‘Pessoas tiravam aliança’: Pregação para arrecadar dinheiro na Aliançados durava até duas horas

Em denúncias, há uma regularidade: muitos relatos afirmando que, após os ritos religiosos realizados na Arena, o principal foco seria a arrecadação de dinheiro, bem como a adoração ao pastor Denilson

Valesca Consolaro – 05/09/2024 – 08:04

Ouvir Notícia Pausar Notícia
Compartilhar
Fachada Aliançados – Ana Laura Menegat

Após a repercussão que expôs acusações contra Denilson Fonseca, o líder da Comunidade Cristã Aliançados, em Mato Grosso do Sul, uma série de relatos e mais denúncias chega à reportagem do Midiamax diariamente. Em uma parte dessas denúncias, há uma regularidade: muitos relatos afirmando que, após os ritos religiosos realizados na Arena, o principal foco seria a arrecadação de dinheiro, bem como a adoração ao pastor Denilson.

“As pessoas tiravam aliança, corrente de ouro, chave de carro, moto, muito dinheiro, muito mesmo. Naquele dia, eles contaram o total de dinheiro arrecadado e falaram que foi R$ 9 mil”, afirmou uma pessoa que contou sobre sua experiência na Arena, após participar de um culto em 2022, mas que deseja não ser identificada.

Segundo o relato, o valor de R$ 9 mil foi a soma de várias arredações em dinheiro. Entretanto, a pessoa afirma ter ficado espantada com as pessoas doando bens tão valiosos como carros, motos e joias.

Em meio às doações tão generosas, resta uma questão: o que teria motivado tanta generosidade? “Ele falou que Deus daria para eles tudo em dobro e que, por isso, ele [Denilson] estava doando a BMW dele”, disse a denunciante.

Além disso, obras, melhorias nas igrejas, lanche e sala para as crianças e serviços gerais, bem como as dificuldades financeiras da igreja eram citados como motivos para arrecadarem as doações. Conforme o relato, de fato, havia uma sala dedicada às crianças e elas recebiam lanche após o culto.

“Ele falava que precisava ampliar aquilo ali, abrir mais igrejas, ele relatava isso. Dizia que ele não precisava, pois já semeou e agora já colhia, com essas palavras”, pontuou.

Primeira doação teria sido BMW do próprio Denilson

Logo, a primeira grande doação teria sido do próprio pastor, dispondo de um bem muito valioso. “Ele falou ‘vou sair daqui direto para o aeroporto e eu preciso que alguém me leve, porque estou doando meu carro’”, relatou a pessoas que presenciaram o acontecimento.

Em sequência, as informações são de que as pessoas ficavam cada vez mais motivadas a doar qualquer coisa que tivessem. “Ele fez primeiro esse ‘ritual’, não sei como chamar, para incentivar as pessoas a irem doando. Eu sei que pessoas tiravam aliança, sabe?”, disse.

“Eu frequento igreja evangélica, mas eu não gosto de negócios que envolvem dinheiro dessa forma. Gostei muito do culto, gostei da pregação, tinha um cara de fora, de São Paulo, pregando, gostei muito. Mas aí quando terminou a pregação, por volta das 21h, foi até 23h da noite naquela pedição, naquela coisa. E as pessoas fazendo fila para abraçar ele, o povo idolatra ele”, acrescentou.

Além disso, o autor da denúncia destacou que, na ocasião, empresários sempre eram mencionados. “Ele dizia isso assim para todo mundo ouvir, os fiéis, todo mundo: ‘você que é empresário levanta sua mão, se você der o que tocar no seu coração, a sua empresa vai prosperar tanto”.

Sobre esse caso das doações, a reportagem contatou novamente a equipe de Denilson Fonseca, mas não houve retorno até a publicação. O espaço permanece aberto para acréscimo de informação.

É possível reaver bens doados às igrejas?

Diante desse e de outros relatos muito semelhantes, a reportagem conversou com o advogado especialista em direito civil, Marcus de Jesus Silva Lopes, o qual explicou que existe a possibilidade de reaver bens doados às igrejas.

