A Comissão de Meio Ambiente da Câmara Municipal de Campo Grande realizou, na manhã desta quinta-feira (9), uma audiência pública para debater os impactos das mudanças climáticas no cotidiano da Capital Morena. O encontro reuniu especialistas, profissionais e estudantes das áreas de Direito, Gestão Ambiental e Urbanismo.
Apesar de convidados, a audiência não contou com representantes do alto escalão da Prefeitura. Estiveram ausentes o secretário Ademar da Silva Júnior, da Semadesc (Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação), a diretora da Planurb (Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano), Berenice Maria Jacob Domingues, e o diretor da Emha (Agência Municipal de Habitação e Assuntos Fundiários), Claudio Marques.
Para o vereador Jean Ferreira (PT), presidente da Comissão e propositor da audiência, a ausência de autoridades da administração revela a indisposição da administração municipal em dialogar sobre uma pauta urgente, que afeta diretamente a vida da população.
“A gente meio que já esperava essa ausência. Todo ano, no mesmo período, temos esses impactos climáticos, crises, alagamentos… E sempre com a mesma desculpa: que não estavam prontos, não estavam preparados. Mas infelizmente, todo ano acontece e nunca há prevenção. Então a gente está aqui justamente para discutir isso. A própria audiência mostrou que não viemos aqui para apontar culpados — embora eu esteja na oposição —, mas para tirar propostas, soluções”, afirmou o parlamentar ao Midiamax.
A vereadora Luiza Ribeiro (PT) classificou a ausência institucional como um erro grave. “Quando a falta é institucional, aí é grave, porque não está na esfera do administrador, do secretário de município, da própria prefeita, vir ou não a uma reunião como essa. O comportamento está vinculado às suas responsabilidades municipais. É uma ausência que indica, vamos dizer, um desprezo por esse tema, e isso é muito perigoso para todos nós, porque nós escolhemos esse governo. A sociedade elegeu, e hoje podemos correr riscos, inclusive físicos, porque essas autoridades desprezam as consequências da crise climática”, criticou.
Debate técnico e urgente
A mesa da audiência contou com nomes de destaque na defesa do meio ambiente: a professora doutora Maria Helena da Silva Andrade, bióloga e docente na UFMS; o professor doutor Ariel Ortiz, engenheiro ambiental e docente na mesma universidade; a professora doutora Lívia Gaigher, docente de Direito na UFMS e representante na ONU para causas climáticas; a juíza federal Raquel Domingues do Amaral, da 3ª Região, especialista em Direito Ambiental; a arquiteta Neila Janes, mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional, servidora da Sisep; e o gerente de operações da Defesa Civil, Enéas Neto.
O debate destacou a necessidade de políticas públicas e mecanismos legislativos para mitigar os impactos das mudanças climáticas, a partir da valorização dos recursos naturais e da revisão do planejamento urbano, com foco em investimentos de modernização da cidade.
“Nós temos o nosso Plano Diretor, que tem grande contribuição para a preservação e direcionamento das obras da cidade — tanto de drenagem, construções e moradias — como para recepcionar os novos empreendimentos que chegam a Campo Grande e, muitas vezes, conflitam com a conservação de matas nativas. Estamos tentando trazer novos mecanismos, reflexões e alterações necessárias nos dispositivos legais que já temos hoje”, ressaltou o vereador Jean.
Apesar da relevância do tema, o debate ainda esbarra no desafio de alcançar as comunidades de base. Pesquisa do Datafolha revela que aumentou de 5% para 9% — entre junho de 2024 e abril de 2025 — o número de brasileiros que negam os riscos das mudanças climáticas. O levantamento ouviu 2.002 pessoas com 16 anos ou mais, em 113 municípios, entre os dias 8 e 11 de abril deste ano. A margem de erro é de dois pontos percentuais, com nível de confiança de 95%.
A percepção de risco também varia conforme a região. No Centro-Oeste e Norte, 50% reconhecem a gravidade do problema, enquanto no Sul e Sudeste os percentuais são de 57% e 56%, respectivamente. No Nordeste, o índice atinge 49%. Em municípios com histórico recente de desastres climáticos, o senso de urgência é ainda maior.
“Precisamos trazer para toda a sociedade a preocupação sobre como vamos nos comportar daqui para frente diante desse momento de crise ambiental. Porque a crise ambiental chegou nesse ponto agora, mas não se formou do dia para a noite. Foi uma sucessiva ação nossa, das pessoas em todos os lugares do mundo, provocando uma situação ambiental preocupante. É preciso tratar sobre isso, adaptar a cidade para proteger todos nós, mas também precisamos alterar o comportamento”, alertou Luiza Ribeiro.
Entre os desdobramentos da audiência pública, está a proposta de criação de um Fórum Permanente de Acompanhamento das Mudanças Climáticas. A ideia é garantir continuidade ao debate, articulação entre sociedade civil, academia e poder público, e maior pressão por políticas efetivas que protejam a cidade e sua população diante dos efeitos cada vez mais severos do clima.