Alta no aluguel desanima empresários e imóveis vazios se espalham pela 14 de Julho: ‘muito caro’
Combo que inclui aluguel caro, falta de estacionamento e expansão do comércio nos bairros derruba movimento no Centro
Thalya Godoy, Anna Gomes –
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O aumento do valor do aluguel na Rua 14 de Julho, o coração comercial do centro de Campo Grande, tem desencorajado muitos empresários a continuarem no espaço e causado um efeito cascata de fechamento em massa das lojas.
Há casos de comerciantes que desistiram do negócio porque o aluguel triplicou em um intervalo de sete anos, especialmente para quem trabalha no trecho que foi revitalizado no projeto Reviva Campo Grande.
O reflexo dessa situação é visto em inúmeras placas de “Aluga-se” ou de mudança de endereço da Rua 14 de Julho. A reportagem esteve no centro nesta semana e contou pelo menos 16 placas de aluguel em um trecho de quatro quadras entre a Avenida Afonso Pena e a Rua Maracaju.
No entanto, o número de lojistas que desistiram do ponto pode ser maior, já que várias salas estão vazias ou com placa de mudança de endereço e ainda não foram colocadas para locação. No cruzamento da Rua 14 de Julho com a Rua Maracaju, por exemplo, há quatro anúncios de locação um ao lado do outro.
Aluguel vai de R$ 4 mil a R$ 32 mil
O valor do contrato de aluguel é reajustado, geralmente, seguindo a taxa do IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado). Os comerciantes do centro contam que o valor do aluguel sofreu uma forte alta nos últimos anos, especialmente durante a pandemia.
Nessa época, o IGP-M chegou a subir acima de 30% em 2021, o que levou muitos a negociarem os reajustes seguindo outros índices, como o IPCA ou o INPC.
Uma busca em um site especializado em comercialização de imóveis mostra que os valores dos aluguéis na Rua 14 de Julho variam de R$ 4 mil a R$ 32 mil, a depender da quadra e do tamanho da loja.
Os empresários no centro de Campo Grande disseram ao Midiamax que precisaram negociar com os proprietários reajustes menos salgados. Alguns até chegaram a comunicar que seriam obrigados a abandonar o espaço caso não fosse possível negociar.
Um comerciante da Rua 14 de Julho, que não quis se identificar, contou que o valor do aluguel de 2007 a 2016 subiu de R$ 2,5 mil para R$ 3 mil. Após sete anos, o preço entrou em disparada e atualmente paga R$ 9 mil mensalmente na locação do imóvel. Ou seja, o valor cresceu três vezes no período.
“É muito caro, vocês veem muitas lojas fechadas. Primeiro por causa do aluguel e segundo por causa do estacionamento. Não tem estacionamento. A maioria que estaciona por aqui são lojistas. Eles falaram ‘shopping livre’, mas qual shopping livre? Estragaram a rua e o centro inteiro. Tem muita gente reclamando de aluguel”, ele opina.
Já a empresária Roseli Zaninello Guizani chegou a ter três lojas no centro, mas precisou fechar uma na Rua Dom Aquino depois de sete anos devido ao alto valor do aluguel. Quando começou no espaço era R$ 4 mil, mas o contrato subiu até ficar insustentável mantê-lo funcionando. Das duas funcionárias que mantinha na loja, uma foi preciso mandar embora.
“E aí pularam para R$ 7,5 mil, uma loja pequena, apertada e eu também não tinha mais condições de pagar R$ 7,5 mil. Lutei também pelo menos no R$ 6,5 mil que estava na marra, mas estava indo e eles disseram que não tinha conversa e não iam baixar. Então, tirei a minha mercadoria de lá há menos de um mês”, recorda.
Ela conta que em uma das lojas que tem atualmente também precisou lutar para que o valor do aluguel não chegasse a R$ 10 mil. Quando começou no espaço há sete anos era R$ 7 mil e atualmente o contrato é de R$ 9 mil.
“Eu falei para ele que se passar para R$ 10 mil eu entrego […] não dá para manter, é melhor não trabalhar porque só para ter despesa? Melhor ficar em casa”, expõe a empresária.
