Feche os olhos e imagine algo imponente e que represente o agro. Grande parte pode pensar em um belo cavalo no campo, ser que, historicamente, é aliado dos agricultores, combates, símbolo de majestade e até ligado a divindades. Atualmente, o animal continua sendo um parceiro fiel, tanto para quem cria como participa de competições e equoterapias, por exemplo. O que mudou, na verdade, é a maneira como são transportados.
Aliás, percorrer a área urbana e encontrar um motorista, com um trailer adaptado para cavalos, não é incomum. Acoplados ao reboque de caminhonetes, carregam animais que valem, em média, entre R$ 1 mil e R$ 1 milhão, porém, de valor inestimável aos donos. A reportagem do Jornal Midiamax conversou com profissionais que investiram na modalidade e hoje dizem ser apaixonados por transportar cavalos, seja em pequenas ou longas distâncias.
‘Tudo que tenho é através do cavalo’, diz motorista

Dyego Rodrigues Fernandes, de 37 anos, é um motorista e empreendedor que deixa visível a sua paixão pelo animal, usando sempre um anel e colar com a imagem de cavalos. Há pouco mais de um ano, quando pensou em desistir, levou “uma chamada” do irmão e comprou o primeiro trailer, criando a “Uber Horse”, em Campo Grande.
“Eu e meu irmão trabalhávamos com o meu pai, sempre no transporte de animais. Graças a Deus ele progrediu, comprou caminhões, e focou neste trabalho. Foi quando eu pensei em voltar a trabalhar registrado, em outra área, mas, meu irmão falou que nosso ramo sempre foi este, com os cavalos, e me orientou a comprar um trailer. Fiz o investimento e criei o meu próprio negócio, para transportar cavalos de corrida, do hipismo, com diversas histórias”, afirmou Dyego.
Sendo assim, há um ano, nasceu a empresa em Campo Grande. “Eu comecei com um cliente e hoje já tenho seis fixos. Fora isso, eu também loquei um espaço e tenho os meus clientes que guardam os seus trailers lá. Quando pedem, eu faço o transporte dos cavalos ou então levo até eles o trailer. Nós somos uma família que puxa cavalos desde a década de 70. É engraçado que sempre pensam que somos do interior, mas, foi o meu pai e o meu tio que começaram tudo, no hipódromo que tinha aqui, lá no Jockey Clube. Foi aí que eu comecei a montar em cavalo de corrida e hoje vamos para todo canto”, explicou.

Somente neste ano, o motorista “uber de cavalo” já levou animais para Bahia, Rondônia e no interior paulistas, onde ocorreram competições, como três tambores, salto, vaquejada, entre outras modalidades.
“Meu pai foi um dos pioneiros aqui e hoje nós damos continuidade a este trabalho. Eu sempre falo que foi o cavalo que me deu tudo: minha família, esposa que é médica veterinária, minhas filhas, sendo que a mais nova já pede para montar em cavalo, minha casa, tudo o que eu tenho. A pequena, tem dois meses, mas, tenho certeza que vai se apaixonar por este animal também”, argumentou.
‘Uber’ passou 7 dias com animal para tratamento veterinário

Logo que iniciou o empreendimento, Dyego diz que foi contratado para levar um cavalo até o interior de São Paulo e outro até um hospital, no Rio de Janeiro.
“Era um animal bem valioso, então, fiquei responsável por ele por uma semana. Levei no hospital, para tratamento veterinário. É engraçado que foi bem na época que achei que não teria saída, mas, logo me procuraram para este serviço de ‘Uber’. Fui aperfeiçoando, coloquei ar-condicionado no trailer e aí transporto os cavalos e alugo também, se necessário”, disse.
No local das competições, o motorista fala que o trailer é todo higienizado e vira um hotel para os donos.
“Muitos fazem este investimento, para evitar gastos futuros em hotel depois. A gente leva cama, conecta na energia no local e aí ficamos hospedados no trailer, enquanto o cavalo participa das provas e depois retorna conosco. A modalidade está aumentando muito justamente por conta disto, destas competições, e também da busca por locais especializados. Neste caso do Rio de Janeiro, por exemplo, o cavalo foi lá para fazer uma endoscopia e raio-X, um tratamento especializado e a viagem durou uma semana por conta das pausas”, falou.

