Em 2022, 1.979 mulheres que decidiram não ter mais filhos e fizeram cirurgia de laqueadura em Mato Grosso do Sul. Nesta semana, o procedimento de esterilização feminino foi um dos assuntos mais comentados no País desde que passou a vigorar lei que flexibilizou o acesso ao método.

Além da redução da idade mínima, uma das mudanças mais comemoradas é o fim da exigência de que maridos autorizem as esposas a fazer a laqueadura. Com as alterações, a expectativa é de que a quantidade seja ainda mais expressiva a partir de agora.

Professora da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), a ginecologista Maria Auxiliadora Budid explica que a laqueadura é um procedimento simples e pode ser feita de três maneiras: pela abertura abdominal, por videolaparoscopia, quando uma micro câmera é inserida pelo umbigo e auxilia o cirurgião, ou logo depois o parto. Nas três maneiras, o método é basicamente o mesmo e consiste na retirada das trompas. 

“A trompa é o que liga o útero ao ovário e é naquele pedaço de tecido que o óvulo passa para ter o encontro com espermatozoide. Dizemos que a trompa é a ponte, o canal de ligação que leva o óvulo e os esperma para se encontrar e depois aquele pequeno embrião chega ao útero”, pontua.

Conforme registros do Ministério da Saúde, a primeira laqueadura feita no Brasil aconteceu em 1930 e mesmo após todas essas décadas, a intervenção ainda é rodeada de mitos e estigmas. “Dizem que a mulher fica fria e sem vontade sexual, mas isso não existe, até porque a trompa não produz hormônio, quem faz isso é é o ovário. Também fala-se em mutilação, o que é outra mentira”, confirma a médica. 

Quando fazer?

O momento de decidir não ter mais filhos e optar pela laqueadura sempre foi principal pauta de discussão sobre o tema, afinal, depois de feita, a cirurgia é irreversível na maioria dos casos.

“Existem cirurgias plásticas para a trompa voltar, mas não tem cobertura pelo SUS e os resultados não são os mesmos, a trompa não fica igual. Temos uma gama de métodos que são reversíveis, contraceptivos, hormonais  ou não”, aponta Maria Budib. 

Por isso, segundo a ginecologista, a principal orientação é avaliar o tema sempre com o maior cuidado. 

“Uma das obrigatoriedades da Lei é o período de 60 dias entre a intenção e a realização do ato. Isso acontece justamente para que a paciente reflita e tenha consciência da irreversibilidade , não é para obstruir o direito direito sobre o corpo ou decisão, é o período em que a paciente recebe acolhimento, informação e as ferramentas para que tome a decisão segura do que está fazendo”, finaliza a ginecologista. 

Cirurgias em MS

Conforme dados da SES (Secretaria Estadual de Saúde), 1.979 sul-mato-grossenses fizeram laqueadura no Estado, do total, 322 procedimentos foram realizados em Campo Grande, no Hospital Regional e na Maternidade Cândido Mariano.

Do total de cirurgias feitas, 873 foram agendadas e outras 1.105 realizadas logo após o parto. 

Já entre a quando o assunto é esterilização masculina, os números caem quase pela metade e, durante o ano passado, 678 fizeram a vasectomia.

Novas regras

Conforme o texto, sancionado pelo presidente na última quinta-feira (2), cai de 25 para 21 anos a idade mínima, em homens e mulheres, para passar pelo procedimento de esterilização, no entanto, a idade não é levada em consideração para quem já tenha ao menos dois filhos vivos. 

Além disso, foi revogado dispositivos da Lei que exigia o consentimento expresso de ambos os cônjuges para que ocorra a esterilização.

A lei mantém o prazo mínimo de 60 dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico. Nesse tempo, a pessoa poderá acessar o serviço de regulação da fecundidade, com o acompanhamento de uma equipe multidisciplinar, para possibilitar ao paciente uma possível desistência do procedimento. Por outro lado, a proposição inova ao permitir à mulher a esterilização cirúrgica durante o período de parto.

Entre elas, as medidas são motivo para comemorar, será por quem está na fila para fazer, seja por quem já fez no passado e agora nota os avanços. “Eu já tinha decidido que eu ia fazer a laqueadura, não queria. É bonito ter filho, ter bebê, mas quem sofre é a mulher, quem cuida é a mulher”, comenta a recepcionista Elenir Paixão de Matos Dias, 57 anos, que fez o procedimento logo após o nascimento do segundo filho.

Na época, há 25 anos, as normas era diferentes das que se seguiram pelas duas décadas seguintes. “Eu queria só dois filhos e pra mim foi a melhor coisa que fiz. De lá para cá ficou muito mais difícil, forçam a mulher o máximo que podem. Vejo que hoje as coisas estão mudando e acho que esse é o caminho”, detalha.