Sem o básico, Dia das Crianças é só uma data qualquer para crianças da favela

Para os pais, o presente que gostariam de entregar às suas crianças inclui saúde, estabilidade e dignidade

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Dia das Crianças na Comunidade Favela (Alicce Rodrigues, Jornal Midiamax)

Chegamos à Comunidade Mandela no início da manhã. O sol queima a pele das crianças que correm, despreocupadas, pelas vielas e escombros do que um dia foram casas abrigando dezenas de famílias.

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Mas, se elas não estivessem ali, igualmente saberíamos que os pequenos vivem naqueles barracos, afinal, dezenas de brinquedos, mochilas e patinetes colorem o cenário tão cinza das tábuas e lonas. Neste ano, a Comunidade Mandela completa dez anos. Isso significa que a maioria daquelas crianças que nos recepcionam com suas mãos e rostos sujos de terra, não conhecem outra realidade que não a favela.

Por isso, para os pais que vislumbram um futuro melhor para seus filhos e lamentam não conseguir oferecer às crianças aquilo que para tantos é trivial, o Dia das Crianças tem um gosto amargo.

No Dia das Crianças, o básico é o maior presente

Percorremos os corredores da Comunidade até nos encontrarmos com Zeomara Ana, de 26 anos. A jovem mora na Comunidade com o filho caçula, Walace Eduardo, de 1 ano e 3 meses. No momento da entrevista, o pequeno brinca com a água que escorre pelas vielas.

“Ele é um menino muito hiperativo, ágil, prestativo e inteligente. Começou a andar há um mês e agora não tem quem o segure”, conta a mãe toda orgulhosa.

Mas, a vida não é fácil para quem vive em uma favela. Nem mesmo para as crianças. Zeomara conta que sua maior preocupação é com a saúde do filho, que fica exposto às vulnerabilidades do lugar. Como o pequeno tem bronquite e problemas respiratórios, as idas às unidades de saúde são frequentes devido ao tempo seco, a exposição a fumaça e a ausência de saneamento adequado.

“A previsão é que receberei minha casa em dezembro. Quando nos mudarmos, quero arrumar um emprego, colocar ele na creche e garantir um futuro bom para nós. Quero que ele estude para ser alguém na vida, para ter um bom emprego quando for adulto. Eu não tive escolaridade adequada e sei como isso pode dificultar a vida de alguém. Completei o ensino fundamental com o EJA porque quero ser um exemplo para meus filhos”, afirma.

Sonhar na favela é custoso para pais e crianças

Emocionada, Zeomara nos conta que tem um filho de 7 anos que não mora com ela justamente por viver em situação de favela. Hoje, o menino mora com a avó, em Dourados, e seu maior sonho de vida é trazê-lo para viverem em família.

“Isso me dá uma esperança, a certeza de que terei um lugar melhor para criar meus filhos. O mundo do Walace sempre foi aqui na favela, nunca tivemos uma casa. Agora ele terá um quarto, vai ter um lugar que não alaga quando chove”, conta.

Para ela, que não consegue garantir uma comemoração tradicional com brinquedos e um banquete, o maior desejo é que o filho cresça com mais oportunidades e tenha um futuro promissor.

Dificuldades diárias

Seguimos caminhando pelas casas de madeira até que nos encontramos com Vitória Salazar, de 17 anos. A jovem também foi uma criança da favela. Hoje ela mora na Comunidade Mandela com o filho, de 1 ano e 4 meses, com a mãe e o irmão de 6 anos.

Conforme Vitória, o maior desafio para quem vive em uma comunidade é lidar com a saúde precária, os remédios nem sempre disponíveis nas unidades de saúde e a alimentação, nem sempre disponível nos pratos.

“Pra gente, a situação está difícil desde a retirada das famílias daqui. Como diminuiu o número de pessoas vivendo na favela, poucas pessoas têm feito doações, que era o que mais nos ajudava aqui. Nos traziam roupa para os bebês, produtos de higiene, limpeza e alimentação, mas agora não chega mais”, lamenta.

A jovem nos conta que neste tempo de seca extrema, muitas pessoas que nem vivem na comunidade têm ateado fogo na mata que fica ao fundo das moradias, o que aumenta assustadoramente o calor do lugar e os problemas de saúde de crianças e idosos que ali vivem.

Conforme Vitória, a saída das famílias da favela aumentou consideravelmente a insegurança de quem ainda não conseguiu uma casa. A preocupação com as crianças, principalmente, é constante. “Muitas pessoas que não conhecemos passam por aqui durante o dia. Se antes as crianças ficavam livres e brincavam, hoje já não podem mais. Ficamos inseguros, não sabemos o que essas pessoas podem fazer”, lamenta.

O que sonhar para o Dia das Crianças?

Quando não se tem o básico, sonhar com brinquedos tecnológicos, roupas e calçados novos, por exemplo, é algo de outro mundo para pais e crianças de favela. Enquanto muitos se perguntam o que dará de presente, quem vive na favela se pergunta quando poderá viver com dignidade.

“Esses dias a gente tava andando na rua, aqui na frente, uma mulher viu meu filho e entregou um pacotinho de doce. Foi uma alegria para ele que não tem acesso a isso, assim como outras crianças”, lembra.

“É uma tristeza criar um filho em uma favela, as pessoas olham diferente pra gente, até para as crianças. Nos chamam de favelados, pés sujos, já ouvi isso muitas vezes”, enfatiza Zeomara.

(Alicce Rodrigues, Jornal Midiamax)

Políticas Públicas

No caso das crianças moradoras de favela, o atendimento voltado às vulnerabilidades sociais e econômicas é realizado por meio do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) do território, explica a Prefeitura de Campo Grande.

O atendimento voltado a essas e às demais crianças acontece por meio do (PAIF) Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família, o SCFV (Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos) e do Programa Criança Feliz (Primeira Infância no SUAS). O principal objetivo é fortalecer as relações familiares e comunitárias, assim como promover a integração com foco na prevenção e enfrentamento das diferentes formas de violação. 

Conforme a Prefeitura de Campo Grande, as necessidades das famílias em situação de risco pessoal, violência e violação de direitos, público considerado prioritário para o atendimento, são acompanhadas pela Proteção Social Especial, através do Centro de Referência Especializado de Assistência Social, o CREAS.

A provisão de alimentos é estabelecida como um benefício eventual, que acontece após estudos e análise da equipe técnica do CRAS de referência (assistente social e psicólogo) sobre a criança e sua família.

O Cadastro Único é o principal instrumento para a seleção e a inclusão de famílias em programas federais, sendo usado obrigatoriamente para a concessão dos benefícios do Programa Bolsa Família, da Tarifa Social de Energia Elétrica, do Programa Minha Casa Minha Vida, ID Jovem, entre outros. Também pode ser utilizado para a seleção de beneficiários de programas ofertados pelos governos estaduais e municipais. 

(Alicce Rodrigues, Jornal Midiamax)

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