Em 1971 era instalada o primeiro Fórum do Tribunal de Justiça de Glória de Dourados, a 281 quilômetros de Campo Grande. Naquele mesmo ano, enquanto trabalhava como servente de pedreiro na cidade, Sebastião Ferreira de Araújo, – atualmente com 84 anos – ouviu em um carro de som o anúncio para o concurso público e teve a vida transformada.

A história do servidor, atualmente aposentado, foi contada pelo Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul. Na época, Sebastião tinha 33 anos e assim que ouviu o anúncio, pensou em mudar de vida. Correu para o local de inscrição.

Era exigido ensino primário completo, o que ele não tinha, depois de ter parado de estudar. Depois de se inscrever, foi até uma escola para se matricular no curso de ginásio. O processo de seleção demorou um ano, tempo suficiente para que ele se formasse e fosse aprovado no cargo de porteiro dos auditórios do Fórum, com adicional de depositário de bens e avaliador judicial.

“Eu continuei a estudar mesmo depois de entrar no concurso. Uns três anos depois, houve uma vaga no cartório distribuidor. A menina que era do distribuidor foi para outra cidade e o Juiz, na época, o Dr. Nildo de Carvalho, falou para mim que precisava de alguém que assumisse o cartório e que me enxergava para ocupar o lugar”.

Sebastião até disse ao juiz que não tinha conhecimento em processos, mas conseguiu um pelo professor. “Ele disse que ninguém nascia sabendo de nada. Mandou eu pegar uma caneta e papel, sentar do lado da menina que ia sair e aprender tudo que eu pudesse. Foi assim que eu passei a ser distribuidor, contador e partidor”, conta.

Sebastião construiu galpão para guardar bens

Foram seis anos na função até a estrutura organizacional do Tribunal mudar e o servidor voltar a trabalhar apenas como avaliador e depositário de bens, ofício inclusive que Sebastião sempre exerceu com muito apreço.

“Naquela época os bens penhorados não ficavam com o próprio devedor e o fórum não tinha um lugar seguro para deixar as coisas. Elas ficavam comigo mesmo. Então, com muito sacrifício, eu comprei um terreno ao lado da minha casa, construí um barracão de madeira e comecei a deixar ali todos os bens de penhora confiados a mim. Usei esse barracão até me aposentar. Só um pouco antes disso que eu procurei a Prefeitura e consegui um lugar para deixar tudo que ainda estava comigo. Fiz uma relação desses bens para o juiz da época e só então me aposentei”.

Aos chegar nos 60, as condições da velhice passaram a ‘bater na porta’, então, em 1995 ele decidiu vender todos os seus bens em Glória de Dourados e mudar-se com a esposa para Campo Grande.
“Eu vim do Nordeste para Glória de Dourados com apenas 20 anos. Aos 21 já casei e fiz a minha vida inteira aqui no Estado. Tive cinco filhos. O mais novo mora em Dourados e tem 55 anos, já o mais velho tem 62 anos, calcula!”, conta rindo.

“Sou muito grato ao Tribunal de Justiça porque foi o meu trabalho que proporcionou tudo isso. Hoje tenho 84 anos e moro com uma filha. Minha mulher faleceu já tem 12 anos. Faço hidroginástica quatro vezes na semana e também fazia pilates antes. De vez em quando vou no baile do Vovó Ziza dar uma dançadinha. Estou aproveitando a vida”.