Apurações envolveram falhas de atendimentos e aplicação de recursos

Aberto para apurar os motivos de 40 mortes de fetos ocorridas em 2015 no HU-UFGD (Hospital Universitário da Universidade Federal da Grande Dourados), distante 228 quilômetros de Campo Grande, um processo que tramitava no TCU (Tribunal de Contas da União) foi arquivado. Para a relatora do caso, ministra Ana Arraes, a solicitação de fiscalização feita pela Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados foi integralmente atendida após diligências realizadas no início deste ano.

O Jornal Midiamax apurou que os objetivos definidos pela equipe do TCU incluíam verificar “amostragem e com critério de risco e materialidade, a regularidade da aplicação dos recursos federais destinados ao HU/UFGD de 2013 a 2016, em razão de fatos denunciados pelo Conselho Municipal de Saúde; elucidar a morte de aproximadamente 40 fetos durante o ano de 2015, por possíveis falhas de atendimento, verificar a regularidade dos repasses dos recursos do Contrato Administrativo 604/2014, firmado com o Município de Dourados, no montante mensal de R$ 3.301.100,00; e apurar os motivos do cancelamento das cirurgias eletivas”.

ÓBITOS FETAIS

Apesar da vistoria realizada no HU-UFGD, o TCU não conseguiu descobrir as causas dos 40 óbitos fetais. “A avaliação das causas de óbitos maternos e perinatais restringiu-se ao exame do relatório de auditoria do Denasus, por limitações legais no trabalho de verificação de prontuários médicos. Verificou-se naquele relatório que, de janeiro de 2015 a janeiro de 2016, não havia documentação com registro do que haveria causado tais óbitos. Segundo o hospital, os controles eram realizados pela Vigilância Epidemiológica Municipal, e somente a partir de fevereiro de 2016 o hospital reconstituiu sua Comissão de Avaliação de Óbito e sua Comissão de Mortalidade Materna e Perinatal”, pontuaram os ministros.

Quanto aos casos de 2016, o Comitê Municipal de Prevenção de Mortalidade Materna, Infantil e Fetal apontou, “entre outras causas de óbitos que poderiam ser evitados, o acolhimento inadequado da gestante – a exemplo de supostas agressões verbais e até físicas pelos profissionais de saúde – e a falta de prontuário unificado no hospital universitário”.

POSSÍVEIS CAUSAS

“Nos registros das atas desse Comitê foram identificadas como suas possíveis causas, ainda: a fragilidade social; uso abusivo de álcool; violência doméstica; falhas na assistência ambulatorial (falta de testes rápidos de sífilis, exames alterados sem avaliação médica, falta de registro na carteira de pré-natal); e avaliação mais criteriosa das cardiopatias”.

Na justificativa para arquivar o processo, os ministros do TCU pontuaram que a EBSERH (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares), responsável pela administração do HU, contestou em inquérito instaurado pelo MPE (Ministério Público Federal) o aumento do número de óbitos, “pois a taxa de mortalidade perinatal do município seria inferior à da região Centro-Oeste e estaria dentro da média do Estado. Para aquela empresa, as mortes perinatais e neonatais precoces em apuração no inquérito do MPF eram inevitáveis, não houve falhas no atendimento do HU/UFGD e os óbitos também não decorreram de más condições de acesso aos serviços de ginecologia e de obstetrícia prestados pelo hospital”.

APLICAÇÃO DE RECUROS

Ainda de acordo com o TCU, “quanto à regularidade da aplicação dos recursos federais, foi registrado que o exame da documentação solicitada não constatou impropriedades. Os procedimentos licitatórios examinados foram considerados regulares. O Departamento Nacional de Auditoria do SUS – Denasus informou que, em levantamento realizado por aquele órgão, ter sido constatado que 82% da amostra de 22 processos de aquisição examinados ocorreram por meio de pregão eletrônico”.

Já em relação à regularidade dos repasses mensais dos recursos do contrato administrativo 604/2014, firmado com o Município de Dourados, no valor de R$ 3.301.100,00, foi constatado, segundo o Tribunal de Contas, “o atraso sistemático no repasse pela Secretaria Municipal de Saúde”. “Como o valor acordado incluía recursos federais, estaduais e municipais, foi solicitada ao Ministério da Saúde a transferência dos recursos federais diretamente ao nosocômio [HU] devido aos atrasos”.

Os ministros do TCU apuraram ainda que “os recursos estaduais, apesar de entregues com regularidade ao Fundo Municipal de Saúde – FMS, não eram transferidos para o HU/UFGD. Os repasses de janeiro a abril de 2015 (R$ 1.400.000,00) só foram transferidos em outubro daquele ano, e os de maio a setembro de 2015 (R$ 1.750.000,00), apenas em dezembro do mesmo ano. Os recursos municipais (R$ 72.921,18 mensais) também foram repassados com atraso”.

Esses atrasos, conforme o relatório da Corte, ocasionaram “falta de pagamento a fornecedores de materiais e equipamentos médicos, os quais retiveram seus produtos, o que ocasionou cancelamento e reagendamento de cirurgias eletivas por falta até mesmo de gases e aventais descartáveis”. “Por se tratar de recursos estaduais e municipais, propõe-se que o fato seja levado ao conhecimento do Tribunal de Contas do Estado”, destacaram os ministros.

RETENÇÃO DE VERBAS

Outra irregularidade apurada pelo TCU foi a retenção de R$ 2.450.000,00 que o município deveria repassar ao Hospital Universitário. Por determinação do ex-prefeito Murilo Zauith (PSB), essa verba deixou de ser paga à unidade hospitalar após constatação de rendimento abaixo da meta por parte do contratado.

“A questão chegou a ser judicializada e terminou com a assinatura de termos de ajustes de condutas, com descontos de valores relativos aos plantões médicos devidos ao FMS.  Calcada na impossibilidade de alteração unilateral do contrato firmado, a equipe de inspeção concluiu pela ilegalidade do desconto por suposto descumprimento de metas e propôs a ciência do fato ao Tribunal de Contas do Estado”, afirmaram os ministros.

Sobre os reagendamentos de cirurgias e falta de materiais básicos para funcionamento do HU-UFGD, a relatora do processo no TCU disse terem sido “identificados como causa dos transtornos apontados os atrasos nos repasses dos recursos pela secretaria de saúde municipal”. “A estabilidade do fluxo financeiro é fundamental para uma boa gestão. É impossível para os gestores se desincumbirem de suas responsabilidades com eficiência quando inexiste a mínima segurança acerca do fluxo financeiro que está a seu dispor, o que justifica os denunciados adiamentos das cirurgias”, opinou.

RESOLUÇÕES

Além de determinar que o TCE-MS (Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul) seja comunicado das informações referentes à aplicação de recursos estaduais e municipais no HU-UFGD, o TCU também determinou à Fundação Universidade Federal da Grande Dourados que informe, “no relatório de gestão/prestação de contas do exercício de 2017, acerca da implantação do projeto ‘Desenvolvimento e Aprimoramento de Habilidades Sociais – Humanização’ e das providências adotadas para aperfeiçoar o controle no preenchimento e alimentação dos prontuários médicos de número único do hospital universitário”.

Essa resolução direcionada à Fundação Universidade Federal da Grande Dourados deverá ter seu cumprimento acompanhado pela Secretaria de Controle Externo no Estado de Mato Grosso do Sul, segundo a deliberação dos ministros do TCU.