Adepol-MS ataca jornalistas e esconde delegada que mandou vítima ‘conversar’ com assassino horas antes da morte
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Nesta segunda-feira (17), a Adepol-MS (Associação dos Delegados de Polícia do Estado de Mato Grosso do Sul) emitiu nota em que ataca jornalista do Midiamax. A nota trata de reportagem em que o jornal expõe que a delegada que atendeu e registrou o boletim de ocorrência de Vanessa Ricarte, vítima de feminicídio aos 42 anos, chegou à delegacia ainda em estágio probatório.
Na nota, a associação afirma que o atendimento criticado por áudio pela vítima de feminicídio Vanessa Ricarte não foi executado pela delegada Ricely Maria Albuquerque. No entanto, não esclarece quem foi a delegada que, segundo Vanessa disse antes de ser assassinada, tratou a vítima com ‘frieza’ enquanto ela buscava atendimento na Deam.
Até o momento, Sejusp, DGPC, DEAM e a própria Adepol se mantêm calados sobre quem seria a delegada cujo atendimento fez a mulher que procurava socorro na Casa da Mulher Brasileira se sentir ‘mal tratada’.
A reportagem do Jornal Midiamax acionou todos e ainda diretamente a delegada que registrou a ocorrência para se manifestar ANTES de a reportagem ser publicada. Assim que a delegada respondeu, sua versão foi imediatamente adicionada.
No entanto, o que a reportagem registra é que Riccelly foi quem atendeu Vanessa, assim como consta no boletim de ocorrência.
De fato, a delegada citada na notícia é a servidora pública que assinou como delegado de polícia o boletim de ocorrência relativo ao atendimento da jornalista. O Jornal Midiamax teve acesso a documento com fé pública que comprova o fato.
Mais uma nota da Adepol: tática de intimidação e mulheres sob ataque
A nota da Adepol ainda recorre ao recurso de usar inadequadamente termos da moda, como ‘fakenews’, tentando imputar falsidade à matéria. O jornal reitera que a notícia não é falsa. De fato, conforme noticiado, quem responde legalmente como delegado de polícia pelo primeiro atendimento à jornalista é a delegada Riccelly.
Além disso, a Adepol-MS ainda diz que a reportagem ‘ataca a honra de uma mulher trabalhadora’, parágrafos depois de citar o nome da jornalista que escreveu a notícia em tom de censura. O ataque à reputação de jornalistas não é novidade entre servidores da segurança pública de MS quando se sentem acuados.
Quem mandou a jornalista ‘conversar’ com assassino horas antes do crime?
O que a Polícia Civil ainda afirma, desde coletiva de imprensa realizada na Deam após a morte de Vanessa, é que a vítima procurou a delegacia mais de uma vez. Ou seja, teria registrado o boletim de ocorrência de madrugada e voltado na delegacia à tarde.
No entanto, não foi apresentado até o momento documento oficial que comprove que Vanessa buscou a delegacia à tarde ou o que ela solicitou. Assim, enquanto as autoridades se calam, o episódio segue nebuloso.
Também não há registro sobre qual delegada teria destratado a jornalista, que em áudio enviado pelo WhatsApp retrata o horror que passou no atendimento momentos antes de ser assassinada.
O Conselho de Ética da Adepol-MS, bem como a diretoria, se mantêm calados sobre a apuração das supostas falhas operacionais e técnicas que podem ter sido cometidas no episódio.
Também não se comentam os questionamentos sobre como delegadas apontadas como inexperientes, que ainda estão no estágio probatório, deixaram o interior e chegaram até a DEAM, delegacia especializada que exige experiência e vocação, segundo delegadas mesmo disseram ao Jornal Midiamax.
Confira a nota na íntegra:
“A Associação dos Delegados de Polícia de Mato Grosso do Sul (ADEPOL/MS), a respeito de notícia veiculada pelo Jornal Midiamax em data de 17/02/2025, de autoria de Thatiana Melo, com o título “Delegada que atendeu Vanessa horas antes do feminicídio chegou à Deam mesmo em estágio probatório”, cujo teor imputa a Delegada de Polícia Ricelly Maria Albuquerque Donha o atendimento criticado por áudio pela vítima de feminicídio Vanessa Ricarte, e a partir disso tece diversos comentários difamatórios contra a delegada ESCLARECE que o atendimento em questão não foi executado pela Delegada de Polícia Ricelly Maria Albuquerque Donha, portanto a matéria é falsa, ataca a honra de uma mulher, trabalhadora e cidadã de forma truculenta e descabida, demonstrando uma sanha acusatória violenta e injustificável. A ADEPOL-MS segue vigilante na defesa da honra e prerrogativa de seus Delegados associados, e não admitirá ataques descabidos de tal natureza, razão pela qual serão adotadas as medidas judiciais criminais e cíveis em desfavor da autora da fake News”.
