Há 70 anos na história, vinil preserva artistas de MS e renasce em novas gerações amantes de música
Mesmo após 70 anos, vinil continua conquistando fãs para manter identidade intacta ao longo das décadas
Nathália Rabelo –
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O disco de vinil, também conhecido como Long Play (LP), teve seu primeiro registro datado em meados de 1948. Por décadas, foi o principal material utilizado para reproduzir músicas até que, cerca de 40 anos depois, as novas tecnologias fizeram o vinil praticamente desaparecer das prateleiras. Carregado de simbologias, os discos de vinil completam 74 anos em 2022 com uma importância que vai muito além do som. Fortemente conservado por feirantes e colecionadores de Mato Grosso do Sul, os vinis preservam a discografia dos clássicos cantores que habitam o Estado. Além disso, anos depois do seu desaparecimento, o vinil volta a renascer nos corações das novas gerações apaixonadas por música.
Para se ter uma ideia, o MIS-MIS (Museu da Imagem e do Som de Mato Grosso do Sul) tem em seu acervo, localizado em Campo Grande, mil discos de artistas nacionais e internacionais. Desse total, 200 vinis são pertencentes aos cantores regionais que foram enviados pelo Projeto de Carlos Luz, grande pesquisador da área.
“Temos em MS grandes colecionadores de discos de vinil, alguns com mais de 30 mil discos preservados. Mas o objetivo do MIS é a preservação dos artistas que gravaram e compuseram músicas no Estado. Artistas que contribuíram para com a música de MS. Essa é a forma de preservar nosso Acervo Regional dando o devido crédito para quem nasceu em MS e contribuiu com a música”, afirmou Marinete Pinheiro, coordenadora do museu.
Dessa forma, o MIS conta com o vinil dos seguintes artistas: Délio e Delinha, Dino Rocha, Amambai e Amambaí, Beth e Betinha, Almir Sater, Glauce Rocha, Tetê Espíndola, Geraldo Espíndola, Guilherme Rondon, João Ficar, Paulo Simões, Carlos Colman, Grupo Acaba, Geraldo Roca, Los Tamys, Os Dutras no Chamamé, Zé Corrêa, Dozinho Borges, Conjunto Ponta Porã, Ivo de Souza, Tostão e Guarany, Aurélio Miranda, Jandira e Benitez, Castelo e Mansão, Jads e Jadson, Curioso e Barqueirinho, Alzira Espíndola, Jerry Espíndola e Alta Tensão.
Fã de música desde criança, a Doralice é apaixonada por vinil. Em Campo Grande, ela tem uma vasta coleção de todos os artistas mencionados acima, como também de músicos que fizeram sucesso ao redor do mundo.
“O vinil é uma viagem”
É isso que afirma a aposentada Doralice Alves, de 64 anos. Colecionadora desde criança, ela herdou a paixão pela música do pai. Natural de Maringá, no Paraná, ela se mudou para Campo Grande com 200 discos de vinil. Hoje, o seu acervo pessoal já ultrapassa a casa de 32 mil discos. Desse total, 600 são apenas dos artistas de Mato Grosso do Sul. Ao lado dos LPs, há também mais quatro mil CDs. O número é tão grande, que a aposentada construiu um espaço a mais no terreno para guardar suas obras.
“Tenho a coleção completa de Délio e Delinha, coleção de Dino Rocha, Maciel, Tostão e Guarany. Todos esses artistas daqui, como Almir Sater, Tetê Espíndola, Alzira Espíndola, tenho tudo em vinil porque é um resgate da história”, disse à equipe de reportagem.
Ela é conhecida no Brasil inteiro por ser uma verdadeira garimpeira de vinil. Na sua coleção, o que não faltam são nomes de peso marcantes para a história da música brasileira e internacional. O primeiro disco que ganhou foi o de Carmen Miranda, relíquia guardada até hoje em sua residência. Vinis de Pink Floyd, The Beatles, The Rolling Stone e Elvis Presley são alguns dos muitos da sessão de rock. Há também discos de Marilyn Monroe, Tiririca e Marchinhas Juscelino Kubitschek. É a própria história gravada em LPs.
Participante assídua da Feira de Antiguidades, ela afirma que a procura pelo vinil aumentou nos últimos anos. Para Doralice, é um movimento motivado pela durabilidade e a visibilidade do disco.
“O CD você usa ele e em pouco tempo é descartado, porque não tem durabilidade. E um vinil de 1970 você ouve ele hoje com a maior perfeição […] o vinil tem uma história, uma marca registrada. O som do vinil é um som maravilhoso. Se você ouve um CD ou um som remasterizado, o som é horrível, as músicas são agudas. O vinil não, você ouve e não tem como enjoar e está crescendo a cada dia”, afirma Dora.
Vinil proporciona noção completa da obra
O mesmo apontamento de Doralice é observado por Marcos de Oliveira Machado Filho, 43 anos. Ele mora em Três Lagoas e trabalha como técnico judiciário, mas exalta a paixão pelo vinil iniciada aos 12 anos. Ele já chegou a guardar três mil discos, mas manteve apenas os principais. Atualmente, seu acervo está na faixa de 500 obras.
