Acusado assumiu em julgamento que não orientava a filha

Aos 14 anos, a filha perdeu a virgindade. A mãe, aos 35, perdeu a vida pelas mãos do companheiro de mais de 20 anos. Em 10 de julho de 2013, Josemal Gomes Fernandes, 56 anos, foi até a casa da sogra e fez quatro disparos que acabaram com a vida de Edna Nascimento da Silva. O irmão dela também foi atingido de raspão. O motivo do crime: ele não aceitou o fim do casamento e descobriu que a filha mais velha do casal tinha iniciado a vida sexual. 

Durante o julgamento nesta sexta-feira (7), na 2ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande, um dos jurados questionou Josemal, “Você orientava a sua filha?”, palavras lidas pelo juiz titular da Vara, Aluízio Pereira dos Santos. “Pela minha criação, eu não falava. Sentia vergonha, mas cobrava que a mãe orientasse”, respondeu o acusado. 

Assassino diz a júri que matou ex-mulher por deixar a filha perder a virgindadeMuitos familiares de Edna foram ao julgamento. A mãe de Edna, Jandira da Silva Nascimento, aos 64 anos, conta que não aguenta mais a espera por uma decisão da Justiça. “Espero colocar um fim nesse sufoco. Quero justiça. Não aguento mais, demorou muito tempo”, diz Jandira. “Queremos que ele saia daqui para o lugar que merece”, diz a irmã.

A irmã, Luziene Nascimento da Silva conta que as filhas mais novas de Edna, que atualmente tem 11 anos e 7 anos moram com o pai. A mais velha ficou sob tutela dela e atualmente, com 17 anos, está casada e tem um filhinho de 1 ano. O casal ficou junto por 22 anos e estava separado há três dias quando o feminicídio ocorreu. Josemal ficou três meses preso e ganhou liberdade.

Antes do crime
Lara Lins Nascimento da Silva, sobrinha da Edna, tinha 16 anos na época. Ela diz que nunca viu agressões entre o casal. No dia do crime ele foi na casa da família dela. “A minha mãe sentiu que ele estava estranho e me mandou segui-lo. Eu fui de moto, ele me viu e virou em uma esquina para disfarçar. Depois veio o meu tio correndo. Ele atirou nela pelas costas”, relembra.

A sobrinha conta que antes do relacionamento da tia acabar, Josemal teria começado a ganhar mais dinheiro e esquecido da família. “Ela cansou disso e começou a ver a vida de outra forma. Resolveu que não queria mais o casamento”. Lara confirma que a briga que motivou o crime teve relação com a prima, a filha mais velha do casal. O acusado já estaria inconformado com o fim do casamento e ficou sabendo que a filha perdeu a virgindade com o namorado.

Durante o julgamento, a questão foi levantada por uma das testemunhas que justificou que Josemal era um bom pai, trabalhador e que ficou sabendo por meio de fofocas que a filha não era mais virgem.

Segundo a sobrinha de Edna, após o crime, Josemal não mostrou arrependimento. “Ele matou a minha tia e inventou injúrias de que ela levava homens em casa. Ele fez tudo de forma premeditada. Ele chegou na casa da minha mãe e ela percebeu que ele estava diferente, frio. Disse que tinha ido a Nova Alvorada e falou que ia na casa da meu avô. Ele deu uma abraço frio na gente e disse que ia pescar e pegou a arma do meu avô emprestado”.

Conforme a sobrinha, ele foi na casa da avó, onde estavam Edna, a mãe Jandira e os outros irmãos. “Ele deu quatro tiros nas costas dela e um tiro de raspão no meu tiro que foi pra cima dele. A minha vó viu tudo. Agora ele está aí, vivendo a vida dele”, diz Lara.

Exemplo
Josemal alegou que Edna não dava exemplo às filhas No depoimento, Josemal alegou que Edna não estava ‘dando exemplo para as filhas’. “Me senti abandonado com as crianças. Elas choraram quando a mãe as abandonou. Foi no desespero [o crime]. Uma tragédia. Eu descobri que a minha filha não era mais moça e que estavam abandonadas para a mãe passar a noite fora de casa”, alegou.

O juiz questionou o acusado sobre a relação entre matar a esposa e a perda da virgindade da filha ‘aos 15 anos. Isso já é uma realidade, a iniciação sexual precoce’, pontuou o magistrado. Josemal afirmou que era a ‘antiguidade’ com que foi criado e que não conseguiu acompanhar as mudanças. 

A acusação então questionou o motivo de ele ter matado Edna. “Acho que a mãe tem que zelar pelas crianças.  Ela permitiu que a filha usasse a nossa casa”, afirmou. A filha disse em depoimento que nem a mãe sabia da perda da virgindade. Segundo a prima, a mãe ficou sabendo pouco antes do crime.

Durante o julgamento, a defesa atribuiu a Josemal a imagem de bom pai e bom marido. “Estava fazendo uma casa de presente para ela”. “Fiz os gostos dela”. Comprei um terreno na frente do colégio”. “Comprei uma moto para ela” “Fui no bar e encontrei ela bêbada com três homens e as criancinhas no chão, sujas e sem comer”. “Ia ficar com as minhas filhas e fazer um puxadinho para ela na casa da mãe dela”, foram frases faladas por ele enquanto o advogado de defesa fazia os questionamentos. 

Novamente questionando sobre a responsabilidade de orientação à filha mais velha do casal, o acusado afirmou que “Um dia estava e ela e a mãe na cama. Pedi de joelhos para ela [para a filha]. Disse quero fazer a festa mais linda para você. Quando você fizer 15 anos vai poder trazer o namorado aqui e namorar em casa”.

Separação
O casal permaneceu três dias separados. Edna saiu de casa, foi para a casa da mãe. No sábado, ele encontrou a mulher no bar, brigaram e três dias depois, saíram juntos para ir ao cartório passar a casa para o nome das filhas. 

Na data do crime, o próprio Josemal relatou que ficou sabendo que a filha não era mais virgem por um pedreiro que fazia a obra da casa deles. “Falei que era mentira e que mandaria fazer um exame na menina. Não perguntei na hora para a filha, pois fiquei com vergonha. Falei para a minha irmã perguntar e depois ela [a filha], contou e não quis dizer se a mãe sabia”, relembrou. 

“Foi depois disso que fui atrás dela e ela falou aquela frase: Você está criando a sua filha para você? ‘mulher tem que dar mesmo’”, justificou o crime.