À espera de Yago, Eduardo conversa todo dia com esposa grávida, que teve morte cerebral

Renata gesta o bebê no hospital, após sofrer um AVC

Arquivo – 02/03/2017 – 22:36

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Renata gesta o bebê no hospital, após sofrer um AVC

Na Madrid do início dos anos 2000, um enfermeiro conversava todos os dias com a paciente – de quem cuidava com delicadeza – em coma no hospital. O filme “Fale com ela”, do espanhol Pedro Almodóvar narra uma relação pouco baseada em dados da realidade, mas carregada de afeto e fé no incerto (além de abordar uma polêmica violência). A vida de Eduardo de Noronha de apenas 25 anos, em Campo Grande, é um pouco como o filme. O jovem viu sua rotina virar de cabeça para baixo no dia 27 de janeiro, quando a esposa, Renata Souza Rocha, 22, sofreu um AVC (Acidente Vascular Cerebral) e foi encaminhada para a Santa Casa. Três dias depois, a equipe médica constatou a morte cerebral da jovem. Ainda assim, a morte e a vida pulsam juntas no corpo de Renata. Isso porque ela carrega o primeiro filho do casal, o bebê, Yago, que acabou de completar cinco meses de vida no útero da mãe.

Para a medicina, a razão orienta um só caminho: o quadro clínico, que é irreversível. A fé, no entanto, segue em outra direção. E essa é a escolhida por Eduardo, que visita todos os dias a esposa. No quarto, onde está internada, ele conversa com ela.

O caso de Renata – que é mantida aos cuidados de uma equipe especializada 24h para concluir a gestação -, é raro e o 3º no Brasil. A assessoria de imprensa da Santa Casa explicou que só foram registrados outros dois casos semelhantes, um em Campo Largo, Paraná, e o outro em Colatina, Espírito Santo. Os médicos devem aguardar que a gestação complete 28 semanas. Renata já completou 23.

Eduardo e Renata estão juntos há 8 anos. Todos os passos, desde então, eles deram juntos. A casa própria, o carro e o bebê. Conforme ele conta, Renata, sempre ansiosa, era saudável, tinha rotina preventiva na saúde e estava com todos os procedimentos médicos do pré-natal em dia. O AVC foi inesperado, e ainda, inexplicado.

Na última vez em que Renata respondeu de volta, as palavras já não estabeleciam sentido. Foi quando ligou para ele, ao sentir os primeiros sintomas, naquele dia 27.

“Falaram pra nós que tinha a possibilidade da continuidade na gravidez e se nós iríamos querer [sic]. Aí optamos por continuar. Falaram de todos os riscos que poderiam ocorrer, eles nos deixaram bem cientes de tudo. Que pode ocasionar do bebê nascer bem, falou da dificuldade que podia ser. Eles tiveram que montar uma força-tarefa, porque o cuidado com ela é 24h. Todas as vezes que eu vou na visita tem alguém zelando por ela lá”, conta ele.

Renata, de acordo com a Santa Casa, é acompanhada por toda equipe multiprofissional da UTI (Unidade de Terapia Intensiva) – médicos plantonistas, enfermeiros, nutricionistas, entre outros. A atenção da equipe, para a família, é um dos alentos e motivo de gratidão.

“A diferença para uma gestação normal é que ela depende de cuidados intensivos e constantes para que se possa dar ao organismo condições de permanência até o momento em que a criança possa ser retirada com chances de sobrevivência”, complementa o hospital.

Para a medicina, Renata é uma mãe com morte encefálica. Para Eduardo, no entanto, ela parece apenas “estar dormindo”. 

Mais do que irmãs

A união parece um traço muito forte na família da jovem mãe. Além do companheiro, Eduardo, a mãe doe Yago estabelecia uma relação especial com a irmã Adriele de Souza Avalos dos Santos, com quem compartilhou o sonho de criar os filhos juntos e de terem o próprio negócio. As duas têm apenas 2 anos de diferença, Adriele também é jovem e mãe, com apenas 20 anos e cria a filha “especial”, conforme explica, que tem 2 anos de idade. As duas juntaram dinheiro para abrirem um trailer de lanches, que funciona no bairro onde Adriele mora, o Vivendas do Parque.

“A gente era as mais unidas, ela cuidava da casa e da gente”, contou Adriele, ensaiando uma risada de saudade. “A gente tinha planos de criar os dois juntos. Ela me ajudou muito na fase da minha filha”. “É estranho, porque no mesmo tanto que é triste, a gente fica alegre, de saber que o bebê está bem”, relata.

Adriele finaliza, afirmando que ainda crê em algum milagra para a irmã, já que acreditar, em suas palavras, “é a única forma de continuar”.

“Eles falam que tem que ter consciência que um dia ele pode estar ali, e no outro não pode mais, e que é muito arriscado. A gente crê que Deus pode fazer um milagre na vida dela. A gente tem esperança de criar todos juntos”.

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