Estacionamento é entrave e derruba faturamento
Depois que a Rua 14 de Julho e a Rui Barbosa passaram por reformas, muitas vagas de estacionamento foram retiradas, o que virou crítica de lojistas e clientes. Eles argumentam que o resultado foi menor movimento e, consequentemente, queda no faturamento das lojas.
A situação aperta o orçamento dos lojistas, que do outro lado precisam negociar os ajustes do contrato de aluguel.
Os empresários contam que a falta de lugar para estacionar, o valor caro cobrado pela hora do estacionamento privado e avanço dos comércios nos bairros, tem desencorajado muitos campo-grandenses de ir ao centro fazer compras.
“Eles [locadores] não querem saber se a venda está caindo para subir o valor do aluguel. Não dá, onde todo mundo fecha e vai embora. Muita gente vai para os bairros, compra um prédio e vai ter sua loja na frente”, afirma Roseli Zaninello Guizani.
Ela exemplifica que a retirada do estacionamento até do canteiro da Avenida Afonso Pena prejudicou o comércio.
“Agora as pessoas falam que não compensa mais, eu tenho funcionárias que vêm do bairro e elas falam que lá tem de tudo, até mais do que no centro. Então, por que eles vão vir pagar estacionamento aqui? Eles compram lá mesmo e com isso o centro vai acabando”, ela critica.
O Midiamax já mostrou em uma série de reportagens, no começo deste ano, em como o comércio nos bairros de Campo Grande tem crescido em todas as regiões da cidade.
Já Carlos Alessandro de Freitas Corrêa, que trabalha no comércio na área central há 23 anos, conta que, depois da revitalização do Reviva Campo Grande na Rua 14 de Julho, o centro enfrenta uma queda no fluxo de clientes.
“Com o passar dos anos, e principalmente depois da reforma, caiu muito e os aluguéis começaram a se exceder muito. No período que ficou para reforma judiou muito o comércio e descapitalizou muito o empresário. Então, o reflexo de muitas lojas que têm fechado suas portas tem sido devido ao impacto da reforma da 14 de Julho e logo na sequência na pandemia que agravou ainda mais”, ele avalia.
Ele reforça a opinião que a dificuldade para encontrar vaga tem desencorajado o campo-grandense de ir ao centro. “Os estacionamentos que são privados excedem valores, então não fica viável o cliente deixar o conforto do shopping para vir na Rua 14 de Julho e ficar andando na chuva ou sol”, ele exemplifica.
O médico veterinário Alexandre Godoy, de 50 anos, teme que a Rua de 14 Julho vire a próxima Avenida Calógeras, que décadas atrás tinha um alto movimento de clientes e de lojas abertas, mas que hoje poucos comércios sofrem para manter as portas abertas.
“O que vai acontecer? Ninguém vai alugar, ninguém vai fazer nada e por quê? Porque não tem acesso para estacionar”, opina o cliente.
O que explica a alta do aluguel na Rua 14 de Julho?
Na opinião de especialistas em urbanismo, a situação da Rua 14 de Julho precisa de políticas públicas que repensem o uso do espaço para atrair diversidade na atividade econômica e mais pessoas para residirem na região central.
O urbanista Valter Cortez explica que o poder público precisa estudar a situação de desocupação dos imóveis e implementar incentivos para a região central.
“O que percebo no centro é mais um processo especulativo mesmo, os proprietários de imóveis querendo rentabilizar mais o seu capital imobilizado. E não se dão conta, ou não querem enxergar, o que ocorre no entorno: diversos imóveis desocupados”, explica.
O também urbanista Ângelo Arruda lamenta a situação da Rua 14 de Julho depois de tanto planejamento e investimento. Ele relembra que o projeto de revitalização demorou 30 anos para ser implantado e nesse tempo o mundo mudou.
“O que deve estar acontecendo é uma ressaca do comércio central com a enorme concorrência dos bairros, das centralidades neles e dos varejos da internet e shoppings […] o comércio da 14 de mais de 100 anos precisa buscar novas alternativas, pois o comércio que tem lá nem é mais exclusivo”, ele expõe.
