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Cotidiano

Submundo digital: o perigo invisível que ameaça crianças e adolescentes online

Criminosos usam plataformas ‘inofensivas’ para ter acesso ao público infantil
Karina Campos -
adolescentes ilustração Giovana Freire
Adolescentes criam vínculos com desconhecidos pela internet (Ilustração, Giovana Freire, Midiamax)

Não fale com estranhos, não aceite comida de desconhecidos ou não pegue carona com quem não conhece. A geração millenial — e aquelas que a antecederam — cresceu com o som de alerta sobre os perigos nas ruas. Sim, ruas. O perigo iminente era offline e pré-internet.

Hoje, na geração Alpha, composta por pessoas nascidas entre 2010 e 2025, o perigo entra em casa de maneira ardilosa, sem o conhecimento dos pais. Pela internet, crianças e adolescentes estão criando vínculos sociais através do submundo dos crimes digitais.

Um recente caso que ganhou repercussão nacional acende o alerta sobre o tipo de conteúdo que esse público está consumindo online: a morte de uma menina de 8 anos, no Distrito Federal, após inalar gás de desodorante aerossol durante um desafio em plataformas digitais.

Atentados por mera diversão

Além dos episódios de automutilação assistidos, grupos também planejam atentados por pura diversão e para praticar crimes de ódio. Um exemplo ocorreu no show da cantora Lady Gaga, no , quando uma denúncia anônima revelou que um grupo organizava, pela plataforma online Discord, um ataque com coquetéis molotov e mochilas explosivas.

A polícia do Rio de Janeiro revelou que o plano foi articulado por um grupo radical que disseminava ódio contra crianças, adolescentes e a comunidade LGBTQIA+. Segundo as investigações, tudo fazia parte de um “desafio”, e os envolvidos estavam recrutando participantes, inclusive adolescentes, para promover os ataques.

Os envolvidos foram identificados, um homem foi preso e um adolescente apreendido — o que frustrou o atentado antes que uma tragédia acontecesse. Ao todo, nove pessoas foram investigadas na Operação Fake Monster.

Após a repercussão, o Discord encaminhou uma nota ao portal dizendo que “prestou assistência direta às autoridades responsáveis por esta operação, contribuindo para a identificação dos indivíduos envolvidos. Temos políticas rigorosas contra atividades que promovam discurso de ódio, incitação à violência e o compartilhamento de conteúdo prejudicial em nossa plataforma”.

Público vulnerável

Sobre o comportamento dos jovens, Glaucia Benini, terapeuta e doutoranda em neurociências, salienta que esse público envolve-se em desafios da internet baseados em discursos de ódio e práticas que incentivam a automutilação ou o suicídio, movidos pelo “efeito manada”. O termo também é conhecido como bandwagon effect, e descreve a tendência humana de seguir a opinião ou ação de um grupo, mesmo sem analisar a fundo os fundamentos ou as consequências.

“Os estudos de neurociência comprovam que o cérebro absorve o comportamento alheio, ele copia realmente o que o outro está fazendo. Ou seja, existe um contágio emocional e, dependendo do ambiente ao qual esse adolescente ou essa criança está exposto, ele é influenciado. Isso explica toda essa influência durante a fase da adolescência, porque é uma fase em que o cognitivo e o emocional ainda não estão formados. Então, todo adolescente é potencialmente influenciável, com pouca capacidade de discernimento, e, ao mesmo tempo, é uma fase de muita curiosidade. Esses desafios se tornam, assim, um chamariz”.

Logo, compreender e distinguir entre o certo e o errado exige um nível de maturidade que ainda não foi desenvolvido nessa fase da vida. Por isso, é imprescindível que haja monitoramento e supervisão, mesmo no ambiente digital.

A terapeuta lista uma série de condições e fatores psicológicos que favorecem a vulnerabilidade emocional e levam jovens a participar desses desafios perigosos na internet, como pressão social, busca por aceitação e desejo de atenção.

“Está todo mundo fazendo; quem não faz é considerado fraco ou covarde. Quem consegue realizar o desafio de forma mais impactante acaba sendo mais aceito ou acolhido por um grupo. Esse desejo de entretenimento, atenção, aceitação e o contágio — como dito anteriormente — faz com que, ao compartilhar dessas ideias, o jovem realmente absorva o comportamento e o pensamento do outro”.

