Após campanha, ‘Martírio’ finalmente estreia na cidade, com direito a ato e a debate
Filme de Vincent Carelli será exibido dia 10 no Parque das Nações Indígenas
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Filme de Vincent Carelli será exibido dia 10 no Parque das Nações Indígenas
Houve muito esforço para que ‘Martírio’, o documentário do cineasta e indigenista Vincent Carelli (codirigido por Ernesto Carvalho e Tita), estreasse em Campo Grande. Não por acaso, toda a força-tarefa para que o filme fosse projetado na cidade tem a ver com o fato de que parte considerável da história documentada passa em Mato Grosso do Sul – o conflito entre indígenas Guarani Kaiowa e fazendeiros é o plot principal da narrativa de um processo histórico que culmina num genocídio étnico em pleno Século XXI.
Somente agora o coletivo Terra Vermelha, braço da sociedade civil em defesa dos povos indígenas, conseguiu um ‘ok’ para exibir o documentário na cidade. E mesmo assim, fora do circuito comercial, já que as salas de cinema de Campo Grande não demonstraram interesse em abrir sessões. A autorização para projetar o filme, portanto, veio do próprio diretor, que concordou com exibições de ‘Martírio’ no próximo dia 10, no Museu da Cultura Indígena Dom Bosco, situado no Parque das Nações Indígenas.
A proposta do coletivo, portanto, é apresentar o filme em uma sessão às 13h30, seguido de debate e de um ato político. No espaço, apenas 130 assentos estão disponíveis e, por isso, senhas serão distribuídas antes do museu abrir as portas para a projeção.
“Houve toda uma burocracia e desinteresse por parte dos cinemas de projetar o filme aqui. Então falamos com o próprio Vincent, que autorizou a exibição. Porque a ideia do filme é essa, de que ele seja um documento público que mostre às pessoas qual é a situação dos Guarani Kaiowá em Mato Grosso do Sul”, explica o antropólogo Messias Basques, integrante do coletivo. “Contando com o apoio do Neppi (Núcleo de Estudos e Pesquisa das Populações Indígenas) da UCDB (Universidade Católica Dom Bosco), que intermediou a exibição no Museu das Culturas Dom Bosco, no Parque das Nações Indígenas.
O local escolhido não foi por acaso. O parque urbano de maior importância do Estado leva em seu nome uma proposta de representatividade indígena que inexiste no Estado. “O contraste entre o nome do parque e quem realmente o frequenta é um retrato de como as populações indígenas são tratadas por aqui, sempre são projetados no passado. Os indígenas não estão ali, não se sentem convidados a usar o espaço. Isso também se relaciona com a falta de percepção das pessoas com o que se passa no presente”, aponta Messias.
Por isso, a proposta de fazer da projeção uma espécie de manifesto, um ato político que reunirá índios, indigenistas e interessados em compreender o processo histórico pelo qual os índios brasileiros foram submetidos. Para tanto, estudantes e lideranças indígenas serão convidados à exibição.
Para chocar
O diretor do filme, o francês Vincent Carelli, defende e apoia a exibição pública de Martírio como uma forma de fomentar o debate e de contornar a superficialidade da cobertura indígena na mídia tradicional. “A ideia desse filme é justamente essa: que dele se promova um debate, que dele se compreenda o processo que resultou na triste realidade destes grupos. A maneira como eles são retratados é criminosa, os índios não são um bando de aloprados que de repente decidiram invadir propriedades privadas. Então, é preciso apresentar este processo histórico, ele precisa ser conhecido. E o filme procura ir na raiz do problema”, conta o diretor. “Martírio está aí para isso. Tanto é que em grande parte ele foi produzido graças a financiamento coletivo, justamente, não só por questões de recurso, mas para alimentar essa rede de solidariedade ao povo Guarani-Kaiowa. Inclusive, munir de convencimento, de argumentos, de conhecimento de causa, para a gente não ficar defendendo uma coisa que a gente mal sabe”, acrescenta.
Em ‘Martírio’, Carelli volta desde o período da Guerra da Tríplice Aliança, quando parte do território que equivale ao cone-sul do Estado ainda era paraguaio. “No final da guerra, o Brasil anexa essa região, o que é um dado fundamental para entender porque os índios falam castelhano, por exemplo. Não é que eles vieram no Paraguai para cá, o Brasil que pegou esse território. Toda a situação do momento tem suas origens neste conflito histórico. Quando o Império arrenda uma área de 1 milhão de hectares nessa região por uma questão de favorecimentos. Aquilo foi arrendado com índio e com tudo. Naquela época, os índios já estavam sendo desconsiderados”, conclui o cineasta.
Serviço – ‘Martírio’, de Vincent Carelli, com codireção de Ernesto Carvalho e Tita, será exibido no próximo dia 10 de maio, às 13h30 e às 18h, no Museus das Culturas Dom Bosco, no Parque das Nações Indígenas (Altos da Avenida Afonso Pena). A exibição será gratuita, mas senhas serão distribuídas antes devido à capacidade do auditório. Outras informações no evento da exibição.
Atualização
O Coletivo Terra Vermelha afirmou, nesta sexta-feira (5), que a distribuidora Vitrine Filmes iniciou negociação para que uma sala de cinema de Campo Grande exiba o filme com cobrança de ingressos. Portanto, a realização decidiu manter apenas a projeção que será seguida pelo ato político e debate, a pedido da distribuidora. A sessão das 18h foi cancelada, sendo mantida apenas a das 13h30. Confira a nota divulgada pela organização:
“NOTA AO PÚBLICO: Informamos que uma sala de cinema em Campo Grande iniciou negociações com a produtora de “Martírio”, a Vitrine Filmes. Visando a realização de sessões em espaços mais amplos e com equipamentos adequados, a Vitrine Filmes solicitou aos organizadores deste evento que façamos apenas uma exibição de “Martírio” no Parque das Nações Indígenas, devido às negociações em curso e às questões contratuais.
Lamentamos a mudança de nossa programação e gostaríamos de agradecer a todos por seu interesse e apoio na divulgação do evento. A SESSÃO DAS 13h30 ESTÁ CONFIRMADA, com a presença de lideranças Guarani e Kaiowá, sendo necessário que os interessados compareçam com meia hora de antecedência no dia 10 de maio, quarta-feira, para a retirada de senhas no Museu das Culturas Dom Bosco, cujo auditório tem capacidade para 130 pessoas”.
(Matéria atualizada às 12h25 do dia 6 de maio para acréscimo de informações)
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