Na comunidade Varandas do Campo, antiga favela da Homex, a empregada doméstica Keila de Jesus se preparava para fazer o almoço quando notou alguém se aproximar no portão. Do outro lado, visita que se tornou comum na casa dos brasileiros nos últimos meses, desde que recenseadores do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas) passaram a percorrer todas as regiões do País para entrevistas do censo demográfico. 

“Nosso líder comunitário mandou no grupo de WhatsApp que hoje viriam fazer esse trabalho aqui e incentivou a gente a receber o pessoal. É algo necessário”, comenta.

Na comunidade carente, que abriga cerca de 5 mil pessoas, o censo demográfico é esperança de que melhorias cheguem à área, hoje, afetada por necessidades básicas, como acesso à luz e saneamento básico, por exemplo.

Com a análise do IBGE, prefeituras, estados e o Governo Federal terão mapeamento da realidade do País, que servirá de norte para aplicação de recursos, especialmente em locais onde a pobreza e falta de oportunidade aumentam a dependência do poder público.

Dificuldade faz parte da rotina

“Aqui a gente enfrenta muita dificuldade. Na minha casa toda vez que chove cai a rede de energia. Também precisamos de posto de saúde mais perto, escolas. Tudo isso são coisas que melhorariam nossa vida”, acrescenta a empregada doméstica. 

Recenseadores durante mutirão em comunidade. (Foto: Karina Campos)

Morador “das antigas”, Evaldo Vieira Marques afirma que, em seis anos, já notou avanços pontuais na comunidade em que vive, como, por exemplo, a substituição de barracos por imóveis de madeira e de alvenaria. “Tudo esforço de cada morador”, esclarece. 

No entanto, o vendedor vislumbra um futuro ainda melhor para ele e as centenas de família que convivem no espaço e compartilham sonhos e dificuldades.

“O censo demográfico passa uma visão para os gestores, isso mostra o que eles devem fazer e assim a vida da gente melhora. O bairro não está como queremos, mas espero que melhore”, relata. 

Na casa de Evaldo, o questionário feito pelo recenseador durou menos de cinco minutos. “Quando eles chegarem, atendam, convidem para entrar, ofereçam uma água. Eles são trabalhadores e vão nos ajudar a mudar nossa realidade”, aconselha.

Equipe na comunidade Varandas do Campo. (Foto: Karina Campos)

Líder comunitário da região, Lindomar Rodrigues, o Léo da Homex, afirma que, no início, os próprios moradores faziam o mapeamento populacional da comunidade.

Assim que chegavam para montar os barracos, as famílias deixavam, nome, telefone e número de documento. Com o passar do tempo, a função passou a ser feita por agentes de saúde. 

Veterano no local, ele lembra que a comunidade começou em meio a polêmicas e muita confusão. “Nossa história nasceu conturbada e com muita confusão, por causa disso, mudamos até o nome para Varandas do Campo e seguimos procurando melhorar nosso cenário”, comenta. 

Com planos de que a comunidade vire um bairro, Léo enumera melhorias que a região precisa e que podem ser notadas com o rastreamento feito pelo IBGE. “Nossa fonte de energia elétrica, por exemplo, é muito distante e quando chega nas casas é fraca. Em um ponto de 120 watts, só 80 chegam para o morador e isso não liga uma geladeira”, pontua. 

Mutirão do Censo

Durante toda a sexta-feira (28), pesquisadores do IBGE estarão na área da antiga Homex fazendo varredura dos moradores que vivem na região. “Aqui existe uma parcela da população que depende de melhorias de saneamento básico, água, luz. São balanços necessários para melhoria de qualquer região”, explica Silvia Saad Martins, coordenadora do Censo em Campo Grande. 

Segundo ela, a Capital conta com 26 comunidades, hoje, 60 pessoas entre recenseadores, coordenadores e outros servidores estarão nas ruas. “Serão dias intensos para que a pesquisa seja concluída até 2 de dezembro, prazo final que já foi prorrogado”, pontua. 

Conforme a coordenadora, nas comunidades a maior dificuldade é a distância, já que as áreas são afastadas, no entanto, no quesito receptividade não há o que reclamar. “Somos muito bem recebidos”, explica. 

O mutirão segue até às 17h de hoje e será feito novamente na próxima semana. 

Residencial Homex

Em 2013, a empresa mexicana abandonou a obra de construção das moradias que começou a ser erguida em 2011. Na época, a Homex informou que estava passando por dificuldades financeiras. O empreendimento contava com dez blocos residenciais, no entanto, apenas seis foram entregues. Com a falência da construtora, o restante da documentação não foi concluída, deixando muitas famílias no prejuízo. 

Antes composto basicamente pelo mato e por ruínas das inacabadas obras da Homex, o cenário foi tomado por pedaços de madeiras, telhas e lonas usadas no alicerce dos barracos que, ao longo dos últimos quatro anos, se modernizam e crescem com construções avançadas no local.

O perfil da maioria que mora ali é quase o mesmo: pessoas que viviam de aluguel e enfrentavam sérias dificuldades para conseguir se manter convivendo com duras condições de miséria.