Viciados em remédio? Campo Grande tem mais que o triplo de farmácias do que OMS recomenda
A impressão de quem passa pelas ruas de Campo Grande é de que tem uma farmácia em cada esquina. E bem, é quase isso mesmo. Porque de acordo com dados recentes do CRF-MS (Conselho Regional de Farmácia), a quantidade de estabelecimentos farmacêuticos na Capital é 231% maior que o recomendado pela OMS (Organização Mundial da […]
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A impressão de quem passa pelas ruas de Campo Grande é de que tem uma farmácia em cada esquina. E bem, é quase isso mesmo. Porque de acordo com dados recentes do CRF-MS (Conselho Regional de Farmácia), a quantidade de estabelecimentos farmacêuticos na Capital é 231% maior que o recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde).
Apesar de estar na média nacional, a Capital extrapola o recomendado pela OMS, que estima uma farmácia para cada 8 mil habitantes. De acordo com os dados recentes do conselho, existem 321 farmácias em Campo Grande, o que equivalente a uma farmácia para cada 2,4 mil pessoas.
O diretor do CRF-MS, Flávio Shinzato, disse ao Jornal Midiamax que realmente o número é superior, mas que de outro lado, a quantidade de estabelecimentos proporciona o melhor acesso da população, porém exige-se cuidado dos farmacêuticos.
“É preciso que as pessoas procurem um farmacêutico nesses estabelecimentos para as informações em relação à saúde. E a fiscalização do conselho é bem atuante no sentido de sempre fiscalizar se, nos estabelecimentos, há farmacêuticos em todo o período de funcionamento, já que isso é exigido por lei”, disse Shinzato.
No Centro de Campo Grande esses dados ficam ainda mais evidentes. Somente na Avenida Afonso Pena, por exemplo, existem dez farmácias distribuídas entre uma quadra e outra. Duas delas ficam na esquina com a Rua Rui Barbosa e, para acirrar a concorrência entre os clientes, fica uma de frente para a outra.
Longe do coração da cidade, o Trevo Imbirussu comporta três farmácias que funcionam praticamente uma do lado do outra. A mais antiga tem 26 anos e a recém inaugurada, apenas 2 meses de funcionamento. Na Avenida Manoel da Costa Lima, bem ao lado do Trevo, tem outras três farmácias em menos de 500 metros de distância uma da outra.
A quantidade de farmácias na Capital vira até meme nas redes sociais. Para quem já assistiu Power Rangers vai entender a referência. A página de humor “Passeando em Campo Grande” fez o megazord da cidade, onde uniu uma das principais características da cidade. Dentre elas, as inúmeras farmácias.
‘Concorrência desleal’
Com a concorrência cada vez maior, os farmacêuticos precisam ser criativos e adotar não só estratégia do preço baixo, mas também oferecer estacionamento mais amplo, atendimento 24h, faixas chamativas, servir um cafezinho e até drive thru, onde clientes possam comprar os medicamentos sem sair de seus carros.
Para o farmacêutico Roberto Martins Rosa, de 53 anos, dono da Drogafic, uma das três farmácias localizadas no Trevo Imbirussu e a mais antiga do trecho, a concorrência com as franqueadoras acaba sendo desleal com as farmácias menores e locais.
“Está tendo uma imigração de fora do Estado e a concorrência está desleal. São drogarias que compram tudo de fora, mercadorias de outros Estados, pagam impostos de fora e trazem mão de obra de outro Estado”, disse o farmacêutico.
As drogarias menores, conforme Roberto, até tentam oferecer descontos nas medicações para atrair os clientes, mas a possibilidade de descontos tem sido cada vez menor. “A concorrência gera especulação de preço. Quando tem margem para poder negociar, a gente negocia com o cliente para oferecer o melhor preço, mas o medicamento operacional é muito alto e atualmente tem uma margem pequena para negociação. Hoje em dia só fidelizar com atendimento não funciona mais, precisar fidelizar com o preço”, afirmou.
‘Boom’ de farmácias x automedicação
Encontrar uma farmácia em cada esquina que caminhar pode ter uma explicação, conforme a farmacêutica Maria Tereza Monreal, coordenadora do curso de Farmácia na UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul). Para ela, a expectativa de vida dos brasileiros vem crescendo e conforme são pontuadas as medidas de proteção sanitária e social, o acesso aos medicamentos contribuíram para esse crescente aumento.
“O crescimento desse setor responde a essa demanda e está associado ao fato desse tipo de estabelecimento ‘ainda’ ser considerado um estabelecimento comercial, apesar da legislação considerar a farmácia como estabelecimento de saúde. Dessa forma, ela ainda é regida pela Lei de Mercado, ou seja, aumentasse a demanda, surge a oferta para equalizar a situação”, disse a farmacêutica.
Monreal explica que a quantidade de farmácias em Campo Grande se encaixa na média nacional, de uma farmácia para cada 2,4 mil habitantes. No entanto, o dado é preocupante, pois quanto maior o acesso da população, maior a possibilidade de usar os remédios de forma irracional. No entanto, explica que isso depende de estabelecimento para estabelecimento.
“Não é a quantidade de farmácia que fomenta a automedicação, mas a pressão da mídia e das indústrias, o perfil do empresário, o perfil do usuário, a falta de informação e a falta do profissional farmacêutico na gestão técnica do estabelecimento”, pontuou.
A farmacêutica lembra que a automedicação responsável é estimulada pela OMS, como forma de desafogar os serviços públicos de saúde. “E automedicação responsável é aquela na qual o farmacêutico auxilia a escolha farmacológica adequada para tratar condições de saúde consideradas distúrbios menores. Nessas situações podem ser prescritos pelos farmacêuticos os medicamentos isentos de prescrição”, explicou Monreal.
No entanto, todos os cuidados são necessários, pois a automedicação desenfreada pode causar intoxicação, internações hospitalares, reações adversas, interações medicamentosas e até a morte. Por isso, Maria Tereza salienta que a orientação de um farmacêutico na hora de comprar os medicamentos é indispensável.
“Automedicação responsável deve sempre ser orientada por um profissional qualificado – entre eles, o farmacêutico”, finalizou.
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