O juiz Roberto Ferreira Filho, da 53ª Zona Eleitoral de , rejeitou recurso e vai julgar a candidatura de Sérgio Harfouche () à prefeitura. O procurador licenciado pediu que o magistrado se declarasse impedido por considerar que teriam uma “inimizade pública”. A exceção de suspeição foi apresentada no sábado (10). Nesta terça-feira (13), Ferreira Filho rebateu as alegações de Harfouche.

Na peça, publicada no Mural Eletrônico do TRE-MS (Tribunal Regional Eleitoral de ), o juiz aponta que não se vê como amigo próximo ou mesmo inimigo do candidato, citando o Código de Processo Civil. O magistrado lembra que atuou na então Vara de Infância e de Campo Grande, juiz auxiliar da Coordenadoria da Infância e Juventude do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) e presidiu uma entidade de classe. Nessa época, Ferreira Filho confirma que conviveu com Harfouche, que era promotor na mesma área, concordando e discordando dele apenas em âmbito processual.

O juiz sustenta que discordâncias são naturais entre os praticantes do Direito. “Divergências no campo das ideias jamais me tornaram inimigo de quem comigo diverge, assim como, em sentido diametralmente oposto, concordância nesta seara jamais me fizeram amigo íntimo de quem quer que seja”, escreveu.

Ferreira Filho destaca que reportagens jornalísticas apenas demonstram que ele tem concepções jurídicas diferentes do hoje procurador licenciado e ainda demonstra preocupação ao destacar que o recurso de exceção foi impetrado após Harfouche se tornar alvo de duas ações de impugnação

“Se tudo isso não bastasse, chama atenção o fato da citada suspeição não ter sido arguida quando o pleito de registro de candidatura formulada pelo ora excipiente [Harfouche], isto em 23.9.20, foi distribuída a mim, somente sendo manejada após a apresentação de impugnações à sua candidatura, de onde cabe a indagação: não era suspeito para apreciar o aludido registro, ainda que, de ofício, como é sabido, pudesse indeferi-lo, reconhecendo, por exemplo e dizendo em tese, algum não preenchimento de algumas das condições de elegibilidade, e passo a sê-lo, apenas e tão somente, após as citadas impugnações?”, questionou.

Em seguida, o magistrado cita casos semelhantes no TJMS e mais uma vez não esconde seu espanto com o recurso.

“Outrossim, e o digo respeitosamente, se o excipiente se considera meu ‘inimigo' (a despeito da surpresa que esta assertiva me causa!), isso não significa, absolutamente, que a recíproca seja verdadeira, pelas razões já expostas alhures”, frisou.

Por fim, o magistrado destaca que não há motivos legais para suspeição, cabendo apenas entre as partes de um processo. Caso contrário, criaria uma grande insegurança jurídica.

“Nesse contexto, certo é que a anunciada inimizade pessoal do excipiente [Harfouche] em relação a mim não me faz suspeito para o julgamento do registro de sua candidatura e das respectivas impugnações; o que se revelaria, tão somente, se houvesse, de minha parte, qualquer sentimento de amizade íntima ou de inimizade em sua direção, o que, à evidência, não há, a despeito das convergências e divergências de entendimentos que tivemos durante, mui especialmente, o já distante período em que atuamos na área da infância e juventude nesta Comarca”, finalizou.

Crítica

Jurista com mais de 35 anos de experiência e com atuação na Justiça Eleitoral de Mato Grosso do Sul analisou o caso a pedido do Jornal Midiamax. Para ele, o pedido de Harfouche é autoritário e causa estranheza.

“Causa estranhamento ao meio jurídico um procurador de Justiça usar a opção política ideológica de um magistrado para tentar a suspeição do mesmo. Isso é autoritário, para não dizer ditatorial. E inegavelmente nos remete à incerteza sobre o direito pretendido. Quem tem certeza do direito não recorre a esses subterfúgios considerados medidas extremas, ainda mais já na primeira instância”, disse.

Questionamentos

Harfouche ingressou no MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) em 1992 e em 2017 foi promovido a procurador por antiguidade. Até se licenciar do cargo há 5 meses, o procurador atuava na 23ª Procuradoria de Justiça Criminal, o nome dele ainda consta, inclusive, no site oficial do órgão como titular da procuradoria. A licença do cargo, autorizada pelo PGJ (procurador-geral de Justiça), Paulo Passos, foi publicada em 3 de abril.

O que ocorre são entendimentos distintos a respeito da Emenda Constitucional 45, promulgada em 2004. A alteração constitucional detalha que membros do Ministério Público que desejarem ingressar na carreira política devem renunciar ao vínculo com o MP, seja por pedido de exoneração ou aposentadoria. Algumas exceções são citadas na emenda, como por exemplo casos de membros que optaram por regime anterior ao da Constituição de 1988, essa possibilidade, contudo, só seria válida para quem ingressou na carreira até 1988.

Em uma vertente, alguns avaliam que apenas a licença do cargo seria suficiente para quem ingressou na carreira de promotor até 2004, porque a emenda constitucional não teria efeito de retroagir sobre casos de integrantes com datas de ingresso anteriores a esse período. Outra linha de magistrados defende que em razão da Constituição de 88, só deveria poder participar do pleito, sem se abster definitivamente da carreira, quem ingressou no MP até 1988.