Enquanto o Judiciário dá andamento ao processo contra os envolvidos no ataque, há relatos de ameaças de envenenamento da área do acampamento

Em 18 de novembro de 2011, um atentado contra um grupo de cerca de 60 indígenas da etnia guarani kaiowa que estava no acampamento do Tekoha Guaiviry, em Aral Moreira, sul do MS, teve repercussão internacional.

No ataque foi assassinado o cacique e líder religioso Nisio Gomes, aos 59 anos de idade. O corpo do cacique foi carregado pelos pistoleiros, e ainda não foi localizado pela Policia Federal de Ponta Porã, que investigou o aso.

Um ano depois da morte de Nisio, os guarani kaiowas que permaneceram na área do ataque estão construindo uma escola e tocando um roçado de mandioca, a base tradicional de sua alimentação.

Depois do atentado, a permanência do grupo indígena no local foi estabelecida em acordo entre fazendeiros, lideranças e o Ministério Público Federal, até que a definição da posse da terra seja juridicamente definida. Mas a tranquilidade aparente não corresponde aos fatos.

Segundo as lideranças indígenas locais, o acordo foi contrariado por novas ameaças, ocorridas em 02 de setembro deste ano. É o que consta em carta lançada por eles às autoridades, relatando que o lugar poderá ser envenenado por pistoleiros.

“Por meio desta carta, vimos denunciar às autoridades federais (MPF, PF,FUNAI, etc) que desde começo do mês de setembro de 2012, aqui em nossas habitações começaram a chegar com frequência os funcionários/pistoleiros das fazendas e os arrendatários, trazendo a ameaça para nós”, declaram as lideranças. 

Eles afirmam que a ameaça se deu quando uma caminhonete preta com vidros escuros parou em frente às barracas perguntando aos berros “quem é o cacique”. Segundo a carta, um dos homens afirmou: “Aqui vocês não podem plantar nada não, nós vamos passar veneno aqui”.

Uso de veneno ocorreu em outra comunidade na última sexta-feira

Se efetivada, a ameaça de ataque com veneno pode ser semelhante à denunciada na última sexta-feira (14) por índios de outro acampamento no município de Paranhos, junto à divisa com o Paraguai, região onde produtos químicos e agrotóxicos podem ser comprados sem controle policial.

Por meio de vídeo postado no Youtube, os líderes do acampamento Ypo’i denunciaram o ataque com veneno no córrego que abastece a comunidade.

Segundo o flagrante feito com imagens gravadas por celular, o veneno surgiu na água enquanto crianças tomavam banho no córrego Ypo’i, formando uma espessa camada de espuma e mal cheiro.

Ainda segundo o relato, os índios subiram pelas margens do córrego em direção à origem da espuma, e encontraram homens armados que os ameaçaram, ao lado de dois tambores. Veja em  http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=Qcw6U3PnXZI#!

Outra informação do município de Iguatemi dá conta que fazendeiros contrataram a empresa Gaspem Segurança para evitar novas ocupações de terras.

Ali há uma área em disputa entre os municípios de Tacuru e Iguatemi, junto ao rio Hovy, onde uma pequena comunidade guarani kaiowa está acampada, oriunda do Tekoha Pyelito kue/Mbrakay.

Enquanto o caso Nisio não é julgado, o que deve demorar, em função do alto número de réus – 23 ao todo – as ameaças e ataques vão se avolumando.

Segredo de Justiça blinda o processo do caso Nisio

Ao sair às ruas em 4 de julho deste ano, a Policia Federal de Ponta Porã, comandada pelo delegado Jorge Figueiredo, prendeu e indiciou cinco fazendeiros e um advogado do Paraná como mandantes do ataque contra o Tekoha Guaiviry. Os executores são todos da empresa Gaspem, de Dourados, que presta ‘segurança’ privada aos fazendeiros da região.

As investigações da PF tomaram o rumo certo depois do depoimento de Tatiane Michele dos Santos, a ex-amante de Aurelino Arce, um ex-policial militar dono da Gaspem Segurança. Tatiane contou a PF que ouviu os planos de ataque aos indígenas acampados na mata da fazenda Nova Aurora, de Aral Moreira.

Hoje, em liberdade, 23 pessoas respondem processo em segredo de justiça, sob a acusação de homicídio qualificado, ocultação de cadáver, fraude processual e corrupção de testemunhas. Inclusive um agente da Funai que pressionou um índio para que mudasse seu depoimento à polícia.

Todos os réus foram soltos em 24 de julho pelo desembargador da Justiça Federal da Terceira Região (SP/MS), Antônio Cedenho, que concedeu os pedidos de habeas corpus ao grupo.

Balas de borracha mataram Nisio

Os índios da etnia guarani kaiowa foram atacados por um grupo de homens armados que chegou ao acampamento do Tekoha Guaiviry nas primeiras horas da manhã do dia 18 de novembro de 2011, armados com carabinas e balas de borracha, segundo a PF.

Valmir Gomes, filho do cacique, afirmou no mesmo dia à reportagem que os pistoleiros dispararam a esmo contra homens, mulheres e crianças que lá estavam, e visavam atingir a Nisio.

O cacique levou um tiro à queima roupa com bala de borracha, na região do tórax, próximo ao coração. Segundo Valmir, o pai não resistiu e morreu ali mesmo. O corpo Nisio foi arrastado até entrada da mata e levado pelo bando armado para local ainda desconhecido pela PF. Veja vídeo inédito gravado um dia após após o atentado.