Waldir Neves reclama de operação e promete explicar negócios sob suspeita de lavagem de dinheiro

Conselheiro do TCE-MS rompeu o silêncio e emitiu nota dez dias depois da deflagração da Operação Mineradora de Ouro

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Passados dez dias desde a deflagração da Operação Mineradora de Ouro, o conselheiro do TCE-MS (Tribunal de Contas do Estado) Waldir Neves resolveu romper o silêncio. Alvo da ofensiva por suspeita de lavagem de dinheiro em uma série de negócios milionários envolvendo fazendas e imóveis, Neves prometeu esclarecer as transações em xeque e disparou contra as investigações de Polícia Federal, Receita Federal e CGU (Controladoria-Geral da União).

O conselheiro publicou uma nota intitulada “Palavra de tranquilidade aos meus amigos”, a quem, em certa altura da mensagem, ele diz ter medo de envergonhar com seus atos. A publicação tem sido compartilhada em redes sociais.

Waldir Neves divide o posicionamento em sete pontos. No primeiro deles, afirma que o pedido do MPF (Ministério Público Federal) pelas medidas de busca e apreensão se sustenta em negócios declarados por ele à Receita Federal, mas que, segundo o órgão, “precisam ser melhor esclarecidos”. 

“Oras prestar esclarecimentos se faz com meras intimações ao contribuinte para tal mister, não por medida de busca e apreensão previamente divulgada à mídia local como acabou por acontecer”, reclamou.

No segundo tópico, o conselheiro alega que os policiais não encontraram em sua casa ou gabinete “um único valor em espécie, cheque, promissória ou bem de valor vultoso e de origem duvidosa tais como jóias, relógios e obras de arte”.

Nos pontos três e quatro, Waldir Neves afirma que não tem parentes – até o terceiro grau – comissionados ou terceirizados no TCE-MS, bem como nega que emprega em seu gabinete funcionários “fantasmas”.

No quinto ponto, adianta que está “refutando judicialmente” os indícios de “negócios jurídicos duvidosos e ilegais” apontados pela Polícia Federal.

Neves conclui com os itens seis e sete, dizendo acreditar na Justiça e que tem usado seu tempo desde a fase ostensiva da operação “para comprovar que meus atos (reputados como duvidosos na referida operação) são lícitos e dignos do cargo que ocupo”.

Waldir Neves é o primeiro dos três conselheiros alvos da Mineradora de Ouro a se manifestar em nota. Osmar Jeronymo e Ronaldo Chadid seguem sem se pronunciar oficialmente sobre o caso.

PF encontrou indícios de lavagem de dinheiro com fazendas de até R$ 17 milhões

As movimentações suspeitas que implicam Waldir Neves foram identificadas a partir da quebra de sigilos do conselheiro. As apurações devem se aprofundar ainda mais, uma vez que a decisão que autorizou os mandados cumpridos na última semana, proferida pelo ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Francisco Falcão, também determinou novo afastamento de sigilos bancário e fiscal dos alvos, no período compreendido entre 2012 e 2021.

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Viatura da Polícia Federal no TCE-MS – Marcos Ermínio/Midiamax

As negociatas envolvem dação de fazendas pela Agropecuária Água Viva, declaradas em R$ 4 milhões, para suposto pagamento de dívida da empresa com o conselheiro. Neves deixou de ser sócio do grupo em 2009, mas só passou a declarar o débito sete anos depois.

As investigações também se debruçam sobre supostas permutas de imóveis feitas pelo membro do TCE-MS, uma vez que as datas declaradas destas transações são desmentidas por notas fiscais emitidas anos antes, já com o endereço em nome de Waldir Neves.

Os investigadores também apuram supostas negociações de terras pelo conselheiro a valores ainda mais exorbitantes no estado do Maranhão. Uma troca de e-mails obtida pela PF levantou a suspeita.

Nas mensagens, um intermediário que seria responsável por transações imobiliárias de Waldir Neves no estado nordestino cita a venda de uma propriedade rural do conselheiro por R$ 17 milhões. O suposto corretor recebeu R$ 52 mil de Neves entre 2010 e 2017, segundo a Polícia Federal.

Parente de Waldir Neves seria ‘fantasma’ em contratada do TCE-MS

Em novembro de 2015, o intermediário nomeou como seu procurador um parente do conselheiro do TCE-MS, Willian das Neves Barbosa Yoshimoto. Embora advogado, Willian foi contratado pela Dataeasy Consultoria e Informática, em março de 2018, como administrador de redes e de sistemas computacionais.

