Pesquisadores, bombeiros, brigadistas, fazendeiros, lideranças indígenas e representantes de entidades ambientais se uniram no início deste mês para treinamentos práticos e discussões sobre o uso do fogo como ferramenta de conservação do Pantanal.
Essa foi a primeira edição do evento “Dias de Campo: Resgate do uso tradicional do fogo no Pantanal”, realizado nas fazendas Xaraés e Alegria, nas regiões de Miranda-Abobral e Nhecolândia em Mato Grosso do Sul.
A iniciativa reuniu mais de 50 pessoas durante três dias de atividades que incluiu demonstração prática de queima prescrita executada pelos brigadistas indígenas kadiwéu Mesaque Rocha e Rubens Ferraz, referências no manejo do fogo na Terra Indígena Kadiwéu e no combate aos incêndios florestais na região.
A queima foi realizada em um hectare da fazenda Alegria, sob condições climáticas favoráveis, com todos os protocolos de segurança.
Fogo como aliado, não vilão
Muitos acreditam que o fogo é uma total ameaça ao meio ambiente. No entanto, estudos científicos demonstram que, quando bem manejado, o “fogo prescrito” pode cumprir funções ecológicas importantes, como controlar espécies invasoras, renovar pastagens e reduzir o material combustível que alimenta grandes incêndios.
Esse conhecimento é confirmado pela sabedoria do povo indígena. O coordenador estadual do PrevFogo, do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), Márcio Yule, promover esse tipo de encontro sobre uso do fogo no Pantanal é muito importante no cenário de mudanças climáticas e ambientais.
“Há, pelo menos 25 anos a gente trabalha nessa perspectiva de manejo integrado do fogo e é muito importante, nesse momento, aqui na região do Pantanal, fazer o resgate do uso do fogo pelas populações tradicionais pantaneiras. Precisamos observar a ecologia do fogo e colocá-lo onde é extremamente necessário como fator de proteção, principalmente no período crítico”, pontuou.

Dessa forma, a iniciativa discutiu como as políticas públicas podem incorporar os saberes tradicionais e garantir a participação ativa de comunidades pantaneiras no enfrentamento dos incêndios florestais, sobretudo diante das mudanças climáticas e eventos extremos cada vez mais frequentes.
Exemplo internacional
Segundo o diretor-executivo do Instituto Terra Brasilis, Reinaldo Lourival, a construção de um sistema de monitoramento do fogo é alvo de trabalho do instituto desde os anos 2000, levando à proposição desse evento.
“Começamos com o programa de capacitação de brigadas e estruturação das brigadas pantaneiras. Agora, acabou evoluindo para esse caminho de retomar o trabalho com fogo em função da emergência que estamos vivendo: do volume, da frequência e da intensidade desses eventos extremos, que estão conectados com o clima”, explicou.
Grande incêndio em Portugal e o Pantanal
Lourival ainda afirma que muitos pensam que o trabalho de formação é caro, mas o prejuízo causado pelo fogo é ainda maior. Por isso, os Dias de Campo contaram com a presença do pesquisador português Emanuel de Oliveira, que pode apresentar a experiência do Manejo Integrado no Fogo em seu país.
“Em 2017, houve um acidente muito sério (em Portugal) e morreram mais de 100 pessoas na estrada, consumidas pelo fogo florestal”, relembrou.
“Essa situação fez o país virar a chave e compreender que não dá para atuar num sistema ou num momento em que tem uma crise climática da mesma forma que se agia no passado. Por isso, a necessidade de trazer exemplos de fora daqui, colocar isso junto numa roda de conversas, para ver o que aprendemos e como podemos avançar”, explicou.
Capacitação com uso do fogo
O evento também contou com uma capacitação de proprietários e colaboradores de propriedades rurais no entorno da Fazenda Alegria, no modelo participativo original do “trabalho de Gado”, um tipo de mutirão entre vizinhos, coordenado pelo proprietário Heitor Miraglia Herrera e sua filha Bruna Paes Herrera.
A demonstração de queima prescrita foi um dos momentos mais simbólicos do evento, na ocasião, foram entregues EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) e equipamentos de combate, entre eles, abafadores, sopradores e pinga-fogos para a brigada voluntária da Fazenda Alegria treinada durante o evento.
“Esse encontro buscou justamente resgatar a relação entre quem vive no bioma e o uso tradicional do fogo, promovendo o entendimento de como utilizá-lo de forma estratégica e sustentável”, detalhou Rafaela Nicola, diretora-executiva da Wetlands International Brasil e coordenadora científica da Mupan (Mulheres em Ação no Pantanal).

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