Há 20 anos, projeto ‘vago’ dava origem à internet

Na capa de um documento que parecia ser mais um projeto mirabolante de um pesquisador com muito tempo livre, pode-se ler até hoje um comentário escrito à mão por um dos coordenadores daquele departamento: “vago, mas excitante”. O que seguia naquelas páginas era nada mais, nada menos do que a criação da internet. Na semana […]

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Na capa de um documento que parecia ser mais um projeto mirabolante de um pesquisador com muito tempo livre, pode-se ler até hoje um comentário escrito à mão por um dos coordenadores daquele departamento: “vago, mas excitante”. O que seguia naquelas páginas era nada mais, nada menos do que a criação da internet.

Na semana passada, os cientistas do Centro Europeu de Pesquisas Nucleares (Cern) em Genebra comemoraram 20 anos da decisão da instituição de suspender a patente da tecnologia do software da web e tornar a internet acessível para todos.

O resultado foi uma das maiores revoluções na história da humanidade. Hoje, se a internet fosse uma economia independente, teria o tamanho do Canadá ou da Espanha. Só nos EUA, movimenta por ano US$ 175 bilhões e emprega aproximadamente 2 milhões de trabalhadores. De compras de supermercado, viagens, controlar contas em bancos, estudar ou até mesmo acompanhar uma partida de futebol no outro lado do mundo. Tudo tem passado pela internet.

O sistema criado nas salas do Cern já atinge aproximadamente 2,7 bilhões de pessoas em todo o mundo. Quase metade dos internautas tem menos de 25 anos, praticamente a mesma idade da web. Mas pesquisadores são unânimes em apontar que, se não fosse pela decisão dos cientistas de abrir mão da patente do produto, essa explosão poderia não ter ocorrido com a mesma velocidade.

Em 30 de abril de 1993, o Cern publicou um comunicado alertando ao mundo que a tecnologia sob a então obscura World Wide Web estaria disponível a qualquer pesquisador, sem a cobrança de royalties e de patentes. Dias depois da publicação, esse documento circularia entre os cientistas e seria o início da internet livre e aberta.

O físico inglês Tim Berners-Lee foi quem inventou o sistema em 1989. Seu objetivo principal era permitir que pesquisadores pudessem compartilhar informações. Foi também de Berners-Lee que surgiu o primeiro site, algo que hoje poderia ser considerado como uma espécie de Bíblia de Gutenberg.

Tratava-se de algo básico: uma página que descrevia o que era a rede, como acessar os documentos colocados por outras pessoas e como criar seu próprio servidor. Para isso, o pesquisador usou seu próprio computador, um NeXT, como servidor.

A máquina é ainda guardada no Cern como uma relíquia histórica. O problema é que o endereço onde estava o primeiro site acabou sendo perdido e, agora, pesquisadores se lançam em uma batalha para restabelecer o primeiro site e preservar seus ativos digitais. “Não há nenhum setor na sociedade que não foi transformado por essa invenção realizada em um laboratório de física”, declarou o diretor do Cern, Rolf Heuer. “Da pesquisa aos negócios, passando pela educação, a web redesenhou a forma pela qual nos comunicamos, trabalhamos, inovamos e vivemos”, disse. “A web é um exemplo poderoso de como a pesquisa de base é benéfica para a humanidade”, completou.

A proposta de Berners-Lee foi escrita em março de 1989 e tinha como função ajudar físicos e engenheiros do Cern a compartilhar dados sobre experimentos que realizavam. Em sua explicação, ele alertava que “o que se necessitava era um pool de informações que poderiam crescer e desenvolver com a organização”.

Seu supervisor na época, Mike Sendall, deu sinal verde para que o projeto recebesse recursos. Mas não escondia uma certa dúvida sobre a capacidade da ideia em prosperar.

Começo

O início mostrou-se difícil. O engenheiro belga Robert Cailliau se aliou ao projeto e percorreu o mundo em busca de recursos.

Nos anos que se seguiram, estudantes foram contratados para ajudar na divisão que trabalhava para aperfeiçoar o sistema. Mas todos tinham apenas contratos temporários. Em 1991, os primeiros testes reais finalmente começaram a dar resultados, com browsers que permitiam que qualquer pessoa de qualquer lugar pudesse ter acesso à rede.

Dois anos depois veio a decisão de permitir que o software tivesse sua distribuição livre, sem taxas e nem patentes. Desde então, frear o sistema passou a ser uma tarefa impossível, até mesmo para os regimes mais duros. “A internet é o que está mudando Cuba hoje”, declarou a blogueira Yoani Sanchez ao jornal O Estado de S.Paulo na semana passada. “Tudo o que o governo nos proíbe de ter e fazer conseguimos pela web”, disse.

Crescimento

Aquele mesmo ano de 1993 terminou já com a existência de 500 servidores. Hoje, são 630 milhões de websites que estão online. Entre 1994 e 2010, a média do crescimento do tráfego de dados na web foi de 140% ao ano, de acordo com um levantamento realizado pela União Internacional de Telecomunicações.

Nem a agência internacional que foi criada para harmonizar outra tecnologia – o telégrafo – consegue manter um acompanhamento da expansão. Em 20 anos, o tráfego da rede aumentou em 44 mil vezes. No total, o que circulou ao final de 2012 exigiria 200 mil anos de uma conexão discada de internet, como em 1993, para ser transmitida. O crescimento só ganha em intensidade. Por mês, 2013 verá uma expansão no volume equivalente ao tráfego global acumulado entre 1994 e 2003.N

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