Conforme as apurações policiais, o parente de Neves seria um dos funcionários “fantasmas” admitidos por contratadas do TCE-MS para superfaturar os vínculos firmados com estas empresas e dissimular o pagamento de propinas.

A Dataeasy, com sede em Brasília (DF), foi a empresa que mais recebeu pagamentos do TCE-MS entre 2018 e 2020 – R$ 80,7 milhões. Somados aos valores pagos à sua filial em Goiânia (GO), os números saltam para R$ 106,4 milhões.

Willian Yoshimoto chegou a receber R$ 15.194,00 de salário,  valor que nunca havia sido registrado pela empresa antes, para nenhum funcionário.

As investigações apontam que o advogado é filho de um primo de Waldir Neves, primo este que, por sua vez, é sócio da Mineradora Betione – empresa da qual um irmão do conselheiro, Vanildo Neves Barbosa, tem parte.

O advogado parente de Waldir Neves depois trabalhou como analista de comércio eletrônico na Cast Informática S/A, outra contratada do TCE-MS, entre abril de 2015 e abril de 2018. 

Operação Mineradora de Ouro

A Operação Mineradora de Ouro levou Polícia Federal, CGU (Controladoria-Geral da União) e Receita Federal às ruas para cumprir 20 mandados de busca e apreensão, em Campo Grande, Sidrolândia e Brasília. As medidas foram autorizadas pelo ministro do STJ Francisco Falcão.

A investigação mira favorecimento de terceiros por servidores públicos, enriquecimento ilícito, lavagem de dinheiro, fraude em licitação, superfaturamento e contratação de funcionários “fantasmas”. O balanço divulgado revelou R$ 1,6 milhão apreendido. Além de Waldir Neves, os conselheiros Osmar Jeronymo e Ronaldo Chadid também foram alvos da investida.

O TCE-MS não se manifestou oficialmente sobre o caso.

Veja na íntegra a nota do conselheiro Waldir Neves:

“Palavra de tranquilidade aos meus amigos.
Como amplamente noticiado fui alvo de busca e apreensão por determinação de ministro do STJ a pedido do MPF.
Como magistrado estadual de contas respeito toda e qualquer decisão administrativa ou judicial, mesmo com ela não concordando. No caso específico minha discordância jurídica se dará perante o próprio STJ, mas do ponto de vista pessoal tenho um dever de tranquilizar meu rol de amizades.
Sendo assim, aos meus amigos devo a presente palavra:
1º- Todo o pedido do MPF se baseou em negócios jurídicos devidamente registrados e constantes em minhas declarações de renda desde 2009, que segundo a RFB precisam ser melhor esclarecidos. Oras prestar esclarecimentos se faz com meras intimações ao contribuinte para tal mister, não por medida de busca e apreensão previamente divulgada à mídia local como acabou por acontecer.
2º- No cumprimento dos mandados de busca e apreensão não se encontrou em minha casa e gabinete um único valor em espécie, cheque, promissória ou bem de valor vultoso e de origem duvidosa tais como jóias, relógios e obras de arte.
3º-Não há no TCE/MS, seja na condição de comissionado ou terceirizado, ninguém com vínculo de parentesco comigo em afronta à Súmula Vinculante 13 do STF (súmula que veda a contratação de parentes até o 3º grau). Repito: Ninguém no TCE/MS é meu parente até 3º grau como proíbe a Súmula Vinculante 13 do STF.
4º Não há em meu gabinete nenhum servidor que esteja dispensado de comparecimento, trabalho e produtividade. Não lido e nem tolero com fantasmas e desídia no serviço público, nem mesmo durante a pandemia da COVID-19, já que o controle do trabalho remoto é rigoroso.
5º De posse de toda a representação do MPF ao STJ, estou refutando judicialmente de forma documental toda e qualquer dúvida ou insinuação velada de que pratiquei negócios jurídicos duvidosos ou ilegais.
6º- Acredito no poder judiciário e esclarecerei todos os atos reputados como pendentes de esclarecimentos, não apenas porque a autoridade policial deseja, mas por que todo e qualquer homem público (na minha condição e história) tem o dever de dissipar dúvidas seja perante as autoridades constituídas, seja perante seus amigos, já que em relação a esses o meu maior medo é envergonhá-los com meus atos.
7º Garanto a você meu amigo, que desde a malfadada operação, não tenho feito outra coisa com meu tempo senão dedicar esforço, vontade intelectual e moral para comprovar que meus atos (reputados como duvidosos na referida operação) são lícitos e dignos do cargo que ocupo e da minha amizade com você. Ninguém será surpreendido com o contrário das alegações da presente nota.
Abraço fraterno.
WALDIR NEVES.”

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