Para diplomatas, meta é mostrar que desenvolvimento da América Latina é prioridade

Em visita à Argentina nesta segunda-feira, a presidente Dilma Rousseff inaugura sua agenda de viagens internacionais pelo principal parceiro do país na região – uma escolha que, segundo o Itamaraty, servirá para reforçar o “peso” da América do Sul na diplomacia do novo governo.

Segundo diplomatas ouvidos pela BBC Brasil, o objetivo é mostrar que o desenvolvimento da região ainda é “prioridade” para a política externa brasileira, apesar do processo de diversificação das relações internacionais intensificada nos oito anos de governo Lula.

“O discurso de que o Brasil não é uma ilha e que não pode crescer sozinho será mantido nos próximos anos”, disse um representante do Itamaraty, referindo-se a uma frequente mensagem do ex-presidente Lula em suas viagens pela América do Sul.

A visita também é simbólica do ponto de vista bilateral, já que Brasil e Argentina, além de fortes parceiros comerciais, costumam atuar de forma conjunta nos principais assuntos políticos da região.

Apesar de ser uma visita de curta duração, Dilma fez questão incluir em sua agenda um encontro com as Mães da Praça de Maio, grupo de busca por desaparecidos durante o regime militar na Argentina.

Além de prestigiar um dos mais tradicionais grupos civis do país vizinho, o encontro também será uma oportunidade para que a presidente brasileira possa reforçar seu “compromisso” pelos direitos humanos, mensagem que tem sido repetida nesse início de governo em função do desgaste gerado com a aproximação entre Brasil e Irã.

Acordos

Além de um encontro privado na Casa Rosada, sede do governo argentino, a agenda prevê a assinatura de 15 acordos e memorandos de entendimento, em áreas como energia e habitação.

O principal deles prevê a troca de experiências para a construção de reatores nucleares nos dois países e que, de acordo com o Itamaraty, poderão ser usados em “diversos propósitos”, como no segmento médico.

Segundo o subsecretário-geral da América do Sul, Central e Caribe, embaixador Antônio José Ferreira Simões, cada país construirá seu próprio reator, no prazo de cinco anos.

“Queremos aproveitar a experiência da Argentina, que já vendeu reatores de pesquisa para o Peru e para a Austrália”, disse o diplomata.

As duas chefes de Estado também deverão repassar a agenda comercial, assunto que frequentemente é motivo de rusgas entre Brasil e Argentina.

As exportações brasileiras para o país vizinho cresceram 87% nos últimos cinco anos, chegando a US$ 18,5 bilhões em 2010. Na mão contrária, as importações da Argentina cresceram 130%, atingindo a cifra de US$ 14,4 bilhões no ano passado.

Apesar de os dados indicarem uma expansão mais acelerada das vendas de produtos argentinos no Brasil, a pauta ainda é dominada por produtos básicos, enquanto o Brasil exporta, majoritariamente, produtos mais elaborados, como automóveis, celulares e aviões.

A diferença na pauta, aliada a dificuldades econômicas vividas no país vizinho, acabam levando a constantes pressões por medidas de proteção comercial contra a importação de produtos brasileiros.

‘Pouca relevância’

Na avaliação de José Botafogo Gonçalves, ex-embaixador do Brasil em Buenos Aires, as rusgas comerciais entre Brasil e Argentina, apesar de frequentes, têm “pouca relevância” na relação bilateral.

Segundo ele, os dois países atingiram um nível de proximidade política e comercial que “não se abala” por “questões pontuais”.

“Essas disputas comerciais acabam sendo muito comentadas, mas o fato é que representam uma proporção muito pequena do comércio”, diz. “É um aspecto menor da relação bilateral”, diz.

Para ele, um dos principais desafios da presidente Dilma Rousseff é oferecer um projeto de expansão industrial que envolva os dois lados. “Os dois países têm sofrido com a perda de competitividade de seus produtos no mercado internacional e poderiam encontrar uma saída conjunta para esse problema”, diz.

Ainda de acordo com o ex-embaixador, Brasil e Argentina tem uma relação próxima que já é “tradicional”, mas que poderia avançar com uma orientação política comum no aspecto industrial.

“É isso que falta na relação com os argentinos, um projeto de união. Se a presidente Dilma conseguir apresentar esse projeto, estará na direção correta”, diz Gonçalves.