Cobrança abusiva e violação de direitos são rotina para quem depende de estacionamento em Campo Grande
Alguns clientes de espaços privados desconhecem todos os direitos que a legislação determina, os quais podem auxiliar na reparação de danos
Karina Campos –
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“Passei um pouco do tempo das duas horas (de gratuidade) que a gente tem direito ao convênio de estacionamento. Passaram-se 15 minutos e eles me cobraram R$ 14”. O relato é de uma cliente de estacionamento privado na Avenida Afonso Pena que mantém convênio com uma instituição.
São duas horas de gratuidade no cupom carimbado e o eventual tempo excedente era pago fracionado, no caso, R$ 6 a cada 30 minutos. Contudo, uma mudança na administração passou a surpreender os clientes, que além do excedente, precisavam pagar as horas abatidas no convênio.
Situações como essas têm se tornado cada vez mais comuns e expõem a existência de muitas dúvidas sobre o que normatiza a cobrança de estacionamento em Mato Grosso do Sul. Afinal, quais são os direitos do consumidor e deveres das administradoras? O Jornal Midiamax separou alguns exemplos de direitos essenciais para exigir em casos de reparação.
Proprietários de estacionamentos têm responsabilidades?
Para começar, não é apenas em casos de estacionamentos pagos que o cliente tem direitos em situações de danos: quando existe um estabelecimento que fornece um estacionamento interno ou externo oneroso, a empresa tem responsabilidades.
“Ela [a empresa] tem uma responsabilidade objetiva de acordo com o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. Ela não tem como se eximir dessa responsabilidade. Se eventualmente um cliente causa um dano a outro cliente dentro do estacionamento, a empresa também tem essa responsabilidade objetiva”, explica o presidente da CDC (Comissão de Defesa dos Direitos do Consumidor) da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso do Sul), Nikollas Pellat.
“Nesse caso, tem que se apurar em cada caso para verificar o que aconteceu, se a empresa tem imagens de câmera, se consegue identificar quem causou o dano, para ela chamar também nessa responsabilidade, tentar dividir a responsabilidade, ou se ela pagar, tentar eventualmente uma ação regressiva contra essa pessoa que causou o dano ao outro cliente dentro do seu estacionamento. Isso é uma discussão judicial, que muito provavelmente será resolvida apenas no âmbito de uma ação judicial”, acrescenta.
E se for público?
No caso do estacionamento rotativo, a faixa azul, que é de responsabilidade de prefeitura municipal, o especialista ressalta que há uma divergência na jurisprudência entre os tribunais. Isso porque, em via de regra, o estacionamento rotativo é uma maneira do município organizar as vagas, proporcionar uma rotatividade de estacionamento. Em Campo Grande, por exemplo, não há cobrança atualmente, já que houve o fim do contrato com a Flexpark. Portanto, caso ocorra um acidente em via pública, a responsabilidade é dos condutores.
Ainda assim, o advogado pontua que, sobre a “Zona Azul” ou “Área Azul”, o artigo 24 do Código de Trânsito Brasileiro determina que compete ao município a implantação e regulação de estacionamentos rotativos nas vias. Além disso, o artigo 1º do CTB estabelece a responsabilidade objetiva:
“§ 3º Os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito respondem, no âmbito das respectivas competências, objetivamente, por danos causados aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro na execução e manutenção de programas, projetos e serviços que garantam o exercício do direito do trânsito seguro.”
Mas, no caso de furtos ou roubos, aquele que sofre o prejuízo pode ajuizar uma ação para rever a perda, mas com o risco da decisão ser favorável ao Estado, já que o entendimento majoritário é que o Estado não tem o dever da vigilância do veículo.
Furtaram meu carro em estacionamento privado
É comum ver em alguns espaços a placa “Não nos responsabilizamos por danos e/ou objetos deixados no interior do veículo”. Mesmo com o alerta, a Súmula 130 do STJ (Supremo Tribunal de Justiça) esclarece: “A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento”.
Alguns estabelecimentos podem recorrer da decisão alegando que a súmula não se aplica aos estacionamentos gratuitos por não cobrarem do cliente o estacionamento, entretanto, no entendimento firmado pela Corte, a empresa responde pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento, sendo irrelevante a gratuidade, a falta de vigilância ou de controle de entrada e saída de veículos. Isso porque o contrato de depósito para guarda do veículo se materializa, ainda que de forma tácita, quando o estabelecimento oferece estacionamento como atrativo para sua clientela – e se propõe a guardá-lo –, auferindo proveito econômico dessa relação, decorrendo daí o dever de indenizar.
Perda do cupom
Pellat também detalha que caso o cliente perca o cupom do estacionamento, a empresa deve ter um sistema de controle, seja por meio eletrônico ou funcionários, sobre o tempo de permanência do consumidor no espaço pago.
“A cobrança da multa é abusiva, ela pode ser inclusive, em uma eventual discussão, ser anulada judicialmente, porque é o mesmo entendimento para quando o cliente, o consumidor, está em um estabelecimento, num restaurante, num barzinho, e ele perde a comanda. Esse controle do que foi gasto, período, enfim, tem que ser feito pela empresa”.
Cobrança por tempo excedido
O relato que abre a reportagem revela que uma cliente teve que pagar o valor do cupom por uma hora completa após ultrapassar o tempo limite de gratuidade fornecido pelo convênio. Para ela e outros clientes, há uma dúvida na cobrança fracionada.
“Passaram-se 15 minutos, exatamente 15 minutos, e me cobraram R$ 14. Não que eu não soubesse que ia ter cobrança, porque com a administração anterior tinha, a cobrança era de R$ 6. Então, achei realmente abusivo. Eu não conseguia ter clareza sobre a questão dos preços deles. A questão é o preço ser abusivo mesmo, e a gente não ter sido avisado disso e ser pego de surpresa. Que uma coisa é você cobrar, sei lá, de R$ 6 para R$ 10, agora de R$ 6 para R$ 14?”, diz.
O advogado explica que há um entendimento para a necessidade de um equilíbrio sobre a cobrança no tempo excedido. Por exemplo, se o espaço cobra um valor a cada 30 minutos e o condutor compareceu após alguns minutos, o ideal é que seja cobrado de forma fracionada. Entretanto, não há previsão legal de tolerância de 5 ou 15 minutos.
“Em uma disparidade dessa, de questão de valor, a pessoa pode abrir uma reclamação no Procon. Nesse caso específico (vivenciado pela cliente), ela pode abrir uma reclamação, porque a empresa cita 2h, passou um pouco e cobraram o valor cheio. Não é que a regra será a cobrança fracionada, depende muito da situação. Se houver uma disparidade muito alta com relação ao custo, isso vai variar de cada caso. Existia uma lei que determinava isso, que regulava essa questão da hora fracionada e do fracionamento, mas ela foi declarada inconstitucional”.
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