Dupla acusada de participar de execução de abusador da Homex nega: ‘Ficamos do lado de fora’

Felipe Batista Carvalho teria sido morto estrangulado após abuso sexual de menina de 11 anos

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Bruno (de cinza) e Maykon (de amarelo), suspeitos de executarem Felipe – (Foto: Victória Bissaco, Midiamax)

Bruno Henrique Soares Ortega e Maykon Leiva Monção encaram julgamento popular nesta terça-feira (29), um dos últimos júris de outubro. A dupla é acusada de participar da execução de Felipe Batista Carvalho, de 19 anos, encontrado morto em terreno nas margens da Avenida Wilson Paes de Barros, região do Jardim São Conrado, no dia 20 de abril de 2022. A vítima seria suspeita de abusar sexualmente de uma criança, de 11 anos.

A denúncia do Ministério Público aponta que Bruno, Maykon e mais quatro pessoas, sendo uma delas Thaynara Ribeiro Gomes, mataram Felipe Batista Carvalho após envolvimento amoroso e sexual dele com a menina. Vale ressaltar que a relação sexual com menores de 14 anos é crime de estupro, conforme estabelecido no Código Penal.

Contudo, essa não teria sido a maior motivação. As investigações apontam que Thaynara, mãe da criança, teria demonstrado interesse romântico em Felipe, que a negou. Então, ela acionou o pai da menina, que estava preso, e convocou a execução do rapaz.

O delegado titular da DHPP (Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa), Carlos Delano, explicou que, a princípio, Felipe foi dado como desaparecido pela família. “Nos chamou atenção por conta de algumas informações contidas nos depoimentos dos familiares que destoavam dos corriqueiros. As informações prestadas falavam que as últimas mensagens de Felipe diziam que ele estava sob o poder de irmãos de determinadas facções e que ele estaria indo a uma cantoneira. Essa terminologia é muito característica do PCC”, explica.

Bruno, o primeiro dos réus a prestar depoimento no júri popular, confirmou que a motivação da execução foi o abuso cometido por Felipe. “É uma criança que estava começando a vida, já passa por traumas psicológicos, que também era uma criança querida, e que vivia sempre brincando ali […] Então, dentro da comunidade, são várias pessoas em si que acabam se apegando e criando vínculos, tanto com os pais, quanto com as crianças. Foi uma revolta na comunidade que aconteceu com a menina”.

Carlos Delano, por sua vez, explicou que Thaynara sentia ciúmes em virtude do interesse dela por Felipe não ter sido correspondido, então, relatou o estupro aos irmãos de facção, dizendo, ainda, que a filha possuía deficiência intelectual. O caso foi confessado pela própria vítima ao pai, que relatou em depoimento ao delegado durante as investigações.

1ª Cantoneira

As cantoneiras, conforme explicou o delegado Carlos Delano, são os locais onde as pessoas são mantidas em cárcere até a decisão final do Tribunal do Crime. Felipe foi mantido em cárcere em duas cantoneiras. A primeira foi na casa de Thaynara.

Bruno ‘Davi’ esteve nessa cantoneira. Isso porque contou exercer o papel de disciplina e, em palavras dele, “mantém a quebrada em paz. Não deixa que brigas estraguem a quebrada. Se rouba, é punido. Se bate na mulher, é punido. Porque tem coisa que a gente não pode esperar a Polícia. Caso o disciplina não resolva, é levado a uma hierarquia maior”.

Ele também relatou que a 1ª cantoneira foi onde ocorreu a “primeira instância”, ou seja, foi no local que os fatos sobre o abuso sexual começaram a ser apurados. “Na primeira cantoneira, até então, a gente estava apurando se houve o contato sexual entre o menino [Felipe] e a menina [de 11 anos]. Ele assumiu que teria tido a relação, até mesmo forçada, com a menina”, declarou Bruno ‘Davi’.

O delegado, em depoimento, contou que os membros mantiveram Felipe na casa de Thaynara por cerca de 30 a 40 minutos, até que decidiram ir para outro local. A vítima conseguiu avisar o pai por mensagem que seria levado para a segunda cantoneira. “Não sei o que vai acontecer. Manda um abraço para mãe e amanhã a gente conversa”, dizia a mensagem.

Réus acompanham depoimento do delegado da DHPP – (Foto: Victória Bissaco, Midiamax)

Bruno, por sua vez, afirma que recebeu ordens de superiores para trocar de cantoneira, para a apuração ser feita em um local “mais seguro”. É aí que entra Maykon, apontam as investigações. Carlos Delano explicou que ele foi responsável, junto a esposa “Arlequina”, por transportar Felipe – ainda com vida – até a segunda cantoneira, no Pioneiros.

