Na terra, a casinha feita de madeira e lona às margens do Rio Paraguai. No coração, a paz por ter o Pantanal como quintal. Antonio Donizete de Matos, de 66 anos, fincou morada no Pantanal. Por isso, nem mesmo um incêndio a 300 metros de casa afugentou o Ribeirinho, que trocou a cidade pelo ar fresco da natureza. 

A maior planície alagada do mundo sofre há semanas com incêndios florestais, que transformaram a paisagem da natureza e das cidades pantaneiras. Corumbá, por exemplo, está encoberta por fumaça e fuligem, enquanto na terra encontra-se um solo pincelado de preto, animais queimados ou desesperados tentando fugir do fogo. 

O monitoramento de focos ativos do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) mostra que o número de focos no Pantanal de Mato Grosso do Sul chegou a 1.942 do início de junho até a última sexta-feira (21), o que já é muito maior na comparação com todo mês de junho do ano passado, quando o bioma registrou 77 focos de incêndio.

Antônio não troca o Pantanal pela cidade

Idoso mora “só” com a companhia da natureza. (Henrique Arakaki, Jornal Midiamax)

Aposentado e viúvo há cinco anos, Antônio não titubeou: decidiu “trocar” a casa na Cidade Branca por uma residência simples às margens do rio. Mesmo ainda tendo moradia na área urbana, prefere passar o dia rodeado pela natureza.

Contudo, esse sossego foi perturbado nos últimos dias com a chegada das chamas perto de casa. “É a primeira vez que chega bem pertin [sic]. O medo é constante porque a gente não sabe quando vai acontecer, pode chegar uma pessoa fumando, um palito de fósforo, uma bituca de cigarro e tudo começa de novo”, ele teme. 

O ribeirinho lamenta que os bichos, os maiores prejudicados com o fogo, muitas vezes não conseguem fugir das chamas. 

Bombeiros ajudaram a apagar as chamas. (Henrique Arakaki, Jornal Midiamax)

“O que passa na minha cabeça é que eu pego o meu barquinho e atravesso para o lado de lá. E as capivaras, as sucuris, esses bichos que vivem aqui, os jacarés, tem que sumir tudo aqui, porque como vão ficar? Eu penso mais nos animais porque eles são tudo para o Pantanal, se acabar os animais, nós acabamos também”, pondera o senhor.

Antônio não faz ideia sobre como o fogo começou, mas tinha certeza que a força das rajadas de vento ajudou a propagá-lo até perto de casa. O alívio veio com a chegada da brigada do CBMMS (Corpo de Bombeiros Militar de Mato Grosso do Sul) que ajudou o idoso a apagar as chamas.

Chamas podem ser vistas a quilômetros de distância. (Henrique Arakaki, Jornal Midiamax)

“Para nós que estamos acostumados e temos vivido aqui, é a nossa vida, quem experimenta não larga mais. É difícil mosquito, tudo essas coisas que tem fogo, mau tempo, mas tudo essas coisas quem vive disso aqui ele não abandona porque é a nossa vida”, garante.

Futuro não é promissor

Profissionais envolvidos no monitoramento dos incêndios no Pantanal alegam terem sido ‘pegos de surpresa’ com o avanço das chamas nesta época do ano. Isso porque, historicamente, o fogo costuma ter o ápice em agosto e setembro.

Porém, com a situação da forma que está – com Corumbá encoberta por fumaça, centenas de animais mortos e mais de 200 mil hectares do Pantanal consumidos pelas chamas –, a descrença em um futuro próximo mais ameno é inevitável.

Segundo o chefe de Brigada Pantanal do Prevfogo, Anderson Thiago, normalmente em junho, a equipe começa a se preparar para os incêndios. “No mês de junho estávamos começando a nos preparar para definir as dinâmicas de preparação. Neste ano, em junho, já estamos atuando em incêndios de grandes proporções”, relata.

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Fumaça em Corumbá (Henrique Arakaki, Jornal Midiamax)