“As pessoas que se sentiram prejudicadas de alguma forma com essas doações, com esses valores, que se sentiram pressionadas de alguma forma, elas podem entrar com uma ação judicial pedindo a nulidade desses atos”, disse o especialista.

Segundo ele, é possível alegar defeitos do negócio jurídico, argumento utilizado para explicar que houve falha no negócio, sendo influenciados a atuarem sob pressão, após atos de dolo ou coação.

“O caminho correto seria entrar com uma ação anulatória e pedir a devolução desses bens”, explicou Marcus.

Esse é um tipo de caso que há jurisprudência antiga e pacificada, inclusive no STJ (Superior Tribunal de Justiça), no sentido de que esses bens podem ser devolvidos.

A igreja Universal foi umas das primeiras a serem envolvidas em processo jurídicos desse teor. No ano passado, o portal Jota noticiou um caso em que a Universal foi condenada a devolver R$ 204 mil doados por fiel arrependida.

Pastor monitorava ‘igrejas abaixo dos 12K’

Pastor tinha grupo para monitorar igrejas que arrecadavam dízimos ‘abaixo dos 12k’ (Reprodução)

Em meio à repercussão de várias acusações contra Denilson Fonseca, mais uma ganhou destaque: a existência de um grupo com as igrejas que tinham arrecadação abaixo de R$ 12 mil ao mês. Por meio do grupo, ele passava orientações sobre como alcançar comerciantes, com base em sua estratégia denominada como “culto, fé e negócio”.

Conforme as denúncias feitas ao Midiamax, incluindo a do pastor Paulo Lemos, que desencadeou uma série de relatos com relação aos abusos de Denilson, o chefe da comunidade era conhecido por constranger pastores que arrecadassem muito menos que outros. Segundo as afirmações, era comum a comparação e questionamentos em relação aos motivos por alguns arrecadarem menos que determinados colaboradores.

Inclusive, há registros do grupo denominado como “Igrejas abaixo dos 12K”, por meio do qual ele monitorava a “produtividade” na arrecadação de cada local. A meta era atingir ganhos de R$ 12 mil por mês para então poder deixar o grupo.

Por meio do mesmo grupo, ele retomava ensinamentos dados em sua formação de “culto, fé e negócio”, para cada pastor saber como atingir a meta.

Constrangimentos e demissões desencadearam denúncias

O chefe da comunidade era conhecido por constranger pastores que arrecadassem muito menos que outros. Segundo as afirmações, era comum a comparação e questionamentos em relação aos motivos por alguns arrecadarem menos que determinados colaboradores.

“Seu problema é ser pastor de pobre”, relataram ex-integrantes da Aliançados sobre as afirmações de Denilson, quando não atingiam o que classificam como ‘metas de arrecadação’ de dízimo.

O pastor Paulo Lemos publicou uma nota oficial sobre seu desligamento da comunidade, que foi acompanhado de assédio moral e destruição de sua imagem. A nota foi publicada no dia 25 de agosto, por meio de vídeo em rede social, mobilizando centenas de comentários na postagem, dos quais muitos são de relatos de pessoas que teriam sofrido o mesmo tipo de desmoralização.

Segundo Lemos, nos últimos anos, pelo menos 40 pastores foram demitidos sob o mesmo “modus operandi”. Os afastamentos seriam sempre acompanhados de destruição da imagem do pastor alvo do momento. O motivo? Eles seriam pessoas que ‘sabiam demais’ ou que ganhavam ‘mais visibilidade e fama’ do que deveriam.

A nota ganhou repercussão nacional e soma centenas de comentários, nos quais não é difícil encontrar relatos que se assemelham ao do pastor Paulo Lemos.

Caso da escola de “cura gay”

O nome de Denilson ganhou os holofotes de Campo Grande ainda em 2019, quando foi alvo de investigação do Ministério Público de Mato Grosso do Sul, por vender um “curso de cura gay”. À época, o caso foi investigado como discriminação contra pessoas LGBTQI+.

