Em um país onde mais de 1,4 milhão de crianças foram registradas sem o nome do pai nos últimos 9 anos, conforme dados disponíveis no portal da transparência da Arpen (Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais), o teste de gravidez positivo costuma ser um divisor de águas entre abraçar o ‘papel de pai’ ou fugir sem ‘assumir a bronca’.
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A chegada de uma criança é um momento delicado, que exige preparo emocional, financeiro e, principalmente, disposição para assumir as responsabilidades perenes da paternidade. Para os pais, de diferentes perfis e gerações, entrevistados pela reportagem do Jornal Midiamax, a missão dada foi, e continua sendo até hoje, cumprida.
Primeiros passos de Isaac ecoam na descoberta da paternidade por Rafael
Pai de primeira viagem, o engenheiro civil Rafael Andrade, de 26 anos, expressa que, desde o nascimento do filho, Isaac, a paternidade se tornou uma das experiências mais transformadoras de sua vida.
“Lembro perfeitamente do misto de emoções que senti [no dia do parto]: felicidade acompanhada de medo intenso. O primeiro sorriso do Isaac foi inesquecível. Naquele instante, percebi que aquele sorriso seria a força que me impulsionaria todos os dias. A partir dali, tive certeza de que ele seria para sempre parte de mim e que esse amor é o mais verdadeiro que já experimentei”, declara.
Isaac, que recém completou seu primeiro ano de vida, está na fase de começar a andar e explorar o mundo à sua volta. Da mesma forma que para Isaac tudo é novidade, Rafael também vive esse paralelo com o filho, pois está aprendendo, ao lado dele, como é ‘ser pai’.
“Sempre que chora, o Isaac procura o meu colo. Quando sente medo, ele me chama e segura minha mão. São gestos simples, mas que carregam um significado enorme sobre a relação de segurança e amor que estamos construindo”, detalha Rafael.
Distância não é desculpa para ausência
Pai de Maria Fernanda, de 17 anos, o músico Kalu Carvalho, de 48 anos, ensina que a distância não é desculpa para a paternidade ausente. Ele mora em Bonito, enquanto a adolescente reside em Campo Grande. Para driblar a distância de 262 quilômetros, a tecnologia é a maior aliada.
“Hoje em dia é tão fácil você mandar uma mensagem pro teu filho. Todos os dias que a gente conversa, eu falo que a amo. Se a gente não tá conversando, eu mando alguma coisa pra ela. A gente ameniza [a distância] com boas conversas, com as redes sociais, a gente troca memes porque temos humor parecido. E digo que se ela precisar de alguma coisa, pra ela contar comigo. Independente se a gente tá próximo ou não, a gente tem essa certeza que podemos sempre contar um com o outro”, expressa Kalu.
De toda forma, Kalu explica que vem a Campo Grande com frequência, assim como recebe Maria Fernanda em sua casa. O momento em que a dor da distância mais apertou foi durante a pandemia, motivada pelas necessidades de quarentena e lockdown.
“Logo depois que teve a pandemia, ela estava morando aqui em Bonito, e aí acabou voltando para Campo Grande junto à mãe, e foi muito forte para mim o dia que a gente acabou se despedindo, porque ninguém sabia o que era a pandemia direito, como seria aquilo… Foi muito difícil ver a minha filha partindo e não saber quando eu a veria de novo”, relembra.

Ver os filhos crescer ‘dói’, por isso, é preciso sabedoria e paciência
O contador Marcus Vinícius Caixeta de Oliveira, de 72 anos, passou pela experiência da paternidade duas vezes, e descreve que esse foi o momento mais ‘mágico’ da vida dele. Marcus relata que se separou da esposa quando as crianças estavam prestes a entrar na adolescência. A partir daí, assumiu a guarda e responsabilidade da criação.
O decorrer dos anos foi tranquilo, pois ele afirma que exercer as responsabilidades da paternidade nunca foi algo difícil. “Todos os dias eu acordei abraçando e falando que ia dar certo”, completa. Os desafios da paternidade, no entanto, vieram quando ele se deu conta de que os anos passam, as crianças envelhecem, e saem debaixo da asa dos pais para buscarem seu lugar no mundo. Nesta fase, só resta ter sabedoria e paciência.
“A coisa mais difícil é um pai entender que os filhos não são mais bebezinhos, que eles cresceram, e também respeitar que as opiniões e o mundo deles é diferente. São gerações mais dinâmicas, e você tem que começar a entender que não pode modificar esse crescimento. [Os filhos] crescem e têm que ocupar um lugar na vida, na sociedade, e a gente fica com esse sentimento de: ‘nosso bebezinhos cresceram’”, descreve Marcus.
Do teste positivo ao nascimento, quando a paternidade desperta?
A chegada de uma criança é um momento delicado, que exige preparo emocional, financeiro e, principalmente, disposição para assumir as responsabilidades da paternidade. O nascimento, ou até mesmo o teste positivo para gravidez, costuma ser um divisor de águas entre abraçar o ‘papel de pai’ ou se deixar ser consumido pelo receio de ‘assumir a bronca’.
No caso do engenheiro civil Rafael Andrade, foi ao ver o rosto do filho pela primeira vez o exato momento em que percebeu que seria responsável pelo futuro de uma criança. O misto de emoções que sentiu ao conhecer o filho transformou o mundo que conhecia.
“Enxergá-lo tão pequeno e indefeso me fez perceber, naquele instante, que eu seria responsável por uma vida. Isso mexeu profundamente comigo. Senti o peso da responsabilidade, a necessidade de ser um exemplo em amor, caráter, respeito e atitude”, comenta Rafael.
