Morreu Eliana Tranchesi. Com ela, morre um mito. Morre um conceito de luxo como nunca se viu antes no Brasil.
Eliana Piva de Albuquerque Tranchesi faleceu esta madrugada, aos 55 anos, vítima de câncer no pulmão. Herdeira da Daslu, há cinco anos ela travava uma longa batalha contra a doença.
Eliana foi casada com o médico Bernardino Tranchesi, e deixa três filhos: Bernardino, Luciana e Marcela Tranchesi. Mãe, empresária, obstinada, querida por funcionários e amigos, Eliana era uma jovem dona de butique. Aí, ela construiu a Daslu. O mercado do luxo nunca mais foi o mesmo.
Nascida em uma família rica, Eliana Tranchesi não precisaria trabalhar para sobreviver. Mas cansou de dizer que cedo se descobriu uma comerciante nata. Única mulher entre seis filhos, ela gostava de roupas e de fazer compras, mas não pensava em trabalhar na loja da mãe. Seu sonho era ser artista plástica – ela fez Artes Plásticas na Faap, em São Paulo. No entanto, foi ser vendedora na Daslu, e pegou gosto.
A primeira loja começou a funcionar em 1958 na casa de Lucia Piva de Albuquerque, mãe de Eliana. A loja foi aberta em sociedade com Lourdes Aranha dos Santos. A loja era das Lu (Lucia e Lourdes), de onde se originou o nome.
Eliana assumiu o controle da butique em 1983, após a morte da mãe, e desde o início contou com a ajuda dos irmãos no negócio. Sem placa na porta e ocupando uma casa no bairro da Vila Nova Conceição, a Daslu se ergueu sob a força da exclusividade. Só quem conhecia, entrava. E quem entrava era recepcionado por vendedoras tão ricas e poderosas quanto as clientes. O atendimento era personalizadíssimo. Só mulheres podiam circular no emaranhado de salas que formava a loja – que foi se expandindo, abocanhando as casas vizinhas, e as do outro lado da rua, até tomar conta de um quarteirão inteiro na Vila Nova. Era chamada de Disney das endinheiradas. Mulheres ricas (mesmo) do país inteiro faziam compras na suntuosa Daslu.
A primeira grande virada na vida de Eliana Tranchesi se deu em 1990, quando as importações foram liberadas pelo então presidente Fernando Collor de Mello. Ela foi à Europa e voltou com a mala abarrotada de grifes de luxo, que antes só eram vistas em outros continentes. A Daslu foi a primeira butique brasileira a vender grifes como Prada, Dior, Valentino, Chanel, entre outras. Hoje parece simples, mas imagine o que não era chegar em Paris e convencer a Chanel a vender suas roupas em um país de terceiro mundo chamdo Brasil? Eliana consegiu.
A partir daí, a Daslu virou referência para quem tinha muito dinheiro para gastar e queria ver e ser visto. A loja não tinha provadores. As clientes se trocavam nas salas. Há quem diga que essa prática foi responsável, até, pelo aumento das cirurgias plásticas no País. As vendedoras, tão sofisticadas quanto as clientes, eram chamadas de Dasluzetes. Para os serviços gerais, como recolher as roupas espalhadas pelo espaço e servir cafezinho, havia as Aventaizinhas. Para elas, Eliana fundou uma creche, que chegou a dar assistência a 400 crianças.
A segunda grande virada de Eliana se deu quando ela migrou das casas na Vila Nova Conceição para a Vila Daslu, um complexo gigantesco às margens do rio Pinheiros, em São Paulo, com diversas grifes espalhadas por seus 17 mil metros quadrados, em que eram vendidas não só roupas, mas toda sorte de artigos de luxo. O gigantismo da inciativa despertou a atenção do Leão.
Em julho de 2005, Eliana Tranchesi se envolveu em um escândalo que culminou em sua prisão após denúncias de sonegação fiscal. Três anos depois, em março de 2009, ela foi presa novamente em sua casa durante uma operação da Polícia Federal, que buscava indícios de crimes por formação de quadrilha envolvendo os sócios da Daslu. Eliana chegou a ser condenada a 94 anos de prisão. Em tratamento, não chegou a ficar presa. E se manteve ativa até os últimos momentos, tendo inclusive escrito uma carta de agradecimento, que foi publicada no blog de sua filha. O luxo brasileiro está de luto.