Acordo completa um mês com paz e ansiedade para indígenas que aguardam retomada em MS
Estado vai indenizar em R$ 144 milhões grupo de produtores rurais da região para deixarem as terras
Priscilla Peres –
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Há um mês, um acordo no STF (Supremo Tribunal Federal) pôs fim a décadas de conflito na terra indígena Kaiowá Ñandeva, em Antônio João. Nesses 30 dias, indígenas Guarani Kaiowá respiram aliviados, mas ansiosos pelo pagamento das terras e saída dos produtores rurais da área.
O acordo é inédito e prevê indenizações que somam R$ 144 milhões a grupo de produtores rurais da região. Após o pagamento, com recursos da União e Governo de Mato Grosso do Sul, eles têm um prazo legal para deixar o local. Ainda não há data exata para o repasse financeiro, mas a expectativa é de que aconteça em novembro.
Dessa forma, tudo caminha para que 2024 termine com indígenas ocupando inteiramente as terras que disputam há anos. A área de conflito que envolve a Fazenda Barra, de propriedade da influente família Ruiz, foi homologada como terra indígena em 2002. Mas teve os efeitos suspensos pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em seguida.
Há um ano, o conflito pela área ganhou força, diante da pressão de indígenas e ações dos fazendeiros para se manterem na área, com escolta da Polícia Militar de Mato Grosso do Sul autorizada pela Justiça. Em setembro, um indígena foi morto a tiros, desencadeando um grande conflito e o acordo inédito.
Ansiosos pela retomada da terras
Após enfrentarem dias de tensão e luto em setembro, o acordo no STF trouxe alívio para os indígenas da aldeia Campestre. Escoltados pela Força Nacional, eles conseguiram realizar o ato simbólico de instalar uma cruz no local onde o jovem Neri da Silva morreu.
O ato fúnebre seria algo rotineiro, se não fosse por dois agravantes: Neri foi morto dentro da propriedade da Fazenda Barra e se soma as muitas vítimas fatais do conflito de terra. Por isso, o ato precisou ser acompanhado de forças policiais e só aconteceu após o acordo no STF.
Com tudo isso, se vê que o clima é constante de tensão na aldeia. “Nós estamos tudo apreensivos aqui”, disse Isaías, líder da comunidade indígena. A afirmação se deve a proximidade com as propriedades rurais, pois alguns indígenas precisam passar pelo território particular para ir caçar e pescar e isso gera vários conflitos.
“A comunidade toda está nessa apreensão, nessa ansiedade, esperando que a situação toda seja resolvida. A gente espera que essa data não se prolonguem”, diz o líder.
Pagamento por terras é legal
Os indígenas contestam o pagamento por terras de fazendeiros, se dizem vítimas da situação e que eles deveriam ser indenizados. Porém, o advogado indigenista Anderson Santos, há previsão legal para que o pagamento seja feito. Mas os casos são diferentes uns dos outros.
“Se o estado concedeu o título de propriedade em local que foi reconhecido como de ocupação tradicional, ele cometeu um erro, e esse erro causou dano, e sendo assim, o direito à reparação sempre existiu, não há conflito com a efetivação da demarcação de terras indígenas”, afirma o advogado.
Sobre o caso de Antônio João abrir precedente para outros, ele explica que cada caso precisa ser analisado juridicamente. “Não existe um modelo para todas as reivindicações por demarcação, nesse caso, em específico, a solução para lidar com a tensão instalada na área foi essa, reparar o proprietário do título pelo dano que o Estado causou a ele, mas não significa que todas as situações poderá se resolver dessa forma”.
Indígenas expulsos na colonização
Acordo milionário para indenizar produtores rurais de Antônio João vai pôr fim a conflito por terra com indígenas que remonta desde a década de 1920, quando terras Kaiowá Ñandeva começaram a ser desapropriadas e cedidas ou vendidas como títulos de propriedade, como incentivo à colonização. A situação consta em documento do STF (Supremo Tribunal Federal).
Laudo antropológico afirma que a situação foi desencadeada com o fim da Companhia Matte Laranjeira, em 1919. Naquele período, o Governo Federal incentivava a colonização e as terras indígenas foram sendo ocupadas e transformadas em áreas produtivas, a fim de fomentar o comércio na região.
“Em relação às populações indígenas que ali habitavam, literalmente há séculos, são desenvolvidas distintas modalidades para retirá-los de suas terras”, diz o laudo antropológico que cita ações que vão de oficiais de despejo à violência com armas.
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