Crimes pelas redes sociais

A delegada Daniela Kades, da Delegacia Especializada de Atendimento à Infância e Juventude de , explica que os principais crimes cometidos por adolescentes em plataformas digitais são:

• atos infracionais relacionados à divulgação de material de cunho sexual e/ou pornográfico;
• criação de perfis falsos;
• disseminação de ódio racial, de classe social e/ou cunho ideológico e sexual;
• incentivo a jogos perigosos, que muitas vezes resultam em lesões graves ou morte.

Em abril deste ano, um adolescente de 14 anos, morador de , foi um dos alvos de uma operação contra um grupo criminoso que utilizava plataformas criptografadas, como Discord e Telegram, além de redes sociais. Entre as práticas, atrair adolescentes para desafios de automutilação coletiva, crueldade contra animais, incitação ao ódio e até sugestões de ataques violentos.

Sobre o perfil dos adolescentes envolvidos nesses crimes, Kades revela não haver uma única motivação por trás da prática.

“O adolescente, pela imaturidade, costuma agir por impulso, sem razões óbvias para determinadas atitudes. Geralmente, são alvos fáceis de manipulação por parte de adultos, mas, quando agem sozinhos, normalmente foram vítimas de bullying e não estão recebendo ajuda para lidar com os problemas. Claro que cada situação tem suas particularidades, mas, usualmente, o jovem não costuma relatar os motivos de suas ações”.

Como atraem adolescentes e crianças?

“Os grupos atraem geralmente os jovens mais vulneráveis e que não estão sob a supervisão de seus responsáveis. Eles acabam encontrando no mundo digital uma liberdade que não têm na vida real, acreditando poder dizer e fazer tudo — ou quase tudo”.

A delegada reforça que as plataformas têm a obrigação de reportar qualquer atividade suspeita ou ilícita, e que o Governo possui grupos permanentes de análise de conteúdos digitais.

“Assim, tão logo é verificada a possibilidade de alguma ilicitude nas redes sociais, esse conteúdo é imediatamente encaminhado para análise e investigação, culminando em prisões, apreensão de jovens e de todo o material irregular”.

Benini destaca que o monitoramento dos adolescentes não significa quebra de privacidade. Para ela, a privacidade não deve ser confundida com proteção nessa fase da vida. O limite é, na verdade, uma forma de cuidado. É necessário, além de promover o diálogo, ensinar reflexão e desenvolver a educação socioemocional.

“É necessário, sim, o monitoramento e a supervisão da navegação na internet. Hoje em dia, existem alguns aplicativos que podem ser usados, como o Family Link, do . Esses aplicativos impedem a navegação anônima, pois os adolescentes já sabem que os pais acessam o histórico depois, então usam o modo anônimo. Com isso, o controle se perde. Por meio desses aplicativos, é possível barrar o acesso a sites com conteúdos sobre suicídio, automutilação, e ideologias perigosas”.

Não são somente redes sociais onde esses grupos atuam, mas também em aplicativos de jogos com acesso a chats. Criminosos estão infiltrados em grupos online no Facebook, Instagram, Telegram e outros. O mecanismo utiliza ferramentas de interação voltadas ao público infantil, que podem parecer inofensivas, mas estão sendo usadas para indução à violência.

“Os pais devem buscar um diálogo constante, ensinar reflexão e alertar sobre os perigos. Mostrar ao filho que ele está sendo monitorado, que isso é necessário, e que esse limite é uma forma de cuidado. Também é fundamental estar atento aos sinais de que o adolescente pode estar envolvido com desafios perigosos ou sendo influenciado por essas plataformas”.

Fique atento aos sinais

Portanto, para Benini, além do monitoramento dos conteúdos e das plataformas acessadas, é necessário observar sinais como:
• Agressividade;
• Isolamento repentino;
• Hiperfoco nas telas;
• Irritabilidade;
• Apatia;
• Alterações de humor;
• Queda no desempenho escolar.

Por fim, buscar o apoio de um terapeuta ou profissional da psicologia é essencial.

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