Da má notícia ao apelo para família, saiba quem são os profissionais no processo de doação de órgãos em Campo Grande

São eles que acolhem a família do possível doador, independente da autorização ou recusa da doação

Ouvir Notícia Pausar Notícia
Compartilhar
Doação só pode ser realizada mediante autorização da família
Doação só pode ser realizada mediante autorização da família

Nesta semana foi enterrada em Campo Grande a piloto de motos e influenciadora digital, Juliana dos Santos Machado, que faleceu após cair de um carro em movimento. Como a causa do óbito foi morte cerebral, os órgãos de Juliana puderam ser doados com a autorização da família. O protocolo de morte encefálica envolve diversas etapas, exames e profissionais, entre eles enfermeiros e médicos, que acolhem os familiares desde o início da suspeita de ME (morte encefálica).

Segundo estudo de pesquisadores da Escola Paulista de Enfermagem da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), realizado em 2010, o principal motivo para a recusa dos familiares em autorizar a doação é a falta de compreensão do conceito de morte encefálica, seguido de crenças religiosas e falha da equipe hospitalar na comunicação da morte. Por essa razão, é fundamental que as unidades hospitalares tenham profissionais capacitados para conduzir essa situação.

[Colocar ALT]
Treinamentos de profissionais vão além das cirurgias de transplante. Foto: Henrique Arakaki

Esse é o papel dos integrantes das CIHDOTTs (Comissão Intra-hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplantes). A Capital conta com cinco CIHDOTTs, que atuam em parceria com a CET (Central Estadual de Transplantes) e a OPO (Organização de Procura de Órgãos) do Estado. É a equipe que comunica a morte encefálica e explica o processo de doação de órgãos. Cada vez mais, esses profissionais são treinados para realizar a abordagem de maneira humanizada, respeitando o momento delicado pelo qual passam aqueles que perderam uma pessoa próxima.

Acolhimento familiar

A OPO de Mato Grosso do Sul é sediada na Santa Casa de Campo Grande, hospital que somente nos seis primeiros meses deste ano realizou 18 captações, sendo 25 rins, 8 fígados e 3 corações. A enfermeira da OPO, Paolla Costa Buhler Cabrera Cavalcanti, ressalta a importância do vínculo entre profissionais e familiares. “Através do acolhimento familiar criamos um vínculo afetivo e de respeito com as famílias, assim independente da resposta da família sobre a doação, estamos aqui sempre para apoiar sua decisão sendo positivas ou negativas, pois entendemos quanto frágil essa família está”, comenta.

O coordenador da CIHDOTT do Humap (Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian), Guilherme Henrique de Paiva Fernandes, ressalta que o acolhimento da família é um fator determinante na decisão do familiar de autorizar ou não a doação. “Se ele não se sente acolhido nesse momento de perda de um ente querido é muito improvável que aceite a doação, pois vai se sentir inseguro sobre o processo”, afirma Guilherme. 

Contudo, o coordenador ressalta que o objetivo da CIHDOTT vai além da autorização para doação de órgãos. “É claro que no final do processo queremos efetivar a doação para salvar outras vidas, mas o acolhimento do familiar também faz parte da nossa atuação, dar todo suporte possível no momento da perda e sanar todas as dúvidas que porventura ficaram sobre a morte encefálica e o processo de doação”, explica.

Equipe multidisciplinar

Além de enfermeiros e médicos, há a participação de psicólogos durante o acolhimento da família. O enfermeiro da CIHDOTT do Hospital Regional de Campo Grande, Douglas Herrera Nabuco, ressalta a participação da equipe multidisciplinar. “Durante todo o processo, desde a tratativa da hipótese do diagnóstico de morte encefálica até o processo de doação de órgão, com recusa ou não, a gente tem o acompanhamento da equipe de psicologia hospitalar aqui dentro do hospital”, afirma.

[Colocar ALT]
Diversos profissionais estão envolvidos no processo de doação. Foto: Henrique Arakaki

Os profissionais que integram as CIHDOTTs passam regularmente por treinamentos fornecidos pela CET. “Aborda assuntos como o processo de doação de órgãos, o diagnóstico de morte encefálica e a comunicação de má notícia”, conta o coordenador da CIHDOTT do Humap. Porém, nem os treinamentos são capazes de blindar os profissionais de determinadas ocasiões. “Em algumas vezes, mesmo tendo todo esse preparo, a gente se depara com situações que às vezes a gente se vê como pai, se vê como mãe, como irmão”, pontua o enfermeiro Douglas.

A partir da autorização da família, são realizados exames de sorologia para verificar se não há patologias que impeçam a doação como, doenças de chagas e doenças sexualmente transmissíveis. Posteriormente, é feita a compatibilidade com os possíveis receptores, para que, então, a equipe de captação, seja ela de Mato Grosso do Sul ou vinda de outro Estado, possa coletar os órgãos a serem doados. “Agenda-se horário, agenda-se o Centro Cirúrgico para aquele horário, já se pensando no voo de volta [em caso de captadores de outro Estado], pois eles têm que retirar e tem um tempo que esse órgão vai ficar resfriado em uma solução preservadora e gelo”, explica o enfermeiro da CIHDOTT do Hospital Regional. “É um processo complexo, grande, porque enquanto a equipe está retirando aqui, a outra porcentagem da equipe está preparando o doente para receber o órgão”, completa.

No Brasil, a doação de órgãos só pode ser realizada com a autorização da família do possível doador. Por isso, é importante comunicar aos entes próximos sobre o desejo de ser um doador e, assim, ajudar a salvar outras vidas.

 

Conteúdos relacionados