Ele afirma que é adepto aos LPs por causa da qualidade do som, além de toda a experiência que os CDs e os streamings digitais não são capazes de proporcionar.
“Nunca afirmo categoricamente que o som do vinil é melhor, tudo depende também da qualidade do equipamento que se tem, mas com o disco de vinil você tem mais nitidamente a noção da obra, desde a arte da capa, dos encartes, letras […], mas claro, o som sempre vai ser mais bonito, com graves e frequências não encontrados no CD”, explica.
Dos álbuns favoritos constados na coleção, Marcos elenca White Album (Beatles), Lamb Lies Down on Broadway (Genesis) e Houses of the Holy (Led Zeppelin) como os três vinis principais que moldaram a sua vida.
Marcos não é o único influenciado pelo poder no vinil. Na Capital, André trabalha como DJ, mas dispensa a tecnologia atual para ter a chance de tocar com os discos.
Ainda existem: discotecas com vinil
Antigamente, antes dos inúmeros equipamentos que os DJs contam para produzir e tocar música, os profissionais faziam todo o trabalho com os discos de vinil. Para quem achava se tratar de uma arte obsoleta, há pessoas que estão aí para resistir ao tempo e provar o contrário. André Vilela Pereira, 36 anos, é arquiteto, músico e colecionador de discos. Em Campo Grande, ele faz um trabalho muito interessante ao tocar vinis em festas e boates.
Dono de uma coleção com 700 obras, ele se considera um colecionador de arte. Para ele, compartilhar a experiência do vinil com outras pessoas na função de DJ é muito importante para quebrar o individualismo da prática. Além da paixão pelo vinil, ele aposta no formato por já ter os equipamentos.
“Encontro, sim, um prazer nas dificuldades já transformadas em tradição: as práticas e rituais dos toca-discos, trocas de agulha, de discos, regular as velocidades entre toca-discos para encaixar uma faixa em outra com o fone de ouvido e sentindo o ritmo. Mas é verdade que também me encanta a praticidade das controladoras, tanto na logística de transporte quanto na infinidade de recursos que proporcionam para o DJ para uma execução mais regularizada. São processos, estresses e prazeres diferentes”, revela.
São nos sets mais longos e em espaços mais abertos que André tem a oportunidade de explorar uma gama maior de ritmos. “É onde também as pessoas têm mais oportunidade de manifestar a curiosidade e o interesse pelo vinil”, conclui.
Até aqui, você já leu sobre colecionadores que compartilham sua paixão pelo vinil de diversas formas. Seja na música ou na história, todos têm grande conexão com os LPs. Mas afinal, e as novas gerações que começaram a ter contato com o vinil recentemente? Segundo pesquisas, o vinil voltou a conquistar mercado, renascendo no coração dos mais jovens que apreciam boa música.
Retorno do vinil: o clássico agora é vintage
O vinil está voltando a dar as caras nos últimos anos. De acordo com o relatório anual da Associação Americana da Indústria de Gravação, as vendas de discos de vinil aumentaram quase 30% em 2020.
Segundo a publicação, esse aumento nas vendas dos discos de vinil acabou compensando a constante diminuição nas vendas de CD, que na receita de mídias físicas de 2019 a 2020 teve uma redução marginal de 0,5%.
Para os especialistas, o principal motivo desse retorno é a valorização do som de qualidade e o saudosismo [gosto pelo passado]. Isso motivou que muitas gravadoras voltassem a investir em vinis de artistas da nova geração, como Taylor Swift, Billie Eilish, Olivia Rodrigo e assim por diante. Dessa forma, o ‘antigo-novo’ formato volta a conquistar cada vez mais espaço.
Ellen Ramos, 25 anos, é jornalista e apaixonada por música. Há cerca de cinco anos, ganhou uma vitrola moderna de presente da irmã. Com o equipamento em casa, a jovem renasceu um costume antigo herdado dos pais de escutar discos. Pertencente a uma geração que nasceu no apogeu dos CDs e vive a era dos streamings, ela afirma que ouvir música na vitrola difere bastante na hora de dar ‘play’ no Spotify.
Foi conhecendo os LPs que Ellen passou a admirar ainda mais a música brasileira. Atualmente, além de colecionar vinil de artistas pertencentes à geração da sua mãe, também preserva os discos de cantores atuais, como Lady Gaga.
“LP é diferente. Eu acho que escutar um vinil é toda uma situação em casa, vou cozinhar ou parar para apreciar aquele disco. É meio que um ritual”, conclui Ramos.
Artefato da memória musical
Como visto anteriormente, o vinil surgiu na década de 40 para substituir os discos de cera, que giravam em 78 rotações por minuto e, normalmente, continham apenas uma música.
A invenção foi assinada pelo americano Peter Goldmark e foi considerada uma revolução por ser leve, maleável, resistente e de alta qualidade sonora. Após 74 anos, a invenção segue sendo vista como objeto de admiração, um artefato histórico que resguarda a memória musical ao redor do mundo.
Para os entrevistados, é unânime a contemplação pelo formato LP, que resistiu às mudanças do tempo e se manteve fiel à sua identidade como valor histórico e cultural. Assim, sua preservação é de grande importância para as gerações futuras.
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