Feriado no Estado de São Paulo, o dia 9 de julho marca a celebração da Revolução Constitucionalista de 1932, um movimento armado e paramilitar que desencadeou transformações políticas profundas naquela década e que teve participação de várias frentes, inclusive do atual Mato Grosso do Sul.
O fato histórico foi uma resposta à promessa do governo provisório de Getúlio Vargas, que não era cumprida: a criação de uma nova Constituição, por meio da convocação de Assembleia Constituinte. A situação foi agravada por uma série de questões, de ordem nacionalistas e econômicas, a ponto de virar disputa armada. Nas trincheiras, gaúchos e mato-grossenses (do sul, diga-se de passagem) lutavam ao lado dos paulistas, no conflito que durou cerca de três meses, finalizado com a rendição do Exército Constitucionalista.
Em Mato Grosso do Sul, a Revolução em si é questão de vestibular trabalhada nas aulas de história, mas apenas por lá. A participação do Estado – ou melhor, da parte sul do Mato Grosso “uno” da Revolução Constitucionalista – não é lembrada no calendário oficial do Estado, mesmo que tenha sido preponderante para cristalizar ideias separatistas que nortearam a história da parte sul que, somente mais tarde, seria Estado independente. Por que isso acontece?
Desmemória
A desmemória do Estado em relação ao fato histórico – que é basicamente a principal data cívica celebrada pelos paulistas – já foi trabalhada em artigo de Madalena Greco, presidente do IHGMS (Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul), no qual a pesquisadora descreve que a conexão do sul do estado de Mato Grosso com as notícias do conflito.

“Mato-grossenses a postos! Lutemos pela constitucionalização do País. Foi esta frase, no alto, acima do nome do jornal O Diário, órgão de propaganda constitucionalista, que circulou durante todo o período da participação do sul de Mato Grosso na insurreição paulista contra o governo de Getúlio Vargas em 1932. Foi o meio de comunicação dos simpatizantes da causa, posteriormente, tornou-se o Diário Oficial do Estado de Mato Grosso, durante o período em que esteve no poder o Dr. Vespasiano B. Martins”, traz o artigo de Greco.
O Diário, no caso, era um jornal mato-grossense que teria servido até como Diário Oficial dos atos de Vespasiano Barbosa Martins durante o episódio histórico que criou o Estado de Maracaju, em 11 de julho daquele mesmo ano – o movimento separatista de Mato Grosso do Sul que, no entanto, voltou a ser questionado se realmente teve a dimensão que parte da história relata.
Pelo sim ou pelo não, a pesquisadora defende que a retratação dos atores da revolução nas páginas de jornal, por si, reforçam a importância do evento como um fato histórico genuíno da gênese do Estado de MS, dada a riqueza de detalhes. Nas páginas, por exemplo, Três Lagoas é descrita como centro de treinamento dos combatentes.
“Só o fato de ter um diário que direcionava toda sua grade especialmente a luta pela Constituição já é um marco. Se havia outros interesses por detrás de toda movimentação não diminui a participação desta parte do Estado de Mato Grosso”, detalha. Os interesses escusos, no caso, seriam o caráter separatista da Revolução de 32, conforme apontado por algumas revisões históricas, e os novos olhares que mergulham em dúvida se o caráter separatista do Estado de Maracaju foi, de fato, um movimento popular.
Mas, nem é essa a questão: polêmicas à parte, apesar da derrota e das vidas ceifadas no conflito, a Revolução atendeu seu objetivo original e o país recebeu, em 1934, uma nova Constituição. Um fato histórico nacional legítimo que devolveu curso a história do país. A dúvida que fica é: por que a data é discreta e esquecida em MS?

“A Revolução de 1932 não foi vitoriosa para os insurrectos, desastrosa nas perdas humanas e materiais para aqueles que a ela aderiram, entretanto, foi e é comemorada pelos nossos vizinhos paulistas como uma conquista a partir do momento em que o governo de Getúlio Vargas cede e promulga a Constituição de 1934”, considerou a pesquisadora.
O fato em si deixou marcas profundas na parte sul do Mato Grosso, reacendendo a questão divisionista do Estado, que só foi efetivada décadas depois, em 1979. “Por que não lembramos esta importante página da nossa história e nos apropriamos dos nossos méritos?”, questiona Madalena Greco.
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Também entusiasta da história, o advogado constitucionalista André Borges também lamenta a Revolução de 1932 não ser explorada em MS. “É motivo de enorme satisfação rever a história e lembrar do forte engajamento militar, político e popular, do então sul do Mato Grosso, hoje nosso Estado, ao lado do bravo povo paulista nessa revolução. Perdemos a guerra, mas ganhamos uma nova Constituição. Ficou disso tudo um forte vínculo entre nós e os paulistas. É bom fazer alianças com gente forte e de vanguarda. Uma lástima é que essa importante data não é comemorada por aqui”, conclui.