Passados seis dias do início do ‘tarifaço’ do presidente estadunidense Donald Trump, que elevou a taxa do imposto sob importações de produtos brasileiros para um total de 50%, ainda gera receios para alguns setores da economia brasileira, principalmente aquelas que baseiam-se em exportações para os EUA.”
Entretanto, o decreto executivo trouxe alívio para algumas cadeias produtivas, ao isentar 694 produtos. Ficaram de fora do tarifaço itens como suco e polpa de laranja, combustíveis, minérios, fertilizantes e aeronaves civis.
Em Mato Grosso do Sul, a indústria de celulose, que responde por 31,9% da exportação brasileira para os EUA (U$ 213 milhões em 2024), não sentirá o impacto. O ferro manufaturado e o aço, que exportaram U$ 124 milhões, também foram isentos, mas já possuíam uma tarifa de 50%, não havendo mudança, na prática.
Aumento de consumo interno
Apesar das isenções, um dos principais produtos sul-mato-grossenses exportados para os EUA sofreu o aumento da tarifa, a carne bovina in natura. Segundo o professor de economia, Eugênio da Silva Pavão, a produção de carne em MS faz parte de um “circuito mundial,” com as empresas brasileiras sendo “players internacionais.” Ele sugere que a “dependência por carne brasileira será importante para uma reavaliação das tarifas na economia norte-americana.”
Para o professor, o setor da carne bovina, que já exportou U$ 282 milhões neste ano (42,1% do total anual de MS para os EUA), é o que mais poderá sentir o impacto. Questionado sobre a viabilidade de exportar para os EUA, o professor acredita que a busca por parte das autoridades de MS de novos mercado-alvo dificilmente complementará a queda da demanda dos Estados Unidos. Segundo ele, “isso pode levar a um aumento da oferta no mercado interno e, consequentemente, a uma “queda dos preços” para o consumidor local.
“Inicialmente terá queda dos preços internos (pequena porcentagem), devido ao aumento da oferta interna, posteriormente, se conquistarem novos e maiores mercados, a oferta interna deve reduzir e os preços subirão novamente, até um novo equilíbrio de mercado”, explicou o professor.
Questionada se haveria um cenário de risco para o setor produtivo brasileiro, ele alerta sobre uma preocupação de que setores sejam afetados de forma secundária. “Se [Trump] não conseguir os resultados esperados das tarifas atuais (percentual e número de produtos), corremos o risco de ter novos impactos nos setores ‘poupados’ (minérios, celulose, etc), afetando a economia brasileira, os empregos e até mesmo as plantas industriais, que podem se deslocar para o país do Norte”, disse ainda.
Segundo o professor, há três possíveis cenários para o celeuma atual: a manutenção da instabilidade atual; o acirramento dos ânimos entre Brasil e Estados Unidos, com ampliação da guerra tarifária; ou uma reação internacional, com melhores resultados para o Brasil e outras economias. Ele, no entanto, ressalta que estes cenários levam em conta a “racionalidade econômica, o que não está acontecendo neste início do tarifaço”, concluiu.

Adaptação do mercado
Contudo, o Estado já está há mais de três semanas de suspensão da exportação de carne bovina aos Estados Unidos em decorrência da taxação. Frigoríficos do Estado não registram redução na produção e seguem vendendo para o mercado interno e externo.
A afirmação é do vice-presidente do Sincadems (Sindicato das Indústrias de Frios, Carnes e Derivados de Mato Grosso do Sul), Alberto Sérgio Capucci. Segundo o especialista, não há expectativa de retorno dos compradores norte-americanos diante do tarifaço; entretanto, o mercado segue estável.
A produção deve ter como destino novos mercados ou crescimento de mercados já existentes, como China, Chile e países do Oriente Médio. Dados da Secex (Secretaria de Comércio Exterior) indicam que a China concentra 49% do total embarcado de carne bovina pelo Brasil.
Em caso de a alternativa ser procurar novos mercados, o total deve ser de quase 50 mil toneladas de carne que terão novo destino. Isso porque Mato Grosso do Sul exportou 49,6 mil toneladas do produto para os Estados Unidos, o que totalizou R$ 1,3 bilhão (ou US$ 235 milhões) de carne bovina no período. Os dados estão disponíveis no sistema Agrostat, do Governo Federal.