Manual do sexo? Isolamento impõe abstinência a solteiros e sobrecarrega casados

O mundo passa por uma situação nova que exige o afastamento das pessoas, desde o início do ano, com medidas de distanciamento social para evitar transmissão de coronavírus. Sem o contato, solteiros estão “forçados” a viver uma abstinência sexual para se manter seguros da doença. Especialistas comentam como lidar com questão. O Brasil é um […]

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O mundo passa por uma situação nova que exige o afastamento das pessoas, desde o início do ano, com medidas de distanciamento social para evitar transmissão de coronavírus. Sem o contato, solteiros estão “forçados” a viver uma abstinência sexual para se manter seguros da doença. Especialistas comentam como lidar com questão.

O Brasil é um dos países que pouco se fala ou tem recomendações básicas sobre o assunto da sexualidade durante a pandemia. O governo da Holanda, por exemplo, adotou uma cartilha virtual com orientações de proteção, como aderir o sexo virtual, ou, se quebrar a quarentena, que use máscaras durante as relações e se restrinja a apenas um parceiro.

O mestre e doutor em Teoria Psicanalítica e professor da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Tiago Ravanello, explica que a sexualidade é importante para saúde e o tema deveria ser repensado por políticas públicas, para que a sociedade pudesse lidar com a própria liberdade corporal durante um “confinamento”.

“A questão é que isso passaria também por colocar em evidência outras formas de realização do prazer sexual que são encobertas por um certo moralismo desnecessário, tais como a masturbação, especialmente a feminina, ainda tratada injustamente como um tabu, os encontros virtuais e as práticas do erotismo ligadas à escrita e à produção caseira de vídeos endereçada a parceiros ou parceiras sexuais, dentre elas a masturbação guiada”, disse.

Além disso, ele ressalta que a questão cíclica é que quanto menos se fala de sexo, mais riscos e perigos se acrescentam, ainda mais no período da adolescência. O criador da psicanálise, Freud, recomendou no final do século XIX, que o sexo tratado de forma honesta e franca é uma forma de reconhecer a si mesmo.

O que uma doença pode ensinar?

“Aids e outras doenças sexualmente transmissíveis vem ensinando a nossa sociedade, da maneira mais drástica possível, que não se trata apenas de se ter conhecimento ou não a respeito das formas de cuidado e prevenção: é necessária uma transformação dos hábitos e dos costumes quando se trata dos nossos corpos e sua relação com o outro. Não basta a impressão de cartilhas ou as propagandas nos meios de comunicação, a maior parte das pessoas sabem dos riscos aos quais estão submetidos, tanto no que diz respeito às DSTs quanto à contaminação pelo novo coronavírus.”

Aos solteiros, resta um novo estilo de vida com engajamento solo, porém, quando a recomendação da quarentena é quebrada, deve se levar em consideração atos de responsabilidade consigo e com o próximo.

“Nem todos(as) seguirão à risca a prática do isolamento social, mas mesmo as quebras da regra devem ser pensadas em termos de proteção e redução dos riscos, por exemplo, se o encontro não puder ser evitado, que ao menos ambas as partes façam um período de isolamento mais radical nas semanas que antecedem o encontro; que parceiros sexuais que vivem na mesma residência, porém, que possuem graus diferentes de risco e de exposição às possibilidades de contágio também assumam cuidados redobrados como forma de proteção daqueles que amam, o que inclui reavaliar não somente os hábitos de higiene, mas também suas práticas sexuais, lembrando que saliva e muco são veículos de contágio da Covid-19”, ressalta Ravanello.

A psicóloga especialista em Sexualidade Humana, Carolina Valdes, diz que banalizar o assunto pode ter consequências, pois de uma maneira geral, pessoas estavam acostumadas a uma rotina.

“Não é apenas abstinência sexual que a sociedade está vivendo, mas de várias situações. Claro, que pode ter consequências, como ansiedade e depressão, mas temos que ter cuidado em como se faz o isolamento, de como preenchemos nosso tempo. É uma oportunidade de focar em coisas boas.”

Segundo Valdes, o momento afeta as relações sociais, ter mais de um parceiro pode ser irresponsável com a saúde dos outros. “A gente tem que usar como um meio reflexivo, temos que escolher com quem se relacionar, talvez seja um momento até de compromisso mais sério, um namoro seria mais equilibrado e seguro, ou se relacionar só com uma pessoa, desde que a outra não se relacione com outros”.

Casados sobrecarregados com rotina?

O professor também relaciona que se deve considerar a fadiga e cansaço dos casais que vivem juntos. O estresse do trabalho, rotina de casa, filhos, afazeres domésticos podem somam a tensão imposta pelo isolamento, gerando até diminuição da libido e interesse sexual.

“Nesses casos, é fundamental que se tenha empatia e respeito aos direitos fundamentais sobre o livre exercício da sexualidade. Em sociedades machistas e/ou misóginas, uma situação como essa tende a levar ao aumento do número de casos de violência doméstica, sendo o abuso sexual mais uma face cruel dessa realidade. Enfim, são muitos os desafios a serem enfrentados, inclusive no campo da sexualidade. Mas também é fato que esse período irá passar, em algum momento, e que ainda haverá muito a que se viver num horizonte não muito distante”, finaliza Ravanello.