Carandiru: indenização para famílias pode resolver 30 anos de ocupação em residencial
Residencial na Mata do Jacinto que foi alvo de operação policial é ocupado irregularmente por dezenas de famílias
Thalya Godoy –
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A saga de quase 30 anos envolvendo a ocupação do Residencial Atenas, conhecido como Carandiru, no bairro Mata do Jacinto, pode ter um desfecho em breve caso tenha sucesso uma proposta apresentada durante uma audiência entre as partes, em julho deste ano.
O residencial foi alvo da Operação Abre-te Sésamo no dia 6 de junho deste ano, em que foram cumpridos 46 mandados de busca e apreensão por mais de 200 policiais civis e militares. No episódio, foram apreendidos dinheiro e armas.
No processo de reintegração de posse, movido pela Construtora Degrau LTDA – ME, consta que foi realizada uma audiência no dia 10 de julho na 16ª Vara Cível de Campo Grande. A empresa é responsável pelas obras inacabadas do residencial que foi ocupado em 1994.
No dia, compareceram representantes da construtora, dos ocupantes do residencial, da Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul e do Ministério Público de Mato Grosso do Sul. A audiência foi presidida pelo juiz de direito Alessandro Carlo Meliso Rodrigues.
No encontro, as duas partes puderam expor os motivos para o conflito que já dura décadas. Foi questionado à empresa sobre a possibilidade de indenizar os moradores não mutuários que ocupam a área de reintegração de posse.
“A fim de amenizar a questão social de garantia à moradia, bem como, foi questionado ao próprio representante dos requeridos se essa solução teria anuência dos demais moradores do local”, diz no termo de audiência.
O representante da Construtora Degrau LTDA – ME afirmou que seria possível uma solução nesse sentido mediante um prazo para a captação dos recursos que seriam usados para a indenização.
Ele também externou que a medida seria possível caso tenha garantia que todos os requeridos deixem o local voluntariamente após o prazo estabelecido pelo juízo. No termo não é apresentado qual seria o valor dessa indenização.
Consta que a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul se comprometeu a apresentar a proposta aos demais moradores irregulares.
Também ficou previsto para a DPE-MS (Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul) entrar em contato com o Poder Público Municipal para questionar a possibilidade de cessão de área pública para acomodação das famílias que moram no local de forma irregular.
Além disso, o juiz também deferiu a expedição de ofício à SAS (Secretaria de Assistência Social) para apresentar um relatório oficial sobre a operação “Abre-te Sésamo”.
Indenização
A indenização da Construtora Degrau LTDA – ME aos ocupantes dos blocos semiacabados do residencial pode dar fim a uma disputa que dura quase 30 anos.
Consta no processo de reintegração de posse movido desde 2013 pela empresa que são três blocos de apartamentos, cada um com 16 unidades habitacionais.
Destes, apenas um foi concluído e entregue aos proprietários, que se mudaram para lá. Um bloco foi deixado semiacabado e o último apenas nos alicerces.
São esses dois blocos que estão ocupados de forma irregular desde 1994, quando a empresa faliu e paralisou as obras devido à falta de recursos.
De acordo com a advogada que representa a construtora, Hilda Araújo, as partes ainda aguardam o levantamento da Defensoria Pública sobre a quantidade de pessoas que realmente vivem no residencial para que a empresa possa estimar o valor da indenização.
Diante deste cenário, a advogada explica que ainda não é possível falar da quantia que cada morador pode receber, mas antecipa que o valor não será equivalente para compra de residência.
“A empresa não irá dar casa e nem imóvel. O que a empresa vai fazer será para ajudar eles [ocupantes] a recomeçarem a vida e dar o suporte para que eles não fiquem na rua”, ela afirma.
A advogada ainda pontua que a proposta de acordo é uma forma encontrada para que o imbróglio não se arraste por mais uma década. Ela espera que até o fim de setembro todas as partes (Defensoria, MP, empresa e ocupantes) cheguem “a um denominador comum”.
O que será feito com a infraestrutura?
Hilda conta que a empresa ainda não tem planos sobre o que fazer com os apartamentos que serão desocupados porque antes precisam ter acesso ao condomínio para avaliar a situação da infraestrutura.
“Não se sabe o que vai ser feito porque a empresa e os engenheiros precisam que entrem e avaliem. Vamos tomar as decisões em cima do que os engenheiros apontarem. A gente não consegue saber o estado real da estrutura hoje em dia, mas o termo de interdição do Corpo de Bombeiros Militar de Mato Grosso do Sul continua”, ela ressalta.
O auto de interdição da edificação em que apontava problemas na infraestrutura foi lavrado no dia da operação, em 6 de junho.
Diante disso, a empresa quer resolver o mais breve possível a desocupação devido a esses problemas de infraestrutura que oferecem risco à vida e pelas 40 famílias que compraram os apartamentos, mas que vivem na insegurança, barulho e mau cheiro de fossa irregular.
“A nossa briga judicial acontece mais por conta dos clientes que estão nos imóveis quitados, mas não conseguem concluir o condomínio por causa da invasão devido à documentação […] a gente sabe que tem pessoas boas ali [entre os ocupantes] e o que a gente quer é que a situação se resolva”, conclui Hilda.
Campo Grande tem 2 mil famílias em ocupações
De acordo com o diretor-adjunto da Emha (Agência Municipal de Habitação e Assuntos Fundiários), Cláudio Marques, Campo Grande tem cerca de duas mil famílias que estão em processo de regularização fundiária.
A maioria vive em áreas públicas, mas também há ocupações em terrenos particulares, como é o caso do Carandiru, no bairro Mata do Jacinto.
A Defensoria Pública encaminhou o ofício para a Emha no dia 18 de agosto solicitando a inclusão em programas habitacionais de imediato ou curto prazo.
O representante da Emha explica que a pasta está focada atualmente em ocupações em áreas públicas, mas que serão feitos estudos sobre a viabilidade de incluir essas famílias em alguma política habitacional.
“Como é uma área particular, a responsabilidade de resolver o imbróglio é da proprietária da área, mas com a demanda vamos fazer o estudo de análise […] eles não podem passar na frente de outros, mas temos a sensibilidade de buscar essas famílias para ajudar e colocar no cronograma”, ressalta Cláudio Marques.
A DPE-MS encaminhou para a Emha uma lista de ocupantes com 39 famílias, totalizando 111 pessoas. Contudo, o diretor-adjunto afirma que mais da metade dessas famílias não são cadastradas na Emha.
“Vamos dar andamento na solicitação dentro do nosso cronograma, não tem como estipular prazo, mas vamos tentar até o mês de outubro responder a Defensoria e as famílias que aguardam moradia”, prometeu.
Foi solicitada uma entrevista com um representante da Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul. Em resposta, a coordenadora do Núcleo de Fazenda Pública, defensora pública Regina Celia Rodrigues Magro, relatou que prefere aguardar o andamento da ação para conceder uma entrevista e que, por enquanto, não há novidades no processo do residencial Carandiru. O espaço continua aberto para futuras manifestações.
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