A base de apoio da presidente Dilma Rousseff no Senado expressou a insatisfação que vinha sendo verbalizada por deputados e senadores nos últimos meses, ao impor uma derrota emblemática ao governo com a rejeição nesta quarta-feira da recondução de Bernardo Figueiredo à direção-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).

Figueiredo, rejeitado por 36 dos 67 senadores que votaram, é um técnico da confiança de Dilma, responsável direto por projetos importantes como o do trem-bala entre Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro e a revisão dos tetos tarifários das ferrovias de carga. Ele também foi assessor especial da presidente quando ela era ministra-chefe da Casa Civil no governo Lula.

A derrota não foi recheada de simbolismos apenas pelo perfil do indicado, mas também pela maioria esmagadora que o governo detém na Casa. Juntos, os senadores de partidos de oposição (DEM, PSDB e PSOL) somam apenas 16 votos e mesmo que todos estivessem em plenário não seria possível impor uma derrota à presidente.

Ou seja, dos 36 votos secretos pela rejeição de Figueiredo, a maioria veio dos senadores aliados, cujas insatisfações contra o governo estão espalhadas por todos os partidos.

Duas horas depois da votação, uma fonte do governo ainda não tinha uma avaliação sobre a derrota. “Estamos tentando entender o que aconteceu”, disse à Reuters enquanto ouvia explicações de parlamentares ao telefone.

“A gente não esperava perder. Nem empatar. A gente esperava ganhar de goleada”, acrescentou a fonte que falou sob condição de anonimato.

Questionado sobre os motivos da insatisfação, o experiente líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), também tinha dificuldade de resumir. “É uma insatisfação meio etérea, vai juntando fatos. Falta de liberação de emendas, indicações que não são atendidas”, tentou explicar ao ser questionado pelos jornalistas.

“Há uma insatisfação que precisa ser estudada…(o governo) tem que chegar mais perto”, afirmou Jucá.

Desde a semana passada, os aliados têm mandado recados ao governo. Na votação do projeto que criou o Fundo de Previdência Complementar do Funcionalismo Público (Funpresp), na Câmara, por exemplo, a maioria dos deputados do PDT e do PSB votaram contra o governo.

Nesta semana, 54 dos 76 deputados do PMDB levaram ao vice-presidente Michel Temer um manifesto criticando a atuação do Executivo em favor do PT e reclamando do tratamento dado aos demais aliados.

Aliás, esse componente foi citado por senadores como combustível para a imposição da derrota a Dilma nesta quarta.

“Os senadores demonstraram solidariedade à posição dos deputados”, disse um parlamentar da Câmara pedindo para não ter seu nome revelado.

O presidente do PMDB, senador Valdir Raupp (RO), disse que não foi uma derrota imposta pelo seu partido à presidente, mas ao comentar o tema lembrou uma velha máxima do Congresso. “Votação secreta dá uma vontade de trair”, afirmou.

Os contornos da derrota foram sentidos pelo partido pouco antes da sua consumação. O líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), deixou irritado a reunião da Comissão Executiva da legenda, que ocorria no Congresso, para tentar conter a rebelião segundo relato de um peemedebista que falou sob condição de anonimato.

Mas já era tarde para isso.

Na avaliação desse peemedebista, senadores do partido e do Partido da República (PR), que formalmente não integra mais a base aliada, foram os principais estimuladores do resultado da votação.

“É menos a ANTT e mais problemas na base. O governo foi derrotado pela base aliada”, disse o senador Lindbergh Farias (PT-RJ). “Não foi um recado, foram vários recados. Do PMDB centralmente”, acrescentou.

Um outro líder aliado disse que o recado foi claro e calculado. “Foi para atingir e avisar a presidente”, disse sob condição de anonimato.