“Isso vai cercear o direito à investigação e o direito à transparência que o povo tem”. Assim o deputado federal Tio Trutis (PSL) avalia a resolução do (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), que restringe a atuação de promotores de Justiça em investigações contra agentes públicos e políticos protegidos pelo foro privilegiado.

O órgão se antecipou à pressão da classe política e publicou uma resolução ‘disciplinando' a atuação de promotores em inquéritos civis. Segundo o texto, assinado pelo PGJ (Procurador-Geral de Justiça), Paulo Cézar dos Passos, investigações que atingem agentes públicos com foro privilegiado, poderão, após análise, serem delegadas.

Na prática, segundo membros ouvidos pela reportagem, alguns trechos da medida blindariam ainda mais os suspeitos de corrupção em MS. Um deles, que causa preocupação no deputado federal, é o que determina que investigados sejam avisados com antecedência de 48 horas das oitivas.

Para Trutis, a mudança fatalmente culminará na ocultação de provas. “O elemento surpresa é básico de qualquer investigação científica. É primordial para não ocultação de provas. Se o princípio da prisão preventiva, por exemplo, é justamente não atrapalhar as investigações, como é que você vai avisar o investigado que ele vai ser alvo de uma diligência”, alerta incrédulo.

‘Pune quem está investigando'

Outro ponto, considerado absurdo pelo parlamentar, é a possibilidade de o investigado pedir a suspeição do membro responsável pela investigação. Pela resolução, inquéritos poderão até ter tramitação suspensa, a pedido de investigados, caso o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) entender razoável.

“O conjunto dessa normativa é todo absurdo, porque você acaba cerceando o direito de investigação e, de uma forma ou de outra, punindo quem está investigando e não quem está sendo investimento. A gente vai bater muito nisso ainda”, avisa.

‘Coloca fim nas principais investigações'

Trutis não vê nenhum problema em investigações serem tocadas por promotores – que a partir de agora, quando envolverem agentes com foro serão remetidas automaticamente ao PGJ (Procurador-Geral de Justiça) para análise e eventual delegação – e relembra um velho jargão político: “Quem não deve, não teme”.

“Isso vai colocar um fim às principais investigações que Mato Grosso do Sul têm interesse. Lama Asfáltica e outros escândalos de corrupção praticamente serão interrompidos”, avalia. “ Que medo essas pessoas tanto têm de investigação, qual o interesse maior por trás do cerceamento das investigações?”, questiona.

Medida é ‘Inacreditável', avaliam membros

“Parece inacreditável que isso aconteça no âmbito do Ministério Público em pleno estado democrático de direito… Mas, na prática, ele [o PGJ] obedeceu certinho ao que o governador mandou”, lamenta membro do MPMS que falou por telefone com a reportagem.

A deliberação aconteceu na semana passada e teria sido referendada pelo Colégio Superior que reúne os 35 Procuradores de Justiça do órgão – em reunião a portas fechadas com cerca de três horas. Em público e oficialmente, Passos manteve o discurso de que considerava a emenda inconstitucional, mesmo sem nunca cogitar retirar o projeto de pauta, que seria a forma mais segura de assegurar a atuação dos membros do MPMS.

Ao Midiamax, Passos se limitou a declarar que confiava nos deputados e apostava no consenso. Segundo membros do MPMS que comentaram o conteúdo com a reportagem, o texto, editado em meio à suposta queda de braço entre ALMS e MP-MS, atende a praticamente todas as reclamações e revela que o ‘consenso' foi construído às custas de cedência unilateral.

‘Melhor que a emenda dos deputados'

“Com essa resolução, os deputados nem precisam mais da emenda no projeto proibindo o chefe do MPMS de atribuir a prerrogativa de investigar agentes público e políticos com foro privilegiado. Saiu melhor que a encomenda, porque tem um monte de detalhes que praticamente engessam a investigação de quem está no poder”, pondera um procurador que garante ter sido ‘voto vencido', mas não aceita se identificar.

Durante a negociação, Paulo Passos se reuniu ao menos três vezes com o presidente da Casa de Leis, deputado Paulo Corrêa.

Conforme a resolução, publicada nesta segunda-feira (8), peças de informação, documentos ou procedimentos contra agentes com foro – o que originalmente seria de competência do PGJ – devem ser imediatamente remetidos a ele “para as providências que se fizerem necessárias”, podendo o PGJ delegar a presidência do respectivo procedimento ou a realização de atos específicos para quem escolher.

(Matéria editada às 15h19 para substituição do trecho “diligência – como busca e apreensão e condução coercitiva”, no terceiro parágrafo, por oitiva. O Midiamax reafirma o compromisso com a qualidade da informação e transparência)