Protesto reúne mulheres no Centro de Campo Grande: ‘chega de violência’
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O protesto “Chega de Violência Contra as Mulheres” reuniu cerca de 50 pessoas na manhã deste sábado (22), na praça Ary Coelho, em Campo Grande. A mobilização apresentou tema importante no mesmo dia em que Mato Grosso do Sul chegou ao quarto feminicídio em 2025, dessa vez ocorrido em Água Clara, há 192 km de Campo Grande. Mulheres protestam contra a violência no Centro de Campo Grande:
Uma das organizadoras do protesto era Seila Aparecida Feitosa. A aposentada é mãe Valquíria Feitosa Patrício Gomes, médica encontrada morta junto do filho em 2016. O caso dado como suicídio motiva a mãe, que acredita ter sido um homicídio, a lutar pelos direitos das mulheres.
Seila passou por inúmeras dificuldades ao longo dos anos. “Encontrei dificuldade desde o início para conseguir entrar e conversar com alguém na delegacia. Encontrei muitas barreiras. Tenho várias provas, tenho vários testemunhos, só que encontrei dificuldade na delegacia onde está o caso, que é no 1º DP (Delegacia de Polícia). Eu tenho vários documentos, eu tenho várias testemunhas que até hoje não conseguiram falar, porque as portas estão muito fechadas”.
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A aposentada busca por respostas há nove anos e resolveu criar um grupo no Whatsapp para juntar as vítimas de agressão. Ela afirma que o áudio deixado por Vanessa Ricarte encorajou as mulheres a falarem.
“Esse áudio encorajou todas as mulheres que estavam quietas, vítimas de violência. Todo mundo começou a falar ao mesmo tempo. Então eu resolvi fazer esse manifesto para dar voz para as vítimas. Por quê? Porque elas precisam ser ouvidas. E para elas serem ouvidas, a gente tem que ir para as ruas, a gente tem que fazer alguma coisa, até que todas sejam ouvidas” reforça Seila.
Chega de violência
Mara Dalila, fundadora de causas sociais voltadas para mulheres, principalmente de periferias, é outra organizadora do protesto e conta que o áudio de Vanessa trouxe à tona deficiências que existem no procedimento de denúncias quanto a violência contra a mulher.
“Nós temos leis eficazes, nós temos penas altas, mas nós não temos um procedimento na Casa da Mulher Brasileira sendo efetivo com essas vítimas de violência doméstica. Não temos uma eficácia plena no momento em que as mulheres são recebidas ali na Casa da Mulher Brasileira. Com toda certeza, a falha está no primeiro atendimento à vítima” comenta Mara.
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A manifestação ocorreu no mesmo dia do quarto feminicídio do estado em 2025. A empresária Mirielle Santos, de 26 anos, foi morta a tiros. O caso dá ainda mais força para o movimento que dá voz as mulheres.
“O que muita gente na sociedade tem dito para a gente é que a gente é mimimi. É que as mulheres são repetitivas. Mas mais uma mulher se foi. Isso aqui não é mimimi. Homens da sociedade, pelo amor de Deus, depende de todos vocês também estarem aqui. Cadê os homens nesse protesto? Sempre só tem mulheres. Não adianta mulheres estarem aqui. São os homens que matam. Então eu vou reivindicar que a sociedade masculina esteja nesses movimentos. Venha com a gente neste enfrentamento. A gente precisa de mudança” pede Mara.
Homens também devem lutar pelas mulheres
Se o número de pessoas no protesto foi bem menor do que o esperado, o de homens então nem se fala. Entre os poucos homens presentes, cerca de cinco, apenas uma segurava um cartaz e estava no meio das mulheres mostrando fazer parte do protesto. Plínio Bressane, biólogo e sociólogo, era o único que segurava um cartaz.
“Quando se mata uma mulher, se mata toda uma comunidade. A gente tem que se colocar no ponto de vista que uma mulher representa muitas instituições. Ela representa nossas irmãs, as mães, nossos avós, nossas vizinhas. Enfim, quando se mata uma mulher, se mata uma comunidade, se mata um sonho de todo um grupo. Nunca se mata um corpo sozinho. A dor não é unitária, não é unidimensional, ela é multidimensional. Ela atinge todos nós, em qualquer lugar, onde a gente estiver. A gente tiver. Então, deixa um bocado para os homens” explica Plínio.
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Para Plínio o problema da violência contra a mulher é algo estrutural. “Se a gente pensar o Banco Central, hoje o Banco Central é movido por homens, a Bolsa de Valores é movida por homens, então o dinheiro é movido por homens e cadê o espaço das mulheres? Então a gente pensa assim, que essa igualdade ela nunca se atingiu, então eu penso que é preciso que a gente trabalhe na raiz, na escola, estude a identidade. De gênero, que a gente possa ter isso no currículo e todos os sindicatos, que todas as instituições, movimentos sociais, tratem esse tema com muita seriedade”.
Vítimas não ouvidas
Uma das mulheres presentes foi vítima de violência contra a mulher e na tentativa de se defender para escapar da morte, ela arranhou o agressor, que é policial. Logo em seguida, foi registrar uma BO (Boletim de Ocorrência). No local, a mulher não foi levada a sério.
“Eu me envolvi com uma pessoa que é policial, vivemos seis meses juntos, fui agredida quando não deu mais certo, pedi para ele sair da minha casa, porque a pressão psicológica estava sendo muito, muito, muito, entrei numa depressão, não conseguia mais comer. Pedi para ele sair da minha casa, só que ele foi só a 200 metros da minha casa, ele mudou para 200 metros da minha casa” relata a vítima.
A mulher ainda conta que ele passava com frequência na frente da casa dela, mesmo com a medida protetiva que ela possuía.
A agressão ocorreu quando a vítima foi conversar com o agressor a respeito das contas deixadas por ele durante o período que moraram juntos. Foi quando ele puxou ela pelo cabelo para dentro do carro, começou a bater nela e a querer chutar seu rosto.
Com medo da morte, ela arranhou o braço dele para se defender e caso fosse morta ter o DNA dele para identificar o autor do crime. Com isso, ele ligou o carro e saiu e alta velocidade arrastando a perna dela pelo asfalto.
O policial foi absolvido, mas a vítima vai ter que responder por agressão judicialmente. “Ele está lá como uma vítima. E eu como a culpada” lamenta ela.
Promuse
O protesto também teve o objetivo de chamar a atenção para as policiais militares que faziam parte do Promuse (Programa Mulher Segura) e após comentários nas redes quanto ao atendimento na Deam foram realocadas para outro local.
“Meu maior objetivo hoje aqui, além de lutar contra o feminicídio, é a favor das PMs do programa Promuse. Elas sabiam a situação da Deam. Já levei várias vítimas para lá e nada do que foi falado no áudio da Vanessa é mentira. E por elas terem dito o que acontecia lá, elas foram retiradas do Promuse” explica Joceane Dias, presidente do bairro Jardim Carioca.
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Ela conta que conheceu as policiais em 2020 após três feminicídios ocorridos no bairro. “Elas abraçaram a causa de forma de extraordinária. Desde 2020 passei por vários casos com vítimas de tentativa de feminicídio, de agressão, de violência doméstica e elas nunca me disseram não quando eu ligava. Elas não vão fazer diferença em outra área de Campo Grande, elas vão fazer diferença no Promuse”.
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