Mato Grosso do Sul tem terremotos há mais de um século e tremores podem chegar a Campo Grande
Maior abalo de terra em solo sul-mato-grossense ocorreu na década de 1960 e foi sentido em Campo Grande
Thalya Godoy –
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Era manhã de 13 de fevereiro de 1964, quando o gerente de uma empresa na Avenida Calógeras, em Campo Grande, sentiu a cadeira tremer e percebeu que um frasco com álcool em uma prateleira próxima também oscilou. Já os funcionários de outro prédio na mesma rua abandonaram o posto quando perceberam o terremoto e que o chão balançava.
Outros relatos sobre sentir a terra tremer apareceram na Capital e no interior, decorrentes do sismo de maior magnitude registrado no Estado, que partiu da região Noroeste de Mato Grosso do Sul. Segundo o Centro de Sismologia da USP (Universidade de São Paulo), esse foi o 29º abalo de terra mais intenso na história do Brasil.
A descrição acima sobre o maior abalo de terra em Mato Grosso do Sul foi retirada da dissertação “Levantamento Histórico, Cartográfico e Análise da Atividade Sísmica na Região Centro-Oeste do Brasil: Ênfase na Bacia Sedimentar do Pantanal”, da mestre em geografia pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Lucimara José da Silva.
O estudo catalogou sismos inéditos e complementares da região Centro-Oeste, especialmente da Bacia Sedimentar do Pantanal, que ocorreram entre 1744 a 1981. Dos 27 registros destacados na dissertação, 19 são inéditos e 7 possuem informações adicionais já elencadas no livro Sismicidade do Brasil (1984).
Os tremores geralmente são rápidos, mas são capazes de assustar milhares de pessoas em poucos segundos.
Mato Grosso do Sul é terra de terremotos, especialmente na região do Pantanal. Não são raros os relatos de moradores de cidades como Corumbá, Coxim e Miranda que já sentiram a terra tremer.
O Estado registra abalos de terra há pelo menos mais de um século. O primeiro documentado em Mato Grosso do Sul é 1906, na região de Corumbá, de magnitude 4.9.
A dissertação também aponta o sismo de 1906 como o sétimo mais antigo da região Centro-Oeste. O primeiro registro é de 1832, onde atualmente está Rondônia, mas que na época pertencia ao Mato Grosso.
A mestre em geografia Lucimara da Silva, em entrevista ao Midiamax, explicou que antes de equipamentos tecnológicos e uso da escala Richter, os abalos de terra eram medidos de acordo com os danos causados seguindo a escala Mercali Modificada.
“Eram registros históricos, provenientes de várias fontes, como jornais, ou até mesmo relatos de pessoas, de viajantes”, ela afirma.
Os fatores da escala Mercali Modificada variam de 1 a 12, indo de imperceptível a até cataclismo. Essa última intensidade previa grandes massas rochosas deslocadas, conformação topográfica distorcida e objetos atirados ao ar, contudo jamais foi registrada na série histórica.
“Foi tudo muito rápido”
Um dos maiores e mais recentes tremores de terra em Mato Grosso do Sul foi registrado em Coxim, em 2009, de magnitude 4.8 graus na Escala Ritcher.
O autônomo Derciney Freitas recorda que estava em uma fazenda próxima a Alcinópolis quando ouviu um forte barulho e sentiu a terra tremer. Na hora ele pensou que o evento pudesse estar relacionado a dinamites nas rochas por causa da construção de uma rodovia.
“Eu nunca ouvi e vi aquele barulho, foi tudo muito rápido. Foram poucos segundos, entre 3 a 5, mas não quebrou nada não, só o barulho do barracão mesmo”, recorda o homem.
Já Andressa Martins da Silva, atualmente com 27 anos, morava na época em uma fazenda entre Rio Verde de Mato Grosso e Coxim, e se recorda que era começo da noite quando o chão tremeu. Diferente de Derciney, a experiência da família de Andressa foi mais intensa.
A mulher, que tinha 14 anos na época, relembra que primeiro sentiram o chão tremer por alguns segundos e imaginaram que um curral de cavalos havia arrebentado. A sensação parou em poucos segundos, mas retornou logo em seguida.
“Começou fraco e aumentou o tremor, um barulho muito alto como o de um rolo que se passa em asfalto. Você sente a terra tremer e é surpreendente. Nossa mesa da cozinha e janelas fizeram um barulho muito alto por conta do tremor e o medo se instalou em todos, saímos todos correndo de dentro de casa. Quando passou ficou todo aquele medo de voltar a tremer de novo”, ela se recorda.
Terremoto x abalo sísmico
Os terremotos e abalos sísmicos se diferenciam na intensidade do abalo de terra, conforme explica a pós-doutora em Geociências e coordenadora do laboratório de sismologia da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Edna Faccincani.
“Quando nós temos uma magnitude não tão elevada, como acontece aqui no Mato Grosso do Sul, que é em torno de até 5.4, dentro da dos estudos sismológicos é melhor chamá-los de abalos sísmicos. Enquanto abalos com maior destruição e intensidade, como recentemente na Síria e na Turquia, que foi acima de 7, nós denominamos de terremotos”, explica Edna.
