A 6ª Vara Cível de Campo Grande determinou uma indenização de R$ 10 mil a uma paciente que denunciou violência obstétrica na Maternidade Cândido Mariano. A mãe, que entrou em trabalho de parto na unidade em 2019 e 2023, alega que foi humilhada e os filhos negligenciados durante o atendimento.
Conforme o processo, em 2019, a paciente detalha que passou por uma cesariana e foi deixada sozinha na sala pós-cirúrgica, sem qualquer acompanhante. Ela relata que permaneceu horas no quarto com o recém-nascido entre as pernas, sem conseguir se mover, e o hospital não comunicou seu esposo para que este lhe fizesse companhia.
A paciente só conseguiu contato com o marido após uma mulher visitar o quarto e emprestar o celular para uma ligação. O pai questionou funcionários do hospital e conseguiu visitar a companheira só após o nascimento.
O episódio resultou em estresse pós-traumático, causando ansiedade e palpitações toda vez que seu filho chora.
Violência também no segundo parto
No segundo parto, em 2023, a mãe deu entrada na maternidade com o acompanhamento de uma doula. Entretanto, também relata que sofreu violência obstétrica pelos funcionários. Ela conta que uma enfermeira teria tentado retirar o bebê do colo em cinco minutos após o nascimento, interrompendo a chamada “hora de ouro”, considerado como um momento crucial para a mãe e o bebê.
A enfermeira teria justificado que havia outra mulher que sofreu curetagem no mesmo ambiente e que era falta de respeito com a dor dela. Assim, a paciente relata que foi exposta e humilhada pelas funcionárias que a questionaram se ela era a “mãe que deu show” para ficar com o bebê.
Ainda, no dia seguinte ao seu segundo parto, ficou sem medicação para dor e sem anti-inflamatórios e antibióticos por um dia inteiro e que ao procurar ajuda, as enfermeiras e o médico plantonista informaram que a prescrição não havia sido passada.
O que diz a maternidade
A maternidade negou a violência denunciada nos dois casos. A unidade apresentou contestação da denúncia, alegando que os fatos narrados “não ocorreram da forma como foram descritos, defendendo a inexistência de falha na prestação de serviços médicos e hospitalares”.
Outro fator que a maternidade alega é que a paciente jamais foi impedida de ter um acompanhante e que o esposo dela decidiu por conta própria aguardar na recepção. Além disso, alega que ele foi avisado sobre a acomodação no quarto.
Ainda nega que a paciente tenha ficado desassistida, alegando que uma técnica de enfermagem a acolheu e a orientou sobre o aleitamento materno logo ao chegar no quarto, retornando em seguida para o banho e curativo do recém-nascido.
Quanto ao choro do bebê na sala de recuperação anestésica, a maternidade sustenta que o bebê precisa ficar em berço aquecido, que não pode ser movido para a sala de recuperação, e que não há legislação que obrigue a mãe a ficar com o bebê nesse local.
Também sobre o choro do recém-nascido, o hospital informa que é normal, podendo ter causado uma falsa impressão na mãe, possivelmente devido aos efeitos da anestesia.
Com relação ao segundo parto, a unidade afirma que a mãe fez exigências para que seu filho ficasse em seu colo, o que foi atendido, mas que o tempo foi limitado devido à presença de outra parturiente que havia perdido o filho.
Por fim, argumenta que a equipe agiu com empatia e paciência e nega que a paciente tenha sido humilhada, zombada ou ameaçada por funcionários, afirmando que a instituição adota políticas de boas práticas e de humanização no atendimento.
Decisão da justiça
O juiz Deni Luis Dalla Riva condenou a maternidade por danos morais pelas falhas verificadas no atendimento médico-hospitalar durante o parto dos dois filhos da paciente.
“Os atos ilícitos não foram isolados, mas se repetiram em dois partos, com consequências diretas e profundas para a autora, que desenvolveu TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático), como confirmado em Juízo por sua psicóloga”.
O juiz ainda prossegue: “A desassistência no primeiro parto e a violação do direito à ‘golden hour’ no segundo demonstram uma falha sistêmica da instituição em garantir a atenção humanizada e o respeito aos direitos da parturiente. Tais fatos, por si só, justificam uma indenização que seja capaz de reparar o sofrimento da autora e de desestimular a reincidência de condutas semelhantes”.
‘Demorei para ter coragem’
A mãe comemorou a decisão e conta ao Jornal Midiamax que a decisão pode encorajar outras mães que também sofreram violência obstétrica a procurar seus direitos.
“É tão absurdo, mas é real. Eu demorei a ter coragem de entrar com a ação, pois no primeiro parto eu achei que a culpa era minha”.
“Existem, sim, profissionais podres por dentro, mas existem pessoas de luz. Nessa maternidade existem diversos profissionais do bem que querem, sim, um parto humano. Basta a instituição reciclar com formação de qualidade algumas pessoas que precisam. Eu tive o azar de encontrar com essas, mas tenho certeza que Jesus o permitiu, para que eu fosse a voz daquelas mulheres que não o tem”, pontua.
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(Revisão: Bianca Iglesias)