Estágio probatório
A delegada que atendeu a jornalista Vanessa Ricarte, de 42 anos, e registrou o boletim de ocorrência em que a vítima denuncia o ex-noivo é a delegada Riccelly Maria Albuquerque Donhas, que passou no último concurso da Polícia Civil, em Mato Grosso do Sul, e está em estágio probatório.
A suposta inexperiência da delegada é apontada pelos próprios colegas de profissão como um dos fatores determinantes para que Vanessa classificasse, em áudio enviado para uma amiga, que foi tratada de maneira ‘fria e seca’ na Deam, horas antes de ser assassinada pelo seu ex-noivo.
O local, que deveria ser de acolhimento à vítima, foi de orientações desencontradas. A jornalista ainda relata que uma delegada teria dito para ela ligar para Caio pedindo que ele deixasse a sua residência.
‘Rejeitado’ escolta
Em entrevista coletiva, a delegada titular da Deam, Eliane Benicasa, disse para toda imprensa campo-grandense que teria oferecido escolta, mas a jornalista teria ‘rejeitado’. Vários jornais de Campo Grande compraram a versão policial.
Os relatos de Vanessa apontam descaso e erros grosseiros no atendimento que ela recebeu quando procurou ajuda na Casa da Mulher Brasileira. Como em muitos casos de feminicídio em Mato Grosso do Sul, a ajuda não chegou a tempo.
A jornalista detalhou para uma amiga pouco antes de ser assassinada que esperava ‘chegar com a polícia’ para tirar o assassino da casa dela. Não conseguiu.
Sem escolta, Vanessa foi morta com três facadas pelo agressor, que já tinha longo histórico de ocorrências por violência doméstica.
O Jornal Midiamax entrou em contato com a delegada Riccelly para saber se todos os protocolos foram seguidos. Em resposta, depois que a notícia foi ao ar, a delegada se limitou a dizer que não foi ela quem realizou o atendimento a que Vanessa se referia no áudio.
Assim que essa informação chegou ao jornal, foi adicionada à notícia. O Jornal Midiamax reitera seu compromisso com a verdade e com o amplo espaço de manifestação para todos, como sempre praticou.
“Vocês estão expondo meu nome e meu trabalho de forma errada”, afirmou. No entanto, o Midiamax teve acesso ao boletim de ocorrência do caso, em que consta o nome de Riccelly como a plantonista responsável pelo registro.
Ainda segundo a delegada, o atendimento a que Vanessa se refere teria acontecido em momento posterior. O Midiamax ainda aguarda um posicionamento oficial sobre o caso.
Ministério das Mulheres: Governo Federal promete apurar falhas em MS
Neste fim de semana, em uma reunião com a Comitiva do Ministério das Mulheres, em Campo Grande, após o feminicídio da jornalista Vanessa Ricarte, de 42 anos, foi discutida a revisão do protocolo de situação de risco de vítimas, segundo a desembargadora Jaceguara Dantas, titular da Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul).
A Comitiva do Ministério das Mulheres em Campo Grande afirmou que o atendimento da Casa da Mulher da Capital precisa de aperfeiçoamento. Reunião deste domingo (16) terminou com a promessa de produção de relatório sobre melhorias no atendimento às mulheres na Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher de MS) e Casa da Mulher Brasileira.
O documento deverá ser entregue à ministra Cida Gonçalves e posteriormente a autoridades nacionais, para providências sobre as denúncias apontadas em áudio da jornalista morta pelo ex-noivo.
A ouvidora do Ministério da Mulher, Graziele Carra Dias, disse que o atendimento “precisa ser aperfeiçoado em vários setores, não só aqui na Casa da Mulher em Campo Grande, mas como em várias outras casas das mulheres”.
Apontou que existe um “monitoramento constante com a CNEV e com o Ministério das Mulheres em outras Casas”. Disse que a visita é frequente em outras unidades da Casa da Mulher. “Aqui, como é a mais antiga, né, é o primeiro protocolo, primeiro de relacionamento, então tudo isso está sendo aperfeiçoado”, reforçou.