Não jogue brinquedo quebrado. Doe!

– Mas pai! Quem vai querer um carrinho sem roda?

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Wilson Aquino
Wilson Aquino

Resolvi escrever o presente artigo depois de acalorado debate travado com dois amigos, colegas de trabalho, que ficaram inconformados quando disse que fui com meus dois filhos, quando crianças, para doar suas roupas que não lhes serviam e brinquedos que não mais queriam ou que estivessem danificados.

– O que? Como pode ter feito isso? Doado brinquedos quebrados para crianças? Disse um deles.

Respondi que conheço muito bem a (dura) realidade de crianças pobres de nossa periferia e que um carrinho sem roda, ou que perdeu a fricção, um herói sem sua armadura, ou mesmo sem um braço, uma Barbie sem a mão, servem muito bem para alegrar pequenos corações acostumados ao improviso com latas e garrafas como brinquedos.

É óbvio que o ideal seria fornecer brinquedos bons e em funcionamento normal. Entretanto, jogar fora todo brinquedo danificado está longe de ser a solução. Até porque, como disse aos amigos, o que jogar fora vai acabar caindo nas mãos de crianças pobres, que as acharão no lixo. A diferença é que estarão ainda mais danificados, sujos e contaminados.

Respeito a opinião dos dois amigos, mas pensei em quantas pessoas partilham da mesma ideia e acabam jogando no lixo os mais variados brinquedos que serviriam sim para a alegria e entretenimento de incontáveis crianças.

É lógico também que não se deve embalar um brinquedo danificado como se fosse novo e simplesmente entregar para uma criança sem essa informação prévia. Aí sim seria frustrante para ela. Entretanto, se chegar com uma sacola de brinquedos na periferia, onde vivem famílias muito pobres realmente, e dizer a elas que existem ali carrinhos, bonecas e outros, danificados de alguma forma, certamente elas aceitarão e não vão ficar decepcionadas quando receberem.

Ainda me lembro quando meu filho me questionou quando propus que juntássemos o que não mais queriam e os que estivessem quebrados:

– Mas pai! Quem vai querer um carrinho sem roda?

Respondi a ele que faríamos essa pergunta às próprias crianças. Disse também a ele, Nilson Felipe e também à minha filha, Maria Ritha, que olhassem bem nos olhos de cada criança depois que fizessem essa pergunta.

Algumas horas depois, lá estávamos nós, no extremo do Jardim Tarumã onde fomos logo recepcionados por dezenas de crianças que brincavam por ruas não pavimentadas. Ficaram felizes em receber cada brinquedo. Alguns saiam correndo gritando de alegria, indo em direção às suas humildes casas, certamente para mostrar aos pais e irmãos.

Foi uma experiência marcante para meus filhos e que se repetiram por vontade deles mesmos em anos seguintes. Tanto, que hoje, como adultos, continuam fazendo esse gesto de caridade, com a doação de roupas e utensílios que não servem mais para eles ou por adquirirem outros melhores.

E o meu contato com crianças carentes, por conta do jornalismo, tem sido constante e tenho visto muitas crianças improvisando seus brinquedos de maneira criativa e que certamente um herói sem um braço ou sem uma perna, seria um grande personagem para estimular sua imaginação e lhe dar esperança e alegria.

Estou convencido de que mesmo tendo condições de presentear crianças pobres com brinquedos bons, não só meus dois amigos, mas toda sociedade poderia sim evitar jogar no lixo  o que acha que não serve mais para ninguém. Caberia aqui algum sábio pensamento de que o que é velho e insignificante para uns, pode ser o sonho, o desejo, de outros.

Sem querer apelar, é o mesmo princípio do alimento que jogamos fora porque é sobra de uma refeição anterior e que a família não tem o hábito de consumir a mesma coisa em mais de uma ou duas refeições. Será que é preciso lembrar que um simples pedaço de pão endurecido é capaz de saciar a fome  e até livrar alguém da morte?

Me lembro também, como parte da educação de meus filhos, de uma fotografia que fixei na geladeira para que a vissem sempre para respeitar e valorizar todos alimentos que recebiam: Uma fotografia conhecida (Google) de uma criança em algum lugar da África, de cócoras, em pele e ossos comendo migalhas de pão jogados ao chão.

 

A ausência de empatia de meus queridos amigos pode estar no pensamento e nas ações de tantas outras pessoas em nossa comunidade. Que nos esforcemos para não sermos indiferentes às necessidades do nosso próximo. E que possamos sempre estender as mãos para doar o que pudermos, em matéria ou em ação para alimentar quem tem fome, levantar quem está caído ou alegrar quem está em solidão.

Que sejamos gratos a Deus por tudo o que temos e recebemos e que sempre pensemos no nosso próximo, com ajuda material e amor. Afinal, este é o segundo grande mandamento do Senhor: Amar nosso próximo como a nós mesmos!

 

*Jornalista e Professor  

 

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