Para estimular a economia sem comprometer as metas de esforço fiscal, o governo tem buscado um novo mecanismo para ampliar o capital dos bancos públicos. Desde o início do ano, o Tesouro Nacional injetou R$ 61,8 bilhões no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no Banco do Brasil e na Caixa Econômica Federal por meio da emissão de títulos públicos que são transferidos para as instituições financeiras.

Essa engenharia não tem impacto nos gastos do governo nem compromete o superávit primário (economia de recursos para pagar os juros da dívida pública) porque o governo não desembolsa o dinheiro diretamente para os bancos. No entanto, o procedimento tem aumentado o endividamento do governo federal, o que provoca questionamentos de especialistas.

A emissão de R$ 13 bilhões para a Caixa e de R$ 8,1 bilhões para o Banco do Brasil foi a principal responsável pela elevação da Dívida Pública Federal (DPF), segundo os dados mais recentes divulgados pelo Tesouro Nacional. Em setembro, a DPF subiu 2,02%, passando de R$ 1,867 trilhão para R$ 1,904 trilhão. O crescimento foi provocado pela emissão líquida de R$ 23,68 bilhões e pelo reconhecimento de R$ 13,97 bilhões em juros. Sem a ajuda para os dois bancos, a emissão líquida teria sido apenas R$ 2,58 bilhões.

Em outubro, a dívida pública voltou a ser pressionada pela ajuda aos bancos oficiais. No último dia 17, o Tesouro emitiu mais R$ 20 bilhões para reforçar o capital do BNDES. O governo havia injetado R$ 10 bilhões no banco em janeiro, mais R$ 10 bilhões em junho. Até o início do próximo ano, o Tesouro deve fazer mais um aporte de R$ 15 bilhões, já autorizado por medida provisória aprovada em julho pela Câmara dos Deputados e em agosto pelo Senado.

Ao comparar a dívida pública com o tamanho da economia, é possível constatar o impacto dessas operações sobre o endividamento do governo. A dívida bruta do setor público saltou de 54,3% do Produto Interno Bruto (PIB) em dezembro para 57,5% do PIB em agosto, segundo os números mais recentes do Banco Central, acima de níveis de países emergentes como a África do Sul (40%) e o México (42,9%).

Ao explicar os resultados da DPF em setembro, o coordenador-geral de Operações da Dívida Pública, Fernando Garrido, justificou a necessidade de capitalizar o Banco do Brasil e a Caixa. “Essa emissão [para os dois bancos] tem direcionamentos específicos. Os bancos públicos federais têm algumas funções diferentes das dos bancos privados, como custo à safra agrícola e financiamento para o programa Minha Casa Minha Vida”, declarou.

No caso do BNDES, as injeções de títulos públicos têm sido prática recorrente nos últimos anos. O banco recebeu R$ 100 bilhões em 2009, R$ 80 bilhões em 2010 e R$ 45 bilhões no ano passado. Economistas ouvidos pela Agência Brasil reconhecem que as operações ajudam o banco a emprestar para empresas e estados. Eles, no entanto, expressam preocupação quanto ao impacto sobre o endividamento do governo.

Especialista em estruturas financeiras para investimentos da Fundação Getulio Vargas (FGV), Rogério Sobreira diz que essas operações são importantes para estimular a economia em meio à crise internacional. O professor, porém, diz que o governo precisa ter cuidado para não tornar o endividamento um mecanismo permanente de financiamento para o BNDES. “No médio e longo prazos, o governo terá de encontrar um meio de estimular os financiamentos privados para os investimentos das empresas”, argumenta.

Especialista em políticas econômicas, a professora Leda Paulani, da Universidade de São Paulo (USP), também reconhece que a atuação do BNDES é essencial porque o mercado privado de capitais (como a emissão de títulos privados para financiar empresas) é pouco desenvolvido no Brasil. Ela, no entanto, defende que as injeções do Tesouro Nacional deveriam vir acompanhadas de exigências, como o financiamento de empreendimentos ambientalmente saudáveis ou destinados a setores com alto valor tecnológico.

“Não dá para aumentar o endividamento público para financiar setores que tornam a economia brasileira atrasada, como a produção de bens primários [bens agrícolas e minerais]. O país precisa estimular setores que contribuem com tecnologia e aumentam o valor agregado das exportações brasileiras”, avalia.