O curso contava com uma colaboração na quantia de aproximadamente R$ 1 mil por participante. Denominado como “Escola de Cura”, prometia a libertação da “doença” depois de três dias de acompanhamento. Por fim, a investigação foi arquivada.

Posicionamento do pastor Denilson Fonseca

Em nota enviada anteriormente ao Jornal Midiamax após ser questionado sobre as denúncias, Denilson Fonseca negou todas as acusações feitas contra ele no exercício de chefe da Comunidade Cristã Aliançados. Segue a nota na íntegra:

1º NÃO existe nenhuma acusação de desvio de recursos da Comunidade Cristã Aliançados, envolvendo a pessoas de seu presidente Denilson Fonseca esse fato assim como outros não passa de fake News, com o objetivo de manchar a honra e conduta do Apóstolo Denilson Fonseca.

2º O Pastor Paulo Lemos, não foi expulso da Comunidade Cristã Aliançados, ele foi destituído dos cargos que exercia de forma voluntária, por má conduta, nos termos do Estatuto de Ética da instituição, sendo que após esta medida de afastamento dos cargos, este achou por bem sair desta igreja, jamais sendo expulso. Referidas afirmações de expulsão são meras ilações.

3º Quanto a propagação de fake News, infelizmente não podemos dizer quem é o autor, vez que existe um inquérito policial em trâmite para investigação de sua autoria, por tanto não podemos atribuir a qualquer pessoa tal prática até o presente momento.

4º Quanto às acusações do GDS News, podemos dizer que existe um processo em trâmite no Judiciário de Mato Grosso do Sul, onde busca apurar as fontes e esclarecimentos de todos os fatos imputados a Comunidade Cristã Aliançados, bem como a pessoa de seu presidente Denilson, e que tal processo corre em segredo de justiça, fato que nos limita a falar sobre este.

5º Sobre questões salariais de Pastores, começamos deixando claro que não temos Pastores contratados em nosso quadro de funcionários, e que todos os que servem neste ministério são de forma voluntária, e nos termos da Lei do Voluntariado. A fim de auxiliar o trabalho voluntário de pastoreio, alguns pastores recebem ajuda de custo para despesas realizadas no exercício deste ofício voluntário. Neste sentido, as ajudas de custos estão, necessariamente, atreladas a gastos comprovadamente realizados por este voluntário.

6º Quanto aos questionamentos de páginas da internet de como os recursos seriam aplicados, cumpre esclarecer que existe uma diretoria que determina a aplicação de recursos, além de ser informada e declarada à Receita Federal todas as entradas e saídas de recursos mensais; Quanto a fiéis, desde que sejam integrantes deste ministério, todos tem livre acesso aos relatórios, tanto de receitas, quanto de despesas, não havendo o que declarar sobre tal assunto.

7º Quanto às alegações de dificuldades financeiras, a igreja, acompanha o cenária nacional, passando por todas as crises e dificuldades que atingem a todos os Brasileiros, porém fazemos uma gestão financeira rigorosa, para que todas as nossas despesas continuem equacionadas e possamos manter nossas despesas rigorosamente em dia, assim como esta nos dias atuais.

8º Ainda quanto ao valor de doação de fiéis, através de dízimos e ofertas, caso não seja uma oferta anônima, todas são devidamente declaradas conforme acima descrito. Assim, não há que se falar em recebimentos mensais por parte de fiéis, a não ser os tributos que este voluntariamente doa para cumprimento de princípios bíblicos. Sendo estes os esclarecimentos que temos a fazer sobre os assuntos, nos colocamos à disposição para quaisquer outros esclarecimentos que julgarem necessários”.

Siga o Jornal Midiamax nas redes sociais

Você também pode acompanhar as últimas notícias e atualizações do Jornal Midiamax direto das redes sociais. Siga nossos perfis nas redes que você mais usa. 👇

É fácil! 😉 Clique no nome de qualquer uma das plataformas abaixo para nos encontrar:
Instagram, Facebook, TikTok, YouTube, WhatsApp, Bluesky e Threads.

💬 Fique atualizado com o melhor do jornalismo local e participe das nossas coberturas!

Conteúdos relacionados

pantanal