Em todas as paradas, o motorista conta que os cavalos são hidratados, tomam vitaminas, se necessário, além de descansarem para, no outro dia ou após algumas horas, seguirem viagem.
“Eu transporto muitos cavalos que valem R$ 1 milhão, até um pouco mais. Tem gente que fala frente, tem gente que fala uber, a modalidade tá crescendo e surgindo novos nomes. Tenho outros amigos, fora do Estado, que estão trabalhando com isso também”, encerrou.
Laçador comprou trailer para levar os próprios cavalos em competições

O laçador e microempresário Fernando de Aquino Ramos, de 26 anos, é outro que tem paixão por cavalos desde pequeno e os transporta em seu próprio trailer. Nascido em Dois Irmãos do Buriti, a 116 km de Campo Grande, passou a participar de competições, ganhando grandes quantias em dinheiro, motos, trator e caminhonetes.
Nos últimos anos, Fernandinho, como é conhecido, se tornou campeão de diversas modalidades, aperfeiçoou ainda mais o talento para laçar e se tornou ‘Uber de cavalos’, como forma de facilitar o transporte e a sua estadia em locais de prova, além de ganhar um valor a mais, nos casos em que transporta animais de terceiros.

“Sempre fui ligado ao campo. Só que, quando fiz 18 anos, fui para Campo Grande para facilitar nas viagens que eu fazia, principalmente porque eu rodo o Brasil e a localização aqui é melhor. E eu levo os meus produtos também, chapéus, ceras, os agregados, tudo relacionado ao cavalo. E, é claro, os animais no trailer. E cresceu muito essa modalidade. Antigamente, era só o caminhão”, argumentou.
Antes de sair, Fernando diz que coloca protetores nos animais, deixa feno disponível dentro do trailer. “Este é um ramo que está aumentando muito. Quem é do campo está investindo e tenho acompanhado que as empresas que investiram em trailer cresceram demais. Hoje, se você vai em uma festa com cinco laçadores, são cinco trailers, cada um tem o seu, então, cresceu demais. Amo cavalos desde os cinco anos, só faço isso aí e graças a eles já ganhei bastante competições. Meu próximo sonho é adquirir um rancho e encher de cavalos lá”, ressaltou.
Modalidade cresceu muito por conta das competições, avalia empresária

A empresária e psicóloga Camila Spengler, com mestrado em psicologia da saúde, trabalha aliada aos cavalos há 27 anos, sendo também proprietária de uma academia equestre, oferecendo desde aulas de montaria a equitação terapêutica, por exemplo. Segundo ela, o que antes era chamado de “fretes no caminhão” agora ganha nova versão, com os trailers se tornando o “uber de cavalos”.
“Nós sempre tivemos o transporte porque precisamos nos locomover com os animais, para provas, além de outras questões relacionadas aos cavalos, como emergências. Temos, ao todo, 90 cavalos, levando do rancho para o outro polo nosso, que é no parque de exposições, então, vamos levando e trazendo de acordo com as necessidades das aulas, então, quase todo fim de semana estamos envolvidos no transporte”, inciou a empresária.

Com a intensificação das competições, Camila diz que adquiriu trailers. “Agora estão usando muito o termo uber e é por ser algo rápido mesmo, em distâncias mais curtas. Ocorre que no caminhão a gente levava mais animais e agora nos trailers vão, em média, de dois a quatro animais. E tem que compre trailers maiores, para usar como moradia também, bem equipados e com ar-condicionado. Quando os cavalos descem, fazem a higienização e ali dormem pessoas, então, fica como apoio em locais de prova”, argumentou.
No momento, por conta do tempo que despende aos alunos e pacientes, a profissional ressalta que não aceita fazer o “transporte de terceiros”, somente os seus. Sendo assim, Camila afirma que, em seu terapia, o “divã é o cavalo”, momento que ela trabalha com leitura corporal e gatilhos, com sessões nos três períodos, não sobrando tempo para atender outras demandas.
‘Treinamos o cavalo para que não seja um transporte de risco’, explica profissional

