Sabemos que a morte não é um acaso da vida, ao contrário, ela é a única certeza que carregamos conosco. Ainda assim, quando nos deparamos com a possibilidade de a encontrarmos, a tememos. Nos questionamos, não aceitamos, afinal, ver a vida se dissipar pode ser a experiência mais avassaladora da nossa existência.
Foi assim para o escritor sul-mato-grossense Tommy Bento quando, em 2019, soube que seu sobrinho Arthur havia recebido o diagnóstico de leucemia aos 5 anos. Inspirado na força e alegria que o pequeno nunca deixou de demonstrar, Tommy tornou a dor da família em combustível para levar esperança a tantas outras famílias que passavam – e passam – por este momento tão desafiador.
Naqueles dias incertos, em que a fé se embrenhava ao medo de perder aquele que lhe trouxe luz ao nascer, o escritor embarcou na jornada de tornar seu amor por escrita uma realidade e um afago para o coração.
Tommy publicou dois livros para arrecadar fundos para instituições de tratamento e apoio às famílias que lutam contra o câncer e também, deu vida aos personagens queridinhos da criançada, passando de ala em ala dos hospitais, arrancando o sorriso daqueles que, tão pequeninos, já ensinam sobre amor, resiliência e esperança.
“A alegria da casa, o som que quebra a tristeza – som de criança”
Tommy conta que sua conexão com o sobrinho sempre foi intensa, baseada em um amor genuíno. Ele viu Arthur nascer, crescer e se tornar uma criança fantástica. Mesmo morando em cidades diferentes, já que toda a família do escritor é de Jardim, Tommy sempre fez questão de estar por perto, acompanhando o crescimento do sobrinho.
Tudo ia bem, até que em maio de 2019, veio o diagnóstico: leucemia. Tommy lembra que estava com passagens e ingressos para assistir à Copa América, mas, com o resultado dos exames, cancelou tudo para prestar apoio à família que veio para Campo Grande para que Arthur realizasse o tratamento.
“Foi um susto para todos nós. Levou tempo para assimilar o risco e o perigo, foi difícil, afinal, é leucemia. Mas ele sempre foi um menino muito forte, positivo e sorridente, mesmo com as dores e a pouca idade. Isso nos dava motivos para acreditar na cura”, conta.
“As dores são de medo, seu medo é de todos”
Durante os seis primeiros meses após o diagnóstico, Arthur ficou internado. Nos meses seguintes, o pequeno se dividia entre ficar em casa e no Cetohi (Centro de Tratamento de Oncologia Infantil).
Com este momento conturbado na vida da família, somado a chegada da pandemia de Covid-19, Tommy decidiu dar asas ao seu amor pela escrita e transformar sua dor em poesias. “A escrita sempre esteve viva na minha essência, mas eu sempre fugi dela. De certa forma, a escrita transforma tanto quem escreve quanto aqueles que leem. Foi então que me permiti esse dom. Com algumas críticas positivas de amigos, pensei em lançar os livros”, explica.
Em dois meses, o sul-mato-grossense escreveu as duas obras, mas decidiu deixar os textos engavetados. Foi então que, em 2023, ele decidiu divulgar o primeiro, intitulado ‘Fragmentos de Encontros: Poesias D’alma’.
A ideia de publicar a obra surgiu com o intuito de ajudar a AACC-MS, por conhecer o importante trabalho que a instituição realiza.
“Foi nesta época que entrei no projeto de voluntariado, na Liga do Bem. Eu fazia o Harry Potter. Hoje continuo fazendo, mas estou em outro grupo, no Amor em Ação”.
A homenagem e a experiência com o sobrinho vieram no segundo livro, ‘Momentos, transformados em poesias e crônicas’, através do capítulo ‘Sorrir Mesmo com as Quedas de Cabelo’. “Ele me inspirou com sua força e sorrisos, mesmo se submetendo ao doloroso tratamento”, conta.
Segundo Tommy, quando Arthur soube que ganharia um capítulo no segundo livro do tio, sorrio timidamente, e o abraçou.
“Quis passar a mensagem de que as crianças têm muito a nos ensinar. Elas são mais maduras e forte do que pensamos. O livro é cheio de mensagens, não só por conta disso, mas de outros fatores, como dores, medo, perdas, sofrimento e amor”, explica.
Hoje, felizmente, Arthur está curado e apenas faz acompanhamento médico de rotina.
“Tudo tem uma razão, você nos fez mais fortes”
Tommy explica que com a venda do primeiro livro ele pretende destinar R$ 50 dos royalties para a AACC. No entanto, há uma quantidade mínima de vendas para que a editora passe uma parcela de vendas para ele.
“Infelizmente não consegui atingir essa quantidade de vendas (200 unidades). Infelizmente tive pouca ajuda, tudo foi custeado por mim”, lamenta. “O segundo livro, que tem a homenagem para meu sobrinho, ele está apenas no digital, e tem objetivo de destinar 70% do que receber para duas ONGs”, acrescenta.
Se você tem interesse em comprar os livros e ajudar a causa, basta clicar aqui: Fragmentos de Encontros: Poesia D’alma e Momentos: Transformados em Poesias e Crônicas.
O que é leucemia?
A leucemia é um tipo de câncer maligno que se inicia dentro da medula óssea, acometendo as células do sangue do paciente. Conforme o médico onco-hematologista, Marcelo dos Santos Souza, há mais de 20 tipos de leucemia e sua classificação depende exclusivamente de qual célula é acometida ou de sua maturação.
Entre as variações da doença, a leucemia linfoide aguda é o câncer mais comum na infância e atinge os glóbulos brancos, que são células do sistema imunológico que protegem o organismo de infecções e substâncias estranhas.
Há também a leucemia mielogênica aguda, um câncer que progride rapidamente e interfere na produção normal de glóbulos brancos, vermelhos e de plaquetas. Este tipo é muito mais comum entre adultos. Nas crianças, apenas 5% recebem tal diagnóstico.
Já a leucemia linfoide crônica se desenvolve a partir de um tipo de glóbulo branco chamado de célula B. Ela progride lentamente e costuma afetar principalmente os idosos.
Sintomas e causas da leucemia
Conforme o especialista, a leucemia é uma doença genética, podendo, ou não, ser hereditária. No entanto, o estilo de vida também torna uma pessoa pré-disposta à doença, como o tabagismo, sedentarismo, síndromes genéticas e contato direto com substâncias como o agrotóxico.
Como algumas são mais agressivas que outras, o diagnóstico costuma vir em tempos diferentes e exigem tratamentos também distintos.
Entre os principais sintomas, estão: anemia, palidez na pele, manchas roxas no corpo, sangramento espontâneo, maior pré-disposição a doenças infecciosas, alteração no baço, fígado e dor, devido à pressão na medula óssea.
“Quando percebe estes sinais, o paciente precisa ir quanto antes fazer o exame de hemograma, que repercute todas essas variações da medula óssea, como plaquetas baixas. Este é um dos principais exames iniciais. Depois, o paciente realiza o exame de mielograma, onde tiramos um pouco de sangue da medula, fazemos o exame de genética, que dá condição de caracterizar o tipo de doença e a gravidade, para então programar o tratamento adequado”, explica.
Nos casos de leucemia, o tratamento é quimioterapia e pode variar de 1 a 2 anos, a depender do tipo de câncer.