Ângelo Arruda afirma que precisa ser exercitada a pergunta “O que me leva à Rua 14 de Julho?” diante de tanta concorrência. Além disso, faltam bares e restaurantes para trazer uma “alegria” à rua, especialmente depois que o comércio fecha no início da noite.
“A revitalização veio na onda do embelezamento urbano. Nem virou calçadão, nem virou rua. Os comerciantes não queriam o calçadão fechado. A opção de abrir em parte manteve o sistema viário e etc., mas ficou para trás a discussão do uso 24 horas”, ele aponta.
Audiência Pública discute o Centro
Nesta quarta-feira (16), foi realizada uma audiência pública na Câmara Municipal de Campo Grande para discutir sobre a revitalização da área central com o tema “Vida nova no centro”. Participaram do debate comerciantes e moradores da região.
Entre os pontos bastante comentados estão o estacionamento, competitividade do comércio frente aos shoppings e, especialmente, a segurança devido à presença de usuários de drogas.
O presidente do Camelódromo, Narciso Soares dos Santos, explica que mais de 2 mil pessoas trabalham no local. Diariamente passam aproximadamente 5 mil pessoas para realizarem compras, mas percebeu a queda no movimento.
“A região tem muitos usuários de drogas e acho que faltam políticas públicas voltadas para essas pessoas. Também é necessário apoio na segurança. Temos quatro seguranças contratados, mas a demanda é grande. Um pai de família que vai ao local e se depara com aquela quantidade de usuários não volta mais”, lamentou.
Já a presidente da Associação dos Moradores do Bairro Amambaí, Rosane Nely, afirmou que o bairro é o mais antigo com a maior rede hoteleira da cidade, mas que os campo-grandenses têm deixado de ir ao centro devido ao medo.
“Não adianta debater outros temas enquanto não ter políticas públicas voltadas aos usuários de drogas. Em 8 meses, 5 moradores de rua foram mortos no bairro. É um problema de saúde pública, de direitos humanos e de todas as secretarias. Não adianta a cidade ficar bonita com os vândalos depredando o patrimônio público”, ela afirmou.
O comerciante e presidente da Associação dos Empresários da Área Central, Paulo Rezek, disse a segurança é o maior problema enfrentado por quem mora na região.
“Moro no centro há 52 anos e a segurança é o maior problema enfrentado. A presença de usuários de drogas é constante, não só à noite, mas também durante o dia. Também acho necessária a volta do estacionamento rotativo. As pessoas não vão ao centro por falta de estacionamento. Acabam preferindo ir a shoppings. O comércio nos bairros também cresceu. É necessário ter uma Prefeitura atuante promovendo ações e mobilidade urbana também”, argumentou.
A audiência pública foi convocada pela Comissão Permanente de Controle e Eficácia Legislativa, composta pelos vereadores William Maksoud (presidente), Luiza Ribeiro (vice), Prof. Juari, Júnior Coringa e Claudinho Serra.
O presidente da Casa de Leis, vereador Carlão, disse que a Câmara irá recolher todas as opiniões e trabalhar para o centro voltar a ser como antes.
Obras na Rua 14 de Julho
As obras do Reviva Campo Grande foram lançadas em 15 de maio de 2018 e a revitalização na Rua 14 de Julho foi concluída 17 meses depois, em novembro de 2019.
De acordo com a Prefeitura Municipal de Campo Grande, as obras tinham o objetivo de priorizar os pedestres com calçadas mais largas, ilhas de convivência, arborização, mobiliário urbano, acessibilidade e segurança.
Foram implantadas câmeras de videomonitoramento, lâmpadas de LED, lixeiras, bancos e ilhas de descanso, calçadas padronizadas e árvores ao longo das quadras.
O contrato inicial com o BID (Banco Interamericano do Desenvolvimento) era de R$ 49,23 milhões, mas em setembro de 2019 foi acrescido com R$ 11,21 milhões, totalizando R$ 60,45 milhões na reforma da Rua 14 de Julho.
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