O barulho e movimento da terra descritos por Derciney, em Coxim, são as ondas P e S, respectivamente. Quando ocorre um abalo sísmico, a onda P, de som, chega antes da onda S, que representa o movimento do solo e é responsável pelos danos na superfície.
Por que MS pode ter abalos de terra?
A professora Edna explica que os abalos sísmicos estão muito presentes dentro da bacia sedimentar do Pantanal porque ela é mais recente no tempo geológico e é uma bacia ativa.
Isso significa que a bacia está em formação, se estruturando, o que favorece a frequência de abalos sísmicos.
“Esse é um dos motivos pelo qual hoje se tem uma rede de estações sismográficas dentro da bacia do Pantanal e, em função disso, a UFMS juntamente com o Instituto de geofísica da USP temos um projeto antigo que se estende desde 2003 até o presente”, conta a professora.
Contudo, esse é só um dos fatores que explicam o motivo de Mato Grosso do Sul ter abalos de terra, mesmo localizado fora de uma borda de placa tectônica.
Além da idade da bacia sedimentar do Pantanal, outros fatores ligados a esses tremores é a espessura fina da crosta por baixo da bacia do Pantanal e que parte do Estado está no Lineamento Transbrasiliano.
“Esse lineamento são blocos de paleocontinentes que se colidiram no Pré-Cambriano. Onde tem essa zona de soltura ela continua ali. A placa sul-americana está em processo de compressão, então esse movimento vai ocorrer onde tenha essas descontinuidades de eras geológicas mais antigas. A origem da Bacia do Pantanal está muito associada ao Lineamento Transbrasiliano e não só com o Segmento dos Andes”, explica a professora.
Tremores de terra afetam paisagem do Pantanal
Além disso, os sismos tendem a modificar a paisagem do Pantanal, conforme explica o mestre em Geografia pela UFMS e professor do Instituto Federal de Mato Grosso do Sul, campus Aquidauana, Stone Marisco Duarte.
O mestre em geografia, que também teve como tema da dissertação os abalos sísmicos da região Centro-Oeste, mas com foco na década de 1982 até 2020, explica que a Bacia Sedimentar do Pantanal é uma região muito pouco estudada.
“Os sedimentos depositados em suas superfícies alagáveis são conduzidos por fluxos de água muito instáveis, com cursos que obviamente sofrem as interferências destes sismos. Não se pode efetivamente dizer em danos, mas mudanças, que condicionam as espécies a se adaptarem a novas situações de habitat”, ele explica.
Entre as conclusões da pesquisa no mestrado de Stone está que a região do Megaleque do Taquari, na Bacia Sedimentar do Pantanal, é considerada como propensa a atividades sísmicas e uma das mais ativas do país.
Registros de levantamentos históricos e dados obtidos pelas estações sismográficas confirmam essa constatação sobre a região.
Estações
Mato Grosso do Sul tem mais de 30 estações sismográficas que contam com painel solar, sismógrafo e um computador acoplado a uma instalação. Algumas são permanentes, como a de Aquidauana, mas outras são temporárias e são deslocadas para outras regiões.
Essas estações geralmente são instaladas fora do perímetro urbano e longe de rodovias para que o barulho e tremores de veículos não interfira na análise.
As estações começaram a chegar em Mato Grosso do Sul a partir de 2003. Antes disso, essas ferramentas eram espalhadas pelo território brasileiro e quem analisava as informações eram instituições em São Paulo, Brasília e no Rio de Janeiro.
“A maior parte dos abalos sísmicos são dentro da bacia do Pantanal, mas podem ocorrer em outras áreas de Mato Grosso do Sul. Por isso, há a preocupação de se colocar mais estações e fazer um monitoramento desses abalos, porque infelizmente pela tecnologia que temos hoje não dá para prever os terremotos”, explica a docente da UFMS.
Edna reforça que, dentro dos estudos da sismologia, é possível saber onde os abalos são mais frequentes, qual a profundidade e a magnitude. Contudo, é quase impossível descobrir se um lugar terá um terremoto hoje ou daqui a um ano.
Campo Grande pode ter terremotos?
Afinal, Campo Grande pode ter terremotos? Pela descrição que abriu esta matéria, a impressão é que até poderia, mas a verdade é que teoricamente não.
Abalos como os de 1964 e de 2009, por exemplo, têm como epicentro a Bacia Sedimentar do Pantanal, mas o que pode acontecer é Campo Grande ser impactada pela propagação das ondas, principalmente a S de movimento do solo. Quem mora em prédios têm mais chances de sentir o abalo.
“Essa propagação de ondas chegam em regiões como a cidade, como a capital Campo Grande. Existem até algumas reportagens da época de moradores que relataram que eles sentiram esses abalos sísmicos, principalmente quem mora em andares mais elevados em prédios”, explica a professora.
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