A onda de preocupação com os países emergentes voltou a balançar os mercados financeiros de todo o mundo nesta segunda-feira. As moedas desses países iniciaram mais uma semana com desvalorização, o que alimentou o nervosismo dos investidores e azedou o clima nas bolsas.

O mau humor se manteve mesmo com a convocação, pelo banco central da Turquia, de uma reunião extraordinária de política monetária para amanhã e de uma maior calma no mercado cambial argentino. Esses acontecimentos ajudaram a conter oscilações mais fortes dos ativos, embora não tenham sido suficientes para reverter o quadro de aversão a risco.

Mercados em queda

A abertura dos mercados foi tensa hoje. Na Ásia, os índices acionários terminaram em forte queda, com Tóquio recuando 2,51% e Xangai, 1,03%. As baixas se estenderam para a Europa: Paris recuou 0,41%, Madri perdeu 1,12% e Londres, 1,7%.

No Brasil, o real passou hoje por uma correção técnica e recuou mais que outras divisas emergentes. O dólar comercial subiu 1,17% fechou a R$ 2,4250, maior valor desde 22 de agosto. A lira se recuperou após a notícia da reunião do BC, o que também ajudou o rand da África do Sul a se estabilizar, ainda que perto das mínimas em cinco anos, abaixo de 11,18 ante o dólar. O rublo também moderou a queda, ao recuar apenas 0,3%, para 34,63 por dólar.

À desvalorização generalizada das moedas emergentes – da qual o tombo de 20% do peso argentino neste ano é o exemplo mais marcante – somam-se outros fatores que afetam particularmente o mundo em desenvolvimento. O plano de retirada de estímulos financeiros pelo Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) gera a expectativa de que os fluxos de dinheiro que estavam indo para os emergentes vão secar. O Fed se reúne nesta semana e pode anunciar mais um corte no programa mensal de compra de bônus, pelo qual a autoridade monetária injeta dinheiro na economia.

Além disso, os números fracos do setor industrial da China provocam questionamentos sobre o futuro da demanda global por commodities, das quais os emergentes são os maiores fornecedores. Todo esse cenário leva os investidores a fugir de ativos considerados mais arriscados, o que realimenta a ciranda da desvalorização das moedas emergentes. Para analistas, há um movimento estrutural de rearranjo global de portfólios. Os investidores preferem ampliar a fatia de ativos de países desenvolvidos, em prejuízo de emergentes.

Mobilização na Turquia

Uma notícia que ajudou a conter o pessimismo hoje foi a da convocação, pelo BC da Turquia, de uma reunião extraordinária de seu comitê de política monetária para amanhã. Com a esperança de que o país eleve sua taxa de juros, os investidores se acalmaram um pouco e o resultado foi um fortalecimento da moeda turca. O dólar passou a valer 2,32 liras após o anúncio, cotação bem mais elevada do que as 2,39 liras no começo do dia.

A lira turca está entre as moedas mais afetadas pelo clima de tensão. A divisa também sofre com os problemas internos do país: uma ampla investigação de corrupção atingiu três ministros do governo do premiê Recep Tayyip Erdogan, que se viu forçado a trocar dez de seus 26 ministros na esteira das denúncias de recebimento de propina, favorecimento e tráfico de influência. O governo de Erdogan rejeitou as acusações, e classificou o caso como uma conspiração para afetar o governo à frente de eleições locais, em março.

Para alguns analistas, contudo, a alta da taxa de juros na Turquia poderia ajudar a reduzir o pessimismo em relação às moedas emergentes, mas seria insuficiente para influenciar o movimento dessas divisas, mais sujeito à redução de liquidez no mercado global. “Se a elevação de juro na Turquia acontecer, poderá trazer um sinal positivo também para o Brasil, mas o desempenho do real vai depender do comportamento das outras moedas”, afirma o estrategista de câmbio para mercados emergentes da Brown Brothers Harriman em Londres, Ilan Solot. Para o gestor da Brown Brothers, o Banco Central turco deve anunciar um aumento de pelo menos 3 pontos percentuais, levando a taxa básica de 7,75% para 10,75%, para dar um impulso na lira.

Mudanças na Argentina

Na Argentina, o governo começou a definir as regras para a compra de dólares. O cidadão argentino que quiser comprar dólares no câmbio oficial tem de comprovar renda mensal mínima de 7,2 mil pesos, o que equivale a cerca de US$ 900 no câmbio oficial da semana passada, depois da desvalorização. A compra será limitada a US$ 2 mil por pessoa ao mês. Se o comprador depositar o dinheiro em conta poupança ou renda fixa não incidirá o imposto de 20% se os recursos ficarem aplicados por pelo menos um ano.

Saber até onde vai o dólar na Argentina é uma questão que atormenta o mercado. O governo forçou a desvalorização na tentativa de diminuir a diferença do oficial com o paralelo, mas analistas questionam se o benefício da medida se manterá se ela não for acompanhada de um plano anti-inflacionário. Hoje, apesar do início das vendas a pessoas físicas pelo câmbio oficial, as casas que operam no câmbio paralelo continuavam lotadas em Buenos Aires. No câmbio paralelo, o dólar está sendo cotado entre 11,40 e 11,60 pesos, enquanto no oficial sua cotação estava em torno de 8,02 pesos.

Tombini sugere saídas

A diminuição da liquidez global vai enxugar recursos que antes eram destinados a emergentes e esse é um cenário que precisa ser enfrentado, avaliou o presidente do BC brasileiro, Alexandre Tombini. Em entrevista ao jornal britânico Financial Times, Tombini diz que o Brasil está na dianteira desse processo, adotando um receituário clássico: aperto da política monetária e uso das reservas estrangeiras como colchão. “Outros países terão de seguir o mesmo caminho … alguns podem estar relutantes”, afirmou ele.