Maykon alegou aos jurados que não tinha conhecimento da execução quando foi chamado para o transporte. “O Bruno me chamou e disse que era para eu levar de um ponto A até um ponto B. Eu costumava dar carona para ele, porque conheço ele há bastante tempo, e fui. Tanto que eu e minha esposa estávamos bebendo em uma conveniência”, conta.

Ainda, disse que apenas soube do que se tratava já no local. “Foi onde ele me disse ‘Maykinho, você tem que ficar aqui’, e me explicou que o menino tinha abusado da menina de 11 anos. Eu falei que não tinha nada a ver e iria embora. Então, desceu o ‘sintonia’ e disse que eu era obrigado a ficar”, alega.

2ª cantoneira

O local era uma das casas de um terceiro indivíduo, apelidado de ‘Jamaica’, que seria o ‘missionário’, ou seja, o matador. Tanto Bruno quanto Maykon negam que tenham participado da execução. “A gente já ficou do lado de fora da casa. Quem ficou do lado de dentro executando era ‘Gordinho’ e Jamaica”.

Esses dois últimos – Jamaica e Gordinho, também chamado de ‘Paquistão’ – foram buscados no meio do percurso entre a primeira para a segunda cantoneira, explicaram os réus. Eles seriam os responsáveis por matar e ocultar o corpo de Felipe.

A execução foi filmada pelo celular de Bruno, que disse ter recebido ordens durante a ‘radiação’ – ligação telefônica – para deixar o aparelho perto de uma janela filmando, mas reforçou não ter nenhuma participação na execução de Felipe.

O corpo do rapaz estava com as mãos amarradas (Foto: Henrique Arakaki, Midiamax)

Nessa cantoneira, morava ‘Bugão’, que morreu tempos após prestar depoimento. O delegado Delano contou ao Plenário que Bugão alegou ter sido forçado a sair da residência. O homem foi até uma igreja e, ao voltar, encontrou homens armados na casa. No amanhecer de 16 abril de 2022, viu alguns homens colocando o cadáver de Felipe no carro e indo embora.

Ocultação de cadáver

Maykon nega ter participado da ocultação de cadáver, e Bruno não só nega a participação, mas também que o caso se trate de uma ocultação de cadáver. “Ocultação para gente seria se o corpo tivesse num local escondido, mas só estava dentro de uma mata. Em momento algum entrei nesse carro para levar o corpo até o local onde foi encontrado, apenas Gordinho e Jamaica”.

Bruno ‘Davi’ também declarou em depoimento que não poderia ficar omisso ao estupro de vulnerável cometido por Felipe. “Se eu tivesse ocultado uma ciência que seria uma ciência, a situação poderia até ter sido contra mim”.

Outro ponto em comum do depoimento dos réus é quanto a participação no PCC. Bruno disse não ser mais integrante da facção, enquanto Maykon negou qualquer envolvimento e disse conhecer os termos após aprendê-los na Máxima, onde está preso. “Graças a Deus estou me aprofundando e aprendendo cada dia mais [funcionamento do PCC] para poder trazer para vocês aqui hoje”.

Defesa pediu recurso

Bruno, Maykon e Thaynara são os únicos três dos seis réus do processo a encarar o júri popular. Hoje apenas Michael e Bruno estão presentes, porque a defesa de Thaynara entrou com recurso, que ainda não foi julgado.

Então, o juiz Carlos Alberto Garcete desmembrou o caso, marcando o julgamento daqueles que estão preparados para o tribunal do juri. A Thaynara deve ser julgada posteriormente caso o recurso seja negado.

O trio responde por homicídio doloso qualificado por motivo torpe, recurso que dificultou a defesa da vítima e meio cruel, além de associação criminosa e ocultação de cadáver.

Corpo encontrado no Nova Campo Grande

O corpo do rapaz que estava com as mãos amarradas foi localizado na tarde do dia 20 de abril de 2022, já em avançado estado de decomposição, em terreno nas margens da Avenida Wilson Paes de Barros, região do Jardim São Conrado.

O corpo também estava coberto por um pano. De início, a suspeita já era de que o homem estaria morto há pelo menos três dias, pelo estado de decomposição.

Catador de recicláveis que estava no local disse ao Midiamax que costuma ir na região para coletar material. “Até assustei com o mau cheiro, achei que era um animal morto”, disse.

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