Após perder o marido no dia no aniversário da filha, Roseane também viu a prima falecer por Covid-19
Saudade, angústia, desconsolo e tristeza. Estes são alguns sentimentos que famílias de Mato Grosso do Sul possuem pelas perdas da Covid-19. Roseane Fuzeta conhece este e muitos outros pesares causados pelo falecimento de entes queridos. No dia em que a filha caçula fazia aniversário, a mulher de 52 anos se despediu do marido, vítima do […]
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Saudade, angústia, desconsolo e tristeza. Estes são alguns sentimentos que famílias de Mato Grosso do Sul possuem pelas perdas da Covid-19. Roseane Fuzeta conhece este e muitos outros pesares causados pelo falecimento de entes queridos. No dia em que a filha caçula fazia aniversário, a mulher de 52 anos se despediu do marido, vítima do coronavírus. Após 15 dias, ela perdeu uma das primas mais próximas, também por causa da doença.
Ao Jornal Midiamax, ela lembra que a família foi diagnosticada com Covid-19 em 16 de dezembro de 2020. Antes mesmo de serem confirmados os casos, eles se isolaram e deixavam de fazer até mesmo compras. “As pessoas deixaram as coisas no portão e a gente pegava quando saiam”.
Mas foi quando o marido dela começou a piorar da doença que a infelicidade começou. Em 17 de dezembro, ele foi levado para a Unimed. No hospital, ela lembra que ficaram horas, mas ele acabou sendo liberado. No entanto, em menos de 24h, o homem começou a sentir muita falta de ar e precisou voltar para a unidade hospitalar.
“Não tinham feito tomografia nele e exigi neste dia, para ver o grau de comprometimento dos pulmões. Então naquele momento ele já foi internado e seguiu usando oxigênio”, relata com tristeza.
Lotação nas UTIs
Em 21 de dezembro, Campo Grande passava por superlotação de 111% nas UTIs, de acordo com a SES (Secretaria de Estado de Saúde). Neste dia, Roseane recebeu uma ligação: “eles me deixaram ciente que ele precisava de UTI, mas não tinha vaga”.
O hospital garantiu que tentaria transferir o paciente. “E por graça de Deus, às 14h do dia 21, conseguiram vaga no Regional”. Mesmo infectada, Roseane não pôde acompanhar o marido na ambulância e seguiu o veículo de carro até o HRMS.
Em 24 de dezembro, véspera de Natal, a mulher recebeu uma nova ligação, avisando que o esposo havia sido entubado. “Falaram que não tinha mais o que fazer, porque ele já estava com 90% dos pulmões comprometidos”.
Assim, a data que é lembrada por reuniões de família, tornou-se um cenário de tristeza para Rose e as filhas. “Dia 24, enquanto todo mundo estava comemorando, eu e minhas filhas estávamos sentadas no quarto, com tudo fechado e chorando”. Com a voz trêmula e segurando o choro, ela lembra que fizeram de tudo para não ouvir os fogos e barulhos de aglomerações.
Último adeus
“Em 31 de dezembro, me ligaram do hospital, acho até que ele estava bem pior, pois, permitiram que eu visse ele”. Roseane lembra que a paciência e cuidado dos profissionais de Saúde era notável no acompanhamento do marido. Assim, ela diz que foi vestida com todos os EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) e liberada para ver o marido.
Em poucos instantes ela viu não só a dolorosa situação do próprio esposo, mas também a de várias outras pessoas. “Foi a pior cena que já vi na minha vida, muita gente entubada”.
Esta foi uma das vezes que Roseane se despediu do marido. Pois, depois do dia em que levou ele ao hospital, ela diz que “nunca mais vi ele vivo e com consciência”.
Então, em 5 de janeiro, às seis da manhã, Roseane acordou pronta para parabenizar a filha, que completava 21 anos naquele dia. No entanto, recebeu a notícia de que o marido havia falecido. Sem chão, ela ainda escutou o relatório médico, que apontou 100% de comprometimento dos pulmões e diversas infecções pelos órgãos do homem de 55 anos.
Foi neste momento da entrevista que Roseane não aguentou a dor e começou a chorar. O peso da perda é tão vívido quanto no dia, com voz trêmula e entre soluços do choro, ela continuou a história. “Ele saiu da minha casa andando para nunca mais voltar”, lamenta.
Sequelas da morte e infecção
Assim, quinze dias depois a mulher perdeu uma prima próxima de 46 anos. Ela conta que a falecida era uma pessoa saudável, não tinha comorbidades e praticava esportes. “Pode acontecer com qualquer um”, lembra com tristeza.
Enquanto passava por tudo isso, Roseane também lutava contra a Covid-19. Infectada na mesma época que o esposo, ela não teve sintomas. Entretanto, quando ele foi internado, ela que já estava na menopausa, passou a ter hemorragia grave.
A mulher chegou a ficar dois dias internada em uma UPA (Unidade de Pronto Atendimento) em Campo Grande. Já recuperada da doença, ela ainda passa por sequelas que a Covid-19 deixou. “Me aconselharam a ter acompanhamento psicológico e hormonal. Meu fígado tive que operar. Então agora me trato com três especialistas e vou para o quarto, pois, estou com uma queda de cabelo absurdo”.
Já as filhas sentem cansaço físico e foram marcadas para sempre com a perda do pai. A mais nova, que completava 21 anos no dia do falecimento, disse que não vai mais comemorar. “Minha filha enterrou o pai dela no dia do aniversário dela”, lamentou ainda abalada.
Rotina de sofrimento
Agora, a família das três mulheres tenta se adaptar a nova rotina. Para Roseane é ainda mais difícil, porque passou 37 anos ao lado do marido. “É muito difícil, só quem viveu sabe. Fico muito triste quando vejo comentários de pessoas que não acreditam na doença e situação caótica em que estamos”.
Mesmo curada, Roseane se cuida o dobro e evita saídas desnecessárias. Assim, ela destaca tem uma mãe de 93 anos. “Morro de medo, não é fácil se cuidar e ver tudo isso de gente ignorando”. Por fim, ela pede que a população respeite pelo menos os profissionais de Saúde, “não é fácil ver famílias perderem pessoas toda hora e chorarem na frente deles”.
Empatia, esta é a chave para uma melhora no cenário crítico, diz a mulher. “Aniversário para mim não existe mais, festas não tem mais para a gente”, disse Roseane quando se render às lágrimas novamente.
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