O músico Kalu Carvalho comenta que, diante do teste positivo, assumir o papel da paternidade também foi praticamente instantâneo. “Quando foram feitos os exames e comprovou que eu seria pai, já sabia que seria uma menina e que ela se chamaria Maria Fernanda. Eu já sabia dessa responsabilidade, foi algo muito instantâneo para mim”.
Para o contador Marcus de Oliveira, a tarefa de criar uma criança é uma benção, por isso, recebeu de braços abertos essa missão. “A magia de ser pai, de ser mãe, é uma coisa de Deus. Então, para mim, foram os dias mais felizes da minha vida. Eu vi que eu tinha condições de dar carinho, de acalentar, e eu sabia que isso ia me motivar dia após dia e querer viver mais”.

Existe um jeito certo de ser pai?
Em uma sociedade cada vez mais diversa, marcada por diferentes culturas, gerações e estilos de vida, a paternidade também ganha novos significados. O que significa ‘ser pai’ hoje pode variar de acordo com o tempo, o lugar e até mesmo a configuração de cada família.
No entanto, em uma coisa todos os pais ouvidos pela reportagem concordam: mais importante do que uma fórmula que ensine o jeito certo de ser pai, o que realmente importa é ser presente e significativo no contexto da própria realidade.
Para Rafael Andrade, acompanhar cada fase do desenvolvimento do filho e oferecer uma boa educação é indispensável. “Quero educar com valores que formem um ser humano melhor do que eu sou. Quero que meu filho cresça com dignidade, caráter e consciência do valor de cada conquista”, expressa.
Se pudesse dar um conselho para os futuros pais, Rafael diria: “sejam responsáveis. Ajudem suas esposas o máximo que puderem. Aproveitem cada instante com seus filhos, pois o tempo passa depressa. Não se apeguem excessivamente ao lado financeiro, nada vale mais do que a felicidade e a união da sua família”.
Para Kalu Carvalho, o conselho seria curtir todos os momentos especiais, principalmente aqueles que não voltam mais. “Eu sempre procurei estar nos melhores momentos, nos primeiros passos, nas primeiras palavras. É de uma riqueza imensurável você estar ali, poder vivenciar isso e depois vê o teu filho se tornando um profissional, se tornando uma pessoa boa, uma pessoa consciente”.
Marcus de Oliveira finaliza aconselhando aos pais que se permitam sentir tudo o que a paternidade proporciona. “Ser pai foi uma das melhores coisas que aconteceu comigo, meu conselho é deixar entrar a magia do amor [de ser pai] no seu coração. Os desafios são ínfimos frente à alegria que os filhos são na vida da gente”.
Pais ausentes ainda são uma realidade alarmante no Brasil
Em Mato Grosso do Sul, cerca de 25 mil recém-nascidos foram registrados sem o nome do pai na certidão de nascimento, desde 2016. No ano passado, o número de bebês registrados apenas com o nome da mãe chegou a 2,7 mil. Em um panorama nacional, mais de 1,4 milhão de crianças foram registradas sem o nome do pai nos últimos 9 anos. Os dados estão disponíveis no portal da transparência da Arpen (Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais).
Para os pais presentes entrevistados pela reportagem, o cenário é ‘lamentável’. Segundo Rafael, a ausência está interligada à falta de conscientização do papel que um pai desempenha na vida de um filho.
“Infelizmente, nem todos os pais compreendem o valor e o compromisso da paternidade. Acredito que isso vem muito da criação que muitos tiveram. Muitos homens não foram educados para entender a profundidade de assumir a responsabilidade por um filho e, por isso, acabam sendo irresponsáveis ou ausentes”, opina Rafael.
Na opinião de Kalu, a ausência causa um distanciamento difícil de reverter, no caso daqueles pais que tentam recuperar o tempo perdido.
“Eu acho lamentável um pai que é ausente na vida do de um filho. Infelizmente alguns pais ausentes perdem momentos incríveis junto com os filhos, e eu acredito que eles deveriam refletir muito sobre isso, porque é uma vida que espera que você seja o porto seguro, e uma vida que se espera que você ajude a criar”, expressa Kalu.
Como reconhecer a paternidade
Desde 2012, o reconhecimento de paternidade pode ser feito diretamente em qualquer Cartório de Registro Civil do país, conforme o Provimento nº 16 do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Com isso, quando há concordância entre as partes, não é mais necessária uma decisão judicial para o procedimento.
Se a iniciativa partir do pai, ele deve comparecer ao cartório com a cópia da certidão de nascimento do filho. Será exigida a anuência da mãe ou do próprio filho, caso ele seja maior de idade. Para filhos menores, a autorização da mãe é obrigatória. Se o pai se recusar a reconhecer a paternidade, a mãe pode indicar o suposto pai no cartório, que comunicará o caso aos órgãos competentes para dar início à investigação de paternidade.
O reconhecimento de paternidade socioafetiva — quando os pais criam uma criança mediante uma relação de afeto, sem nenhum vínculo biológico — também pode ser feita diretamente em cartório.
O procedimento exige o consentimento da mãe, do pai biológico e da própria criança, desde que ela tenha 12 anos ou mais. Cabe ao registrador civil verificar a existência desse vínculo afetivo com base em provas concretas, como: inclusão da criança em plano de saúde ou órgão de previdência; comprovação de residência conjunta; existência de casamento ou união estável com o genitor biológico, entre outros.
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