Na manhã desta segunda-feira

Um grande desafio atual é garantir a sustentabilidade do crescimento das cidades, conciliando o desenvolvimento econômico e social com o processo de urbanização, sendo o saneamento básico decisivo para garantir saúde às famílias. Na manhã desta segunda-feira (25/4), o assunto foi discutido no auditório do Santuário Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, em Campo Grande, durante a Saneamento: Um Direito de Todos, proposta pelos deputados Junior Mochi (PMDB), presidente da Assembleia Legislativa, e Pedro Kemp (PT), em parceria com a Câmara Municipal de Campo Grande, a Arquidiocese de Campo Grande e a Comissão Regional de Justiça e Paz da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

A igreja sediou os debates, alinhados com a Campanha da Fraternidade Ecumênica 2016, que traz como tema Casa comum, nossa responsabilidade, despertando a reflexão cidadã com relação à preservação ambiental. Para o presidente da Assembleia Legislativa, Junior Mochi, a reunião de especialistas na área do saneamento, agentes políticos e lideranças religiosas proporciona decisões mais assertivas.

“A união faz a força. Neste caso, Legislativo Estadual e Câmara dos Vereadores somam forças, uma fez que a concessão do serviço de saneamento é de responsabilidade do município”.  Para ele, o envolvimento da igreja e segmentos que abrangem a questão dará contribuição significativa para os tão desejados resultados positivos.

“Os resultados aqui obtidos não serão em vão e, se hoje, programas de grande porte contemplam investimentos, foi exatamente a mobilização da sociedade quem impôs. E, mesmo assim, ainda estamos longe de índices minimamente civilizados”, alertou. Mochi lembrou que, enquanto 96% da água que chega às casas dos campo-grandenses é potável, a mesma eficiência não é verificada nas obras de esgoto e na gestão dos resíduos sólidos.  De acordo com Pedro Kemp, o debate também fomenta novas políticas públicas para garantir serviços essenciais.

“O saneamento é um recurso básico e um serviço essencial à vida, à saúde e ao meio ambiente. Profundas reformulações sociais, econômicas e políticas são necessárias para alcançarmos a sociedade que pretendemos e queremos ser. Acredito que a consciência em diminuir o consumismo é uma das formas de contribuirmos com a casa comum”, analisou, lembrando que o lixo, resultante de diversos tipos de embalagens descartadas, também deve ter destinação sustentável. Ele enfatizou que cabe ao Poder Público adotar medidas, mas a população precisa rever condutas no dia a dia.  As igrejas cristãs pretendem contribuir para a reflexão crítica dos modelos de desenvolvimento que têm orientado a política e a economia.

“Acreditamos que a fé sem obras é morta. A Campanha da Fraternidade é uma forma de viver a Quaresma. Nossa intenção é refletir como estão estruturadas as nossas cidades e quem realmente tem acesso ao saneamento básico”, explicou Dom Dimas Lara Barbosa, arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Campo Grande. Para a 1ª secretária da Comissão Regional de Justiça e Paz, Margarida Cavalheiro, o atual sistema está ameaçando a vida e o sustento de muitas pessoas, em especial das famílias mais pobres. “A falta de saneamento básico tem atingido principalmente o desfavorecido, nossos irmãos da periferia. Muitas doenças estão se alastrando em decorrência da falta de saneamento”, disse a representante da CNBB. Segundo a defensora pública Olga Lemos Cardoso de Marco, o órgão recebe frequentemente denúncias de precárias condições de saneamento básico e de seus impactos ambientais, em especial nos bairros da periferia.

 “A falta de saneamento fere o menos favorecido. Dados apontam que apenas 24% da população possui acesso a este serviço essencial.  Alguns loteamentos que estão sendo abertos não possuem qualquer estrutura de esgoto. O cidadão está sem banheiro, fazendo as necessidades pessoais nos terrenos baldios. Há também a questão ambiental e social que envolve o lixão de Campo Grande. A coleta diária é de aproximadamente 750 toneladas de lixo residencial e domiciliar. Após o fechamento do aterro, foram desamparadas 400 famílias sustentadas com o material reciclado tirado do lixo”, reforçou Olga. Para ela, resolver a destinação dos resíduos sólidos, com a correta destinação dos recicláveis, é ação urgente, considerando que atualmente todo o lixo de Campo Grande é enterrado. “Com o passar do tempo, teremos o lençol freático prejudicado”, disse. 

O engenheiro ambiental e professor Ariel Ortiz Gomes apresentou um panorama do saneamento básico no Brasil, Mato Grosso do Sul e Campo Grande. Segundo ele, garantir obras de drenagem e a destinação correta dos resíduos sólidos são os principais e mais urgentes desafios. “Precisamos de recursos para implementar o programa de drenagem que consta no Plano Diretor de 2008. A ampliação da coleta seletiva de lixo é mais do que necessária quando o assunto é a gestão de resíduos sólidos”. As condições sanitárias estão envenenando a população, na avaliação da engenheira agrônoma e pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Mato Grosso do Sul, Fernanda Savicki.

“A falta de condições básicas de saneamento produz situações de vulnerabilidade socioambiental, principalmente em áreas ocupadas por segmentos sociais mais empobrecidos. Isso tem trazido consequências generalizadas para a saúde da população”, informou.  Fernanda ressaltou que investir em saneamento não é despesa e representa economia de investimentos em saúde pública, considerando que a causa de diversas doenças está relacionada com a falta de condições mínimas de higiene e saneamento básico. “Sabemos que são obras invisíveis, mas é impressionante quanto deixariam de onerar o SUS [Sistema Único de Saúde] e ajudariam inclusive no controle do Aedes aegypti, já que hoje não há mais picos e a epidemia é o ano inteiro”. 

Também foi proposto pelos participantes que ações de conscientização sejam realizadas nas escolas, orientando crianças e adolescentes, e que seja estimulada a prática da compostagem, para geração de adubo orgânico, nas residências. Especialistas, catadores de recicláveis e representantes de empresas ligadas ao tema também participaram dos debates e apresentaram sugestões.

 “Fomos educados a pegar uma coca-cola e jogar a lata fora e se for assim não adianta”, disse o catador Rodrigo Marques. Ele defendeu a atuação das famílias que vivem da comercialização dos recicláveis. “Eu tenho outra profissão, mas me apaixonei e me sinto contente de ainda ajudar a construir um futuro melhor, contribuindo com o meio ambiente”, afirmou.

Marques explicou a dificuldade enfrentada pelos catadores e pediu providências. “Hoje, não tem mais a separação e todo o lixo é enterrado, mesmo com os trabalhadores lá; precisamos de políticas públicas”, afirmou.  As sugestões apresentadas durante a audiência pública serão reunidas em uma carta-compromisso, a ser elaborada pela CNBB e entregue aos gestores públicos. “Também vamos pedir a assinatura dos candidatos a prefeito de Campo Grande, para que se comprometam ou justifiquem, caso não assinem”, informou Dom Dimas.