“Mas eu sempre indico bons profissionais. Quem contrata o ‘uber’ exige o mesmo: bons cuidados. Acredito que, independentemente do valor, o cavalo é um bichinho que a gente trata como pet. Todo cuidado é pouco sempre, então, em qualquer tipo de transporte, temos sim bastante cuidado. A gente treina o cavalo tanto para entrar no trailer, como para que fique tranquilo e relaxado e não seja um transporte de risco”, argumentou.
O treinador e ‘Uber de cavalos’, Wellington Siqueira dos Santos, de 32 anos, se especializou no transporte de carga viva, tirando a categoria D como motorista. Mais um apaixonado pelo animal, ressalta que é necessário também colocar protetores nos cavalos, além de parar para hidratar o animal e aplicar soro, se necessário.
“É necessário este cuidado em viagens mais longas e assim ele vai confortável. Neste casos, é sempre necessário ter um motorista de confiança, além de algum especialista, que diga se os exames clínicos estão ok para seguir viagem. É todo um cuidado, ainda mais em viagens de mais de 700 km por dia”, finalizou.

‘Equideocultura está avançando em profissionalismo e responsabilidade’, avalia presidente
O presidente do SRCG (Sindicato Rural de Campo Grande, Rochedo e Corguinho), Eduardo Monreal, ressaltou que é uma evolução importante a forma como lidamos com o bem-estar animal.
No caso dos equinos, que muitas vezes são atletas de alto desempenho, parte da família ou representam um investimento significativo, é natural que os proprietários exijam o máximo de cuidado e conforto durante os deslocamentos.

“O uso de trailers com ar-condicionado, por exemplo, demonstra o quanto a equideocultura está avançando em profissionalismo e responsabilidade. Para nós, iniciativas que priorizem a saúde e a segurança dos animais são sempre bem-vindas. Esse tipo de serviço também abre espaço para novos negócios no campo, com qualidade e respeito ao animal como prioridade”, opinou Monreal.
A reportagem do Jornal Midiamax consultou a Iagro (Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal) de Mato Grosso do Sul para saber sobre a documentação necessária, quando se trata do transporte de carga viva.
Conforme o presidente, Daniel Ingold, a Agência segue, rigorosamente, os protocolos estabelecidos, com equipe treinada e preparada para as verificações, sempre atuando com agilidade, eficiência e transparência em todas as ocorrências.
Documentação exigida para transporte de carga viva:

Especialista em equinos diz que verifica documentos e saúde do animal antes de embarcar
A médica veterinária, Caroline Aldá Pereira, de 30 anos, que é especialista em nutrição de equinos, reforçou que transportar um cavalo “não é só chegar e embarcar”, sendo necessário cumprir todas as exigências da Iagro e do Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento).
“É nessário primeiro fazer o exame negativo para detecção de AIE (Anemia Infecciosa Equina), além da comprovação, em dia, da vacinação contra influenza equina, e o cavalo estar registrado no sistema da Iagro. Em seguida, é solicitado no site da Agência, o GTA (Guia de Transporte Animal), explicou a veterinária.

Sendo assim, o motorista ou “Uber de cavalos”, como estão chamando, precisa ter em mãos o GTA, Resenha do Cavalo (que serve como o documento de registro), exame de detecção de AIE e o certificado de vacina. Toda esta parte é a questão burocrática. Depois temos a questão dos cuidados com a saúde do cavalo, o que garante que ele vai entrar no trailer sem se machucar, e aguentar se manter dentro no local durante toda a viagem”, disse Pereira.
Em sua rotina de trabalho, a veterinária ressaltou que possui o cuidado de tranquilizar o cavalo para entrar, pois, ocorrem situações em que o cavalo não é acostumado a viajar de trailer e se recusa a entrar. “Aplicamos técnicas para ele entrar sem perceber, como distrair com pote de ração ou biscoitos, eu empurrá-lo pela garupa”, comentou.

Por fim, Caroline diz que trabalha com nutrição de cavalos desde 2019, é muito apaixonada pelo animal e, sempre que pode, acompanha o marido no transporte de cavalos, já que ele é atuante no ramo. Aliás, recentemente, a veterinária conta foi surpreendida por ele e amigos, que organizaram um chá revelação temático no campo.
“Sou apaixonada por cavalos, eu, minhas filhas e o meu marido. E eu o ajudo, faço até os fretes quando ele não está na cidade. E quando estou com ele vou como copilota, ajudo e faço avaliação nos cavalos, pra ver se não estão com algum machucado, ou se carrega um animal machucado ou com crise de cólica para o hospital, faço o primeiro atendimento para garantir que o cavalo chegue em segurança no hospital”, finalizou.
Conheça mais sobre o transporte de cavalos:
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