores responsáveis e o MP coloca todos no mesmo balaio para mostrar serviço”, lamentou.

*(Alteração às 8h53 de 05/05/2